Para empresários, medida que permite redução de salários é boa, mas tardia
Atraso em reedição do BEm levou ao fechamento de 35 mil bares e restaurantes, segundo associação do setor; Entidades setoriais pleiteiam volta do Pronampe

Tão esperado pelos empresários, o programa que permite suspensão de contratos e redução de jornada finalmente foi reeditado nesta quarta-feira, 28. Tido como fundamental no ano passado para segurar o choque do emprego, a volta da medida é bem-vinda, mas tardia, segundo entidades setoriais ligadas a indústria, comércio e serviços. Dentro dos serviços, aliás, os bares e restaurantes eram os que mais clamavam pelo retorno. Fizeram marcação cerrada no presidente Jair Bolsonaro e na equipe econômica para que a medida fosse destravada logo.
Em 27 de janeiro deste ano, o presidente-executivo da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci, reuniu-se com o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, para alertar sobre a urgência da retomada do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda (BEm). O pedido de socorro parecia ter surtido efeito, e Solmucci saiu de Brasília com a promessa de reedição da medida em 15 dias.
Apesar da importância do programa, diz a Abrasel, o atraso levou ao fechamento de 35 mil bares e restaurantes e à demissão de 100 mil funcionários, de janeiro a abril. “Faltou senso de urgência do governo. Poderíamos ter salvado o que sobrou do setor. A antecipação poderia ter evitado nossa ida para a UTI. Embora vital, a adoção das medidas agora pode não ser suficiente”, alega Solmucci a VEJA. Em 2020, 30% das empresas do setor fecharam as portas. Este ano, metade das que sobreviveram ainda corre o risco de quebrar.
Segundo levantamento da associação, no começo de janeiro, 5% dos bares e restaurantes relataram dificuldades em pagar salário de funcionários. Um mês depois, foram 16%. Em março, o percentual foi de 76%, e, no começo de abril, o problema bateu à porta de 91% dos empregadores. O nível de desestruturação atualmente é tão grande, avalia Solmucci, que o setor só conseguirá manter a solvência se houver apoios municipal, estadual e federal e de outros membros da cadeia produtiva, como fornecedores. “Sem ação coordenada, assistiremos a uma quebradeira em massa”.
Os dados de vagas formais refletem um pouco do sufoco vivido por bares e restaurantes, que, em grande parte, precisam do atendimento ao público para sobreviver. Em março, o Caged apontou a criação de 184 mil vagas, sendo 95 mil no setor de serviços, do qual os bares e restaurantes fazem parte. Entretanto, alojamento e alimentação fecharam 28 mil vagas durante o período.
Avaliação
Para Carlos Thadeu de Freitas Gomes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), o governo federal deveria ter mantido ininterruptamente o BEm e o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe). “Enquanto as medidas tiveram prazo de duração, não sabemos quando estaremos livres do novo coronavírus”. O Pronampe, aliás, ainda não saiu do papel. Nesta quarta-feira, 28, o ministro Paulo Guedes afirmou que a medida deve ser adotada nos próximos dias. Cerca de 5 bilhões de reais devem ser destinados do Tesouro Nacional para a linha de crédito.
Desde o início do ano, quando as projeções para a atividade econômica no primeiro trimestre começaram a ser revistas para baixo, a CNC passou a advertir o executivo sobre a necessidade da retomada célere dos programas, dentro das possibilidades orçamentárias. A crise atual, explica Freitas Gomes, requer um conjunto de medidas no curto prazo para que as empresas possam ter fôlego e sobrevida este ano. “O BEm demorou, mas chegou. Outras iniciativas como o auxílio emergencial poderão ajudar a demanda das famílias, e a renovação das linhas de crédito com baixos custos e carência, principalmente às pequenas empresas, são urgentes e igualmente importantes”.
O entendimento de que a MP veio tardiamente é compartilhado pela FecomercioSP. “A medida é boa, não deixa de ser um alento para o setor de comércio e serviços. A única crítica é que poderia ter sido adotada desde o início do ano”, disse Eduardo Pastore, assessor jurídico da federação paulista.
O economista José Pastore, especialista em relações do trabalho, afirma que apesar de tardia, as medidas são importantes para evitar mais choques no mercado de trabalho. “É claro que o programa poderia durar seis meses ao invés de quatro, porque as coisas não se resolvem na pressa. Mas precisamos levar em consideração que há um brutal problema de orçamento e a medida é a que pode ser paga”, disse Pastore, reforçando a importância dos programas de proteção de emprego enquanto a vacinação, fundamental para a retomada, não acelera.
Embora afete mais diretamente o setor de comércio e serviços, a paralisação de atividades econômicas pela pandemia acaba reverberando na indústria. No mês passado, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) enviou uma carta ao ministro Paulo Guedes solicitando não apenas a retomada do BEm, mas de todas demais iniciativas responsáveis pela recuperação rápida da economia em 2020 após a reabertura – auxílio emergencial, adiamento e parcelamento do pagamento de tributos, Pronampe e o Programa Emergencial de Acesso a Crédito (PEAC).
“Se não houver oferta de capital de giro, com pagamento facilitado e a custo baixo, principalmente para as micro e pequenas empresas, não haverá recuperação completa. O que pode até dificultar o uso do BEm por parte delas: sem a certeza de que vão se manter abertas, elas preferem optar pela demissão do funcionário em vez de correr o risco de assumir o compromisso. Já conhecíamos a eficácia das medidas dessa vez, o governo demorou demais”, explica Renato Fonseca, economista-chefe da CNI. Entre 16 e 22 de abril, a CNI consultou cerca de 550 empresas de pequeno, médio e grande portes sobre a reedição do Programa de Manutenção do Emprego e da Renda em 2021. Diferentemente do ano passado, quando 64% delas afirmaram ter recorrido ao BEm, para este ano apenas 35% disseram ter intenção de participar do programa.