Bruxas à solta: patrulha política veda fantasias de Halloween
Universidades americanas dão instruções sobre o que usar para não ofender infinitas categorias; professora já foi até afastada por propor discussão
Vem chegando o dia das bruxas e é bom os universitários americanos pensarem muito bem para não enfiar o pé na abóbora, a jaca deles.
O espírito do Halloween, uma festa de origem pagã “cristianizada” para o Dia de Todos os Santos, deveria ser como o do Carnaval: um dia de valores invertidos no qual, em vez de ser boazinhas, as crianças fazem de conta que são más, brincam com seres repugnantes como aranhas e morcegos e dão susto nos adultos.
Estes ficam de castigo, dando doces e balas na porta de casa. Os que estão na transição para a idade adulta vestem fantasias ridículas, assustadoras, engraçadas, criativas ou simplesmente qualquer coisa que conseguiram comprar pela internet. No caso das garotas, em geral, é tudo isso, mas com as pernas de fora ou algum outro detalhe sexy. Todos se acabam de beber nas festas para maiores.
Com a obsessão politicamente correta que está transformando as universidades americanas em campos de reeducação à maneira da Revolução Cultural chinesa, todo cuidado é pouco justamente nessa hora.
Avisos, palestras e seminários alertam para as fantasias que podem causar ofensa a diferentes minorias ou categorias étnicas, raciais, sexuais etc.
Avisou a Universidade de St. Thomas, de Minnesota: “Fantasias inaceitáveis incluem usar cocar de americanos nativos, vestir-se de ‘mexicano’ com sombrero, vestir-se de ‘gueixa’, qualquer tipo de pintura negra no rosto.”
No ano passado, a atriz Hillary Duff e seu namorado, Jason Walsh, cometeram um desses gravíssimos crimes de insensibilidade cultural: ele se vestiu de índio e ela de pioneira do tipo que chegou aos Estados Unidos nas primeiras levas de puritanos.
Pediram desculpas arrebatadas pela falta de sensibilidade e a apropriação cultural. “Eu só tenho admiração pelo povo indígena da América”, penitenciou-se Walsh.
Apropriação cultural é a expressão-chave desse tipo de delírio politicamente correto. Inclui dreadlocks ou trancinhas (cultura negra do Caribe), camisa de força (cultura dos afetados por doenças mentais), ponchos, bigodes e os já mencionados sombreros (cultura mexicana) e qualquer coisa oriental. Vestir um quimono e amarrar uma faixa preta na cintura? Um desrespeito ao significado espiritual das artes marciais.
O que ofenderia brasileiros? Trajar-se de político corrupto, provavelmente. Mas se alguma americana se vestir de Carmen Miranda, com arranjos de frutas na cabeça, pode ser acusada de delito de pensamento politicamente correto.
Mesmo que ninguém use a coisa no Brasil. Detalhe: se americanos gays quiserem imitar gerações de brasileiros que fazem isso, homenageando uma das maiores divas da categoria de todos os tempos, tudo bem. Complicação: um americano hétero não pode se vestir de gay usando turbante de frutas pois estará ridicularizando um grupo de orientação sexual diferente da sua. E se apropriando culturalmente do turbante.
Parece piada, mas o assunto ficou sério em Yale quando a professora Erika Christakis, um primor do pensamento politicamente correto, sugeriu numa carta que os alunos eram suficientemente maduros para discutir as imposições sobre fantasias de Halloween. Christakis propunha debater a questão da autocensura.
Ela e o marido foram acusados de racismo, ameaçados, boicotados e , impossibilitados de exercer suas funções, expurgados voluntariamente para outra universidade. Um dos crimes de Christakis foi mencionar que, como especialista em educação infantil, achava positivo uma criança loira se fantasiar como Mulan, a personagem chinesa do desenho da Disney.
Os exageros delirantes que acontecem nas universidades americanas estão deixando marcas e provocam pálidas reações quando atingem justamente professores que são a a vanguarda do politicamente correto.
A Universidade de Missouri foi tomada em 2015 por um furor de manifestações inspiradas pelo Black Lives Matter. Um reitor e um vice rodaram, embora fossem a favor das manifestações. Havia protestos em que os organizadores mandavam estudantes brancos ficar nas últimas fileiras e os negros na frente. Desde então, as inscrições caíram 35%.
Um dos sucessos do Halloween deste ano deveria ser o palhaço maligno do filme It: a Coisa. Mas agora apareceu um concorrente imbatível: Harvey Weinstein, a mais perfeita encarnação do porco chauvinista.
Satirizar figuras malignas é uma das tradições de festas como o Carnaval ou o Halloweeen. Isso ajuda a “processar” casos chocantes, sem significar que seus crimes são diminuídos. As fantasias de Bin Laden de carnavais passados são a prova.
Será que os americanos vão arriscar? Haverá o risco de ofender os porcos? Ficaremos sabendo no próximo dia 31.