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O falso lusitano

O Arroz de Braga, quem diria, não surgiu em Portugal, como o nome insinua, mas no Brasil, em Santos!

Por J.A. Dias Lopes Atualizado em 30 jul 2020, 20h51 - Publicado em 19 jun 2017, 12h59

Os brasileiros que visitam Portugal têm vários motivos para incluir no seu roteiro de viagem a histórica Braga, de 110 mil habitantes, na província do Minho, ao norte do país. Fundada pelos romanos em 16 a.C., com o nome de Bracara Augusta, em homenagem ao imperador Augusto, a cidade recebe milhares de turistas a cada ano. Os turistas são atraídos pela sua velha Sé, cuja construção foi iniciada no século 12, sobre as ruinas de um antigo mercado ou templo, dedicado à deusa pagã Ísis; pelas inúmeras igrejas católicas e os  monumentos históricos; pelos belos jardins; e por uma cozinha apetitosa e generosa.

Entretanto, os brasileiros que forem até lá e quiserem comer o “autêntico” Arroz de Braga – feito à base de frango, toucinho ou bacon, paio, linguiça portuguesa, eventualmente costeleta suína defumada, tomate, repolho, ervilha, alho, salsinha e cebolinha – ficarão decepcionados. Além de não ser preparado na cidade, é completamente desconhecido dos seus restaurantes. Terão que se contentar com o Arroz de Pato à Moda de Braga, a receita de ave famosa na região.

Popularíssimo no Brasil, o Arroz de Braga surgiu em São Paulo na encruzilhada dos séculos 19 e 20. Conquistando apreciadores sem parar, espalhou-se pelo Brasil.  Em todos os lugares é considerada uma receita portuguesa. Houve tempo em que fez parte do cardápio popular de São Paulo, herdado das casas senhoris de antigamente. Os bares e restaurantes o ofereciam na quinta-feira como o prato do dia. Na segunda, tinham virado à paulista, na terça dobradinha, na quarta e sábado feijoada, na sexta bacalhoada ou pescada.

Mas o Arroz de Braga não estreou na cozinha paulistana. Como escreveu o jornalista Olao Carmo Rodrigues (1907-81), no “Almanaque de Santos”, de 1969, foi inventado na cidade de Santos, a 82 quilômetros de São Paulo, indo pela Rodovia dos Imigrantes. Inicialmente, chamava-se Arroz do Braga; depois, recebeu o nome atual. A historiadora Wilma Therezinha Fernandes de Andrade, autora de estudos sobre Santos antiga, avaliza Olao Rodrigues. E quem preparou a receita pela primeira vez?  O dono de um pequeno restaurante da Rua Itororó, no centro da cidade. Era conhecido por Seu Braga. Só não se sabe se era brasileiro ou português, como muitos supõem. Infelizmente, o nome do restaurante se perdeu.

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Certa vez, já tarde da noite, chegou um grupo faminto para jantar. Seu Braga o recebeu com uma má notícia. Dada a hora avançada, sobravam-lhe poucos mantimentos. O grupo suplicou que fizesse qualquer coisa. Então, usando os únicos ingredientes disponíveis, Seu Braga improvisou uma famosa receita brasileira de arroz.

A escritora gastronômica alentejana Maria de Lourdes Modesto, autora do best-seller “Cozinha Tradicional Portuguesa” (Editorial Verbo, Lisboa/São Paulo, 1982), primeira dama da gastronomia lusitana, chamada pelo jornal norte-americano “New York Times” de “Portugal’s Julia Child”, assegura que o Arroz de Braga é um puro-sangue brasileiro.

“A receita santista não tem nada a ver com os modos de cozinhar o arroz e seus complementos no meu país”, assinala. “Há uma variação do Arroz de Pato à Moda de Braga, feita com frango, porém muito diferente”. Maria de Lourdes ainda recorda que no norte de Portugal se prepara um arroz de cabidela finalizado com sangue de frango, ao qual a receita santista também não pode ser comparada.

