Caso Bruno: a investigação andou para trás
Polícia começa a semana às voltas com afastamento das duas delegadas devido ao vazamento de vídeo com declarações do goleiro do Flamengo
OAB avisa que advogados que estiverem prejudicando investigações também poderão ser afastados
A polícia mineira obteve, nesta segunda-feira, algo que os delegados perseguiam desde o início das investigações do desaparecimento de Eliza Samudio: uma testemunha que quer colaborar com as investigações. Os policiais, no entanto, mal tiveram tempo de se dedicar a esta poderosa fonte de informação, devido ao atrapalhado vazamento de um vídeo que abriu, para os advogados de defesa, mais uma janela para contestar as provas obtidas para incriminar o goleiro Bruno e os demais suspeitos.
A semana começa com uma baixa que favorece os suspeitos. Alessandra Wilke e Ana Maria Santos, delegadas que conduziam o caso desde o fim de junho, quando Eliza passou a ser dada como desaparecida e tem na cabeça todo o histórico da investigação, foram afastadas. Na avaliação da cúpula da Polícia Civil, elas tiveram responsabilidade sobre o vazamento do vídeo em que o goleiro Bruno, dentro de um avião da polícia, sendo levado do Rio para Belo Horizonte, fala despreocupadamente sobre o caso.
O vídeo não tem uma informação importante sequer. Pelo contrário: traz uma previsível afirmação de inocência do principal suspeito e uma declaração, vaga, em relação às suspeitas que ele afirma ter em relação a seu funcionário, Luiz Henrique Ferreira Romão, o Macarrão. Apesar do estardalhaço com o vídeo, o próprio Bruno sabe que, sem seu consentimento, ninguém considera que seria possível levar a cabo um plano que mobilizou uma dezena de pessoas e vitimou uma pessoa com quem o jogador tinha um histórico de atritos.
O time da defesa, chefiado pelo criminalista Ércio Quaresma, fez bom uso do silêncio, optando por falar apenas quando chegar o momento de encarar o juiz. Mas Quaresma, que é tudo, menos silencioso, soube aproveitar o timing para investir contra a investigação e os investigadores. Sacou, já na manhã de segunda-feira, frases sobre “tortura” ocorridas na polícia mineira.
“O que vejo aqui hoje é que o Departamento de Investigações tem um verdadeiro circo de horrores”, afirmou, denunciando que Macarrão teria sido empurrado, ou levado um tapa, durante um interrogatório. A menos que o suspeito tenha sofrido uma lesão passível de diagnóstico no Instituto Médico Legal, será um confronto de palavra contra palavra – no qual a vítima, por enquanto, é a credibilidade da polícia mineira.
Punições também para advogados – O secretário-geral da Ordem dos Advogados do Brasil em Minas, Sérgio Murilo Diniz Braga, foi na tarde de segunda-feira ao Departamento de Investigações para averiguar as denúncias da defesa de Bruno. Ele avisou, no entanto, que a apuração dos abusos não vai caminhar em uma só direção. “Todas as queixas serão investigadas. Inclusive a de que os advogados estariam perturbando as investigações. Se comprovadas irregularidades passíveis de punição administrativa, os defensores podem ser até proibidos de atuar no caso”, alertou.
O delegado Edson Moreira, que vai assumir as investigações, terá trabalho dobrado. Além de correr contra o tempo para levantar provas materiais – indispensáveis para casos de homicídio e toda a série de crimes atribuídas ao grupo -, Moreira terá de enfrentar a saraivada de recursos de que lança mão a defesa dos suspeitos.
As iniciativas que podem emperrar ainda mais as investigações já começaram. Na tarde desta segunda-feira, o advogado Zanone Júnior, que defende o ex-policial civil Marcos Aparecido dos Santos, o Bola, anunciou que vai tentar um mandado de segurança na Justiça mineira para tentar evitar que seu cliente seja submetido a uma acareação, como pretendem os investigadores. “Meu cliente é inocente e está deprimido. Não vou deixar que seja submetido a mais este constrangimento”, disse Zanone.
Próximos passos – O Tribunal de Justiça de Minas Gerais marcou para quinta-feira, às 13h30, a audiência de instrução para os atos infracionais do adolescente envolvido no desaparecimento de Eliza Samudio. A sessão está marcada para o Juizado da Infância e Juventude, em Contagem (MG). O juiz Elias Charbil Abdou Obeid vai colher provas orais de Bruno; do Macarrão; do ex-policial Marco Aparecido dos Santos, o Bola, e de Sérgio Rosa Sales, primo do jogador. O tio do jogador, José Carlos da Silva, vai ser ouvido por carta precatória: as perguntas serão enviadas para o Juizado de Infância do Rio de Janeiro, que formulará as questões.
Todos já foram intimados. As respostas vão servir para analisar a participação do menor no crime. O menor vai acompanhar os depoimentos, mas não vai haver acareação em juízo. O pedido de confrontação de testemunhas acareação ainda não foi autorizada pelo juiz e só será analisada após quinta-feira.