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Três décadas de politicamente correto… e continuamos na mesma!

A censura e a chatice venceram a guerra sobre o vocabulário cotidiano, mas isso significa que estamos vivendo num "mundo melhor"?

Por Maicon Tenfen Atualizado em 16 out 2017, 08h30 - Publicado em 16 out 2017, 07h55

Hoje em dia é fácil encontrar quem ache que a palavra “mulata” seja ofensiva para designar um tipo físico que virou sinônimo de beleza e exuberância. Ainda mais fácil é encontrar censores do vocabulário público, gente “esclarecida” ensinando os colegas “binários” a falar segundo as normas que a correção política considera adequadas.

Lembro uma tia que me admoestava quando eu era criança.

— Não diga palavrões — ralhava. — Vou lavar a sua boca com sabão!

A coisa está funcionando mais ou menos da mesma forma, com a importante diferença de que o número de tias cresceu como uma praga e o combate aos palavrões acabou substituído pelo combate a palavrinhas que, a rigor, não possuem carga semântica pejorativa.

Desde os tempos da escravidão havia eufemismos politicamente corretos para fazer referência a um modelo econômico baseado na sádica relação entre senhores e escravos. D. Pedro II tinha vergonha de dirigir um país cuja economia era carregada nos ombros dos negros. Quando se referia à questão em seus discursos, usava a expressão “elemento servil”.

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Como ele não podia simplesmente dar um canetaço e promover a alforria coletiva — o canetaço veio em 1888, mas custaria o trono —, fazia de conta que uma expressão linguística era capaz de ocultar a realidade. Não deixa de ser curioso que a expressão “elemento servil” virou moda entre a classe senhorial, e essa classe, como o próprio nome indica, era formada pelos maganões que usavam o chicote para explorar o trabalho alheio.

Em palavras mais diretas, era uma tremenda de uma hipocrisia.

Às vezes parece que o objetivo do politicamente correto é tapar o sol com a peneira e fingir que podemos resolver os nossos problemas com um dicionário. Quem diz “afrodescendente” em vez de “negro” talvez tenha crescido na escala humanitária, mas isso não significa que os adeptos do novo vocábulo não estejam lucrando sobre as desigualdades de uma sociedade racista.

Alguém vai dizer que a construção de um “mundo melhor” começa pelas palavras. Pode ser, mas o fato é que esse argumento já serviu de origem às mais escrotas formas de censura. Por trás desse ideal utópico e incontestável — “mundo melhor” — ocultam-se as perversidades mais indizíveis do comportamento humano.

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— Se a fala dele é “desatualizada”, não pode fazer parte do meu “mundo melhor”.

É a voz da tia que detesta palavrões, só que agora mais estridente, mais tecnológica e mais implacável. Informa que os sobrinhos malcriados devem ser corrigidos sem demora.

Caso contrário, abram as bocas que lá vem sabão.

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