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Imobiliária do Congresso movimenta parlamentares

Antes de assumir o cargo, deputados e senadores precisam decidir entre um generoso auxílio-moradia e um apartamento de quatro quartos

Por Gabriel Castro
5 dez 2010, 08h17

O porteiro Francisco Rocha cumpre rigorosamente os plantões de 12 horas em uma das entradas do bloco L da superquadra 202 Sul, no coração de Brasília. Fica atendo à qualquer movimentação em torno do prédio. Apesar de já exibir as marcas de mais de três décadas de uso, o edifício tem jardins bem cuidados, piso limpo, e a manutenção está em dia.

Mas Francisco não costuma ter muito trabalho: desde que foi contratado para o serviço, há dois anos, o prédio não tem um morador sequer. São 41 apartamentos vazios. O salário do porteiro, as despesas com limpeza e o material de jardinagem são pagos pela Câmara dos Deputados. O bloco L da 202 Sul é um prédio funcional. Deveria ser ocupado por deputados, mas boa parte dos parlamentares opta pelo auxílio-moradia de 3.000 reais por mês.

O trabalho de Franciso se resume a dar explicações a pessoas interessadas em adquirir um dos apartamentos, que ficam a cinco minutos do Congresso Nacional. Naquela área, um imóvel de três quartos pode ultrapassar a casa de 1 milhão de reais.

Os imóveis funcionais existem desde a construção de Brasília. Cinquenta anos atrás, fazia sentido oferecer moradia aos parlamentares transferidos do Rio de Janeiro para uma cidade em construção. A Câmara dos Deputados tem uma superquadra inteira para abrigar seus parlamentares – a 302 Sul. Ao todo, são 432 apartamentos, distribuídos por quatro superquadras do Plano Piloto.

Os prédios têm todos o mesmo padrão: blocos com seis andares, sem varandas. Por fora, a fachada é bem semelhante a dos ministérios, desenhados por Oscar Niemeyer. Por dentro, os imóveis também são praticamente iguais. Todos têm quatro quartos, com decoração similar. E a mobília também fica por conta Câmara: os deputados não precisam se preocupar com camas, mesas, sofás e eletrodomésticos.

Reforma – Com o tempo, os prédios foram se deteriorando. Em muitos, havia infiltrações, falhas nas instalações elétricas e ferrugem nos ladrilhos. Para modernizar as construções e tentar atrair novos moradores, a Câmara dos Deputados investiu pesado: começou uma série de reformas em seis dos prédios, ao custo de quase 60 milhões de reais. Outros blocos devem sofrer reparos nos próximos anos.

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Apesar da existência de apartamentos ociosos em imóveis funcionais, a situação pode estar mudando: sem reajuste há 8 anos, o auxílio-moradia tem ficado defasado em relação aos preços praticados na capital do país, onde os imóveis se valorizam assustadoramente – graças à alta renda per capita e ao limitado número de imóveis no Plano Piloto. O aluguel de um bom apartamento na Asa Sul, por exemplo, pode custar mais de 5.000 reais por mês.

Cento e trinta deputados eleitos para a próxima legislatura já pediram formalmente à quarta secretaria da Câmara a cessão de um apartamento. Os critérios, pelo menos formalmente, são claros: têm prioridade os deficientes físicos, os idosos, as mulheres e os parlamentares que moram com filhos. Mas as regras são apenas informais. “Existe, na Mesa Diretora, uma proposta para fixar esses critérios a partir de agora”, diz Osmar Moraes, chefe de gabinete da terceira secretaria da Câmara dos Deputados e responsável por avaliar os pedidos.

Senado – No Senado, a relação oferta x demanda é mais equilibrada. Os três blocos destinados aos senadores estão quase totalmente preenchidos, apesar de o auxílio-moradia, neste caso, ser maior do que o da Câmara: 3.800 reais. Os prédios, antigos, surpreendem pela fachada simples e pelo acabamento franciscano. Por dentro, porém, os imóveis espaçosos e bem localizados não deixam razão para crítica. “Ridículo é ter apartamento vazio e pagar auxílio-moradia”, afirma o senador Pedro Simon (PMDB-RS), morador de um dos imóveis da 309 Sul.

O senador Mão Santa (PMDB-PI), terceiro secretário do Senado e responsável pelos imóveis funcionais, diz que moralizou a gestão dos prédios. “Reduzi as despesas de 1 milhão para 100.000 reais por mês”. Ele afirma ter rejeitado propostas estapafúrdias de parlamentares como uma que previa despesas de 80.000 reais para a instalação de armários.

Chefe de gabinete da terceira secretaria, Roberto Mendes garante que não há pressões políticas: “O critério é a cronologia. Conforme os pedidos chegam, vamos preenchendo as vagas”. Na prática, as relações pessoais também influenciam. O próprio Mão Santa já acertou que vai entregar as chaves do imóvel a Garibaldi Alves (PMDB-RN), que a partir de 2011 será vizinho de Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN).

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Vizinhança – Os porteiros dos blocos habitados por parlamentares afirmam que não há registro de brigas entre os vizinhos. Lá, oposição e governo convivem harmoniosamente. Em todas as quadras, parlamentares dividem os blocos de apartamentos com pessoas comuns, à exceção da 302 Norte, onde vivem apenas deputados. Poucos brasilienses sabem diferenciar em quais imóveis vivem os parlamentares.

Em parte, o projeto do urbanista Lúcio Costa deu certo. Ele pretendia ver ministros e parlamentares convivendo com trabalhadores comuns. Os pilotis embaixo dos prédios são abertos, e o acesso às superquadras é totalmente livre. Na 302 Norte, onde moram apenas deputados, uma escola pública recebe crianças de cidades-satélites a poucos metros dos prédios onde vivem os parlamentares.

Gabinetes – Além dos imóveis funcionais, deputados e senadores disputam espaço também nos gabinetes do Congresso Nacional. Na Câmara dos Deputados, parlamentares crescem o olho sobre os escritórios no Anexo 4 – que, apesar de ficar mais distante do plenário, abriga gabintes maiores e com banheiro próprio.

No Senado, os mais cobiçados ficam no anexo 1: são maiores, chegando a ocupar um andar inteiro. A vista do alto das torres do Congresso é outro ponto positivo. Mas há um porém: ficam mais distantes do plenário. O senador Pedro Simon, um dos mais antigos da casa, poderia ter mudado de gabinete este ano, mas preferiu ficar no lugar de sempre, no subsolo: “Não vejo porque mudar”.

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