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Trata-se do Arroz de Pica-no-Chão, um nome irreverente para os brasileiros. O termo é aplicado ao frango criado no campo, que “pica”, ou seja, dá bicadas no que encontra para comer. Corresponde ao galináceo caipira de São Paulo. Na Rua Ocidental, 588 A, telefone +351 22 996 7307, de Matosinhos, perto do Porto, funciona o Restaurante Pica-no-Chão. Os portugueses se espantam com as gargalhadas dos brasileiros.

Tecnicamente, o Arroz de Braga e o Arroz de Pato à Moda de Braga diferem bastante. Na receita santista, os ingredientes são previamente refogados. A finalização  acontece na própria panela. Já na portuguesa, as carnes cozinham em água, para se obter um caldo no qual irá o arroz, e o prato termina no forno.

A gastronomia de Braga, porém, não se distingue apenas por essa receita. Prepara bacalhaus antológicos: à Moda de Braga, à Narcisa, à Minhota etc. São ainda célebres o Cabrito à Moda de Braga, as Frigideiras do Cantinho ou as da Sé, as Papas de Sarrabulho, os Rojões à Moda do Minho. Notabilizam-se igualmente as sobremesas: Pudim Abade de Priscos, Bolo-Rei Escangalhado, Fidalguinhos de Braga, Toucinho do Céu. Portanto, o Arroz de Braga na cozinha da cidade ou da região, nem pensar!

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ARROZ DE BRAGA

INGREDIENTES

  • 1 frango de mais ou menos 1,5 kg cortado nas juntas
  • 2 litros de água (aproximadamente)
  • 3 colheres (sopa) de óleo de milho. Pode-se usar banha de porco
  • 250 g de toucinho ou bacon cortado em tiras de aproximadamente 1 cm
  • Costelinhas de porco defumadas a gosto (opcional)
  • 150 g de paio cortado em rodelas de aproximadamente 1 cm
  • 300 g de linguiça toscana (a de churrasco) cortada em rodelas de aproximadamente 1 cm
  • 2 cebolas médias picadas
  • 1 dente de alho picado
  • 4 xícaras (chá) de arroz
  • 3 tomates sem pele e sem sementes, picados
  • 1 folha de louro
  • 100 g de ervilhas frescas
  • 300 g de folhas de repolho branco
  • 3 ramos de folhas de salsinha picadas
  • Sal e pimenta-do-reino a gosto

PREPARO

Primeiro tempere o frango com sal e pimenta-do-reino. Coloque a água para ferver. Numa panela, esquente o óleo e doure as tiras de toucinho/bacon. Quando estiver no ponto, retire e reserve. Sempre na mesma panela, refogue os pedaços de frango até dourarem. Retire e reserve.

Repita o mesmo procedimento com as costelinhas de porco, as rodelas de paio e de linguiça, refogando até ficarem bem douradas. Retire e reserve. Na mesma panela, refogue a cebola e o alho rapidamente. A cebola deve apenas murchar, sem mudar de cor.  Junte o arroz e refogue durante uns 3 ou 4 minutos, mexendo preferencial com uma colher de pau. Junte os tomates e a folha de louro e retorne à panela os pedaços de frango, o toucinho, as costelinhas, o paio e a linguiça. Cubra com a água fervente.

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Acerte o sal, a pimenta e cozinhe em fogo médio por uns 30 minutos. Mas tenha cuidado para não exagerar, pois o paio, o toucinho e a linguiça já tem sal e pimenta. Rasgue as folhas de repolho com as mãos e junte as ervilhas. Misture tudo e cozinhe por mais 20 minutos. Vá vigiando a panela e, se necessário, coloque mais água. Quando estiver no ponto, retire a folha de louro e acrescente a salsinha picada por cima. Depois é só aproveitar.

Esse prato pode ser ainda adaptado à cultura de cada região, podendo , por exemplo, utilizar o açafrão-da-terra, adicionar a pimenta preferida, usar cheiro-verde, azeite ao invés do óleo, queijo ralado, etc.

DICA

Doure bem cada um dos ingredientes (paio, toucinho, costelinha, linguiça e frango) e, nesse caso, vale até refogar o frango em duas etapas para ele não criar muito caldo e ficar douradinho mesmo.

Receita preparada pelo chef José Alencar de Souza, de São Paulo, SP, com base na que era difundida pelo grande jornalista Saul Galvão, grande fã do prato.

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