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Mantega acha ‘engraçado’ solidez fiscal do país estar em xeque

Ministro disse ainda que não houve perda de confiança na economia brasileira e que fuga de investidores é culpa do Fed

Por Da Redação
19 jul 2013, 13h55

Em entrevista publicada pela Reuters nesta sexta-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, afirmou que acha “engraçado” a situação fiscal do país ser colocada em dúvida. O ministro disse que as contas públicas “estão cada vez melhores” porque o governo mede a saúde fiscal “pela dívida do país, que vem caindo. Temos feito superávits primários maiores que a maioria dos países”.

O ministro não quis comentar o valor do contingenciamento orçamentário que deve ser anunciado na segunda-feira, mas disse que não será essencial para ajudar o governo a cumprir a meta fiscal este ano. “Com as condições de hoje, temos garantido o primário do governo central. O objetivo (do corte) é criar um colchão, uma reserva de primário caso estados e municípios não façam sua parte”, afirmou Mantega. A expectativa é de que os cortes de gastos fiquem entre 12 e 15 bilhões de reais.

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O ministro não comentou as informações de que o governo poderá anunciar uma nova redução da meta fiscal na próxima semana, juntamente com o anúncio de contingenciamento. Mas não negou a possibilidade de aumentar para mais de 45 bilhões de reais o abatimento da meta com os investimentos do Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), já que a legislação permite abatimento de até 62 bilhões de reais. “A lei permite e nós trabalhamos com uma perspectiva de 45 bilhões de reais, foi montado assim. Agora, depende do desempenho dos governos estaduais”, afirmou o ministro.

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Na quarta-feira, Mantega voltou a pedir que estados e municípios se esforcem para cumprir a meta fiscal. Segundo o ministro, a economia acumulada até junho pelas duas esferas corresponde a menos da metade da meta. “Até agora, já fizemos mais da metade da meta que temos que cumprir. Os governos estaduais estão um pouco abaixo, fizeram menos da metade, mas têm a chance de fazer até o fim do ano”, afirmou.

Mantega ousou afirmar ainda que não houve perda de confiança do mercado internacional em relação ao Brasil – mesmo com a bolsa abaixo de 50.000 pontos, a saída maciça de dólares nos últimos meses e a redução da perspectiva de nota do Brasil anunciada pela Standard & Poor’s em junho deste ano. Para variar, o ministro culpou fatores externos. “Vamos colocar as coisas em seus devidos termos. O que abalou a confiança dos mercados ultimamente foi a ação do Federal Reserve, que criou um estresse financeiro na economia mundial quando começou, de forma não muito organizada, a anunciar que iria desativar os estímulos monetários. Aqui (no Brasil) não faltava confiança”.

Confira trechos da entrevista:

O senhor vai entregar o primário de 2,3% do Produto Interno Bruto (PIB) este ano ou esse percentual ainda pode ser ajustado?

O governo brasileiro tem entregue resultado excepcional em todos esses anos de modo que as contas brasileiras estão cada vez melhores, porque medimos as contas públicas pela dívida do país, que vem caindo, temos feito superávits primários maiores que a maioria dos países. Acho engraçado colocarem em dúvida nossa solidez fiscal. É claro que temos que permanecer vigilantes e termos resultado cada vez melhor dentro das circunstâncias. Em períodos de crise como esse dos últimos quatros anos e meio, é feito um resultado menor porque o Brasil usa política anticíclica. Nesse período boa parte dos países aumentou endividamento. No Brasil, estamos com déficit nominal controlado, que neste deverá ficar torno de 2,4%, 2,3% do PIB.

O economista Delfim Netto e outros economistas dizem que governo poderia adotar metas de primário de curtíssimo prazo. O senhor tem avaliado isso?

Trabalhamos todo ano com metas, a meta máxima e os descontos que podemos fazer. Nossa meta também é reduzir o déficit nominal, que tem sido conseguida. Agora, num momento de crise, em que se faz anticíclico, é muito difícil falar em déficit nominal zero.

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Por que a meta cheia de superávit primário de 3,1% do PIB não será cumprida este ano?

Esse ano vamos ter crescimento maior que o de 2012 (que foi de 0,9%), mas ainda não será crescimento que fará a arrecadação crescer como deveria, como entre 2006 e 2008. Estão vigorando desonerações que adotamos no ano passado e retrasado, como desoneração da folha. A arrecadação não é tão forte e fizemos desoneração, não é por causa do gasto (que a meta cheia não será cumprida). Teremos resultado que manterá a dívida em queda. A questão fiscal é permanente, o governo tem que buscar reduzir despesa de custeio.

Haverá mais desonerações?

Não tenho margem para cortar impostos.

Vai haver aumento de tributos para melhorar a arrecadação?

As desonerações gerarão resultados na economia neste e nos próximos anos porque reduzem custos. E uma parte dessas desonerações, como folha e PIS/Cofins, não voltará (a ser como antes). As desonerações que podem voltar são o IOF e o IPI, que são tributos regulatórios.

Quando o senhor diz ´voltar´, está dizendo que desonerações como a do IPI da linha branca não serão prorrogadas?

Não vou falar especificamente porque essas questões mexem com o mercado. Estamos numa linha de recompor impostos sobre o consumo e isso já está acontecendo.

Quanto o senhor fala de IOF, é o que incide sobre o crédito?

O IOF incide sobre várias coisas, inclusive sobre o crédito… Estava dizendo quais são os tributos que podem ser recompostos, mas eu não vou antecipar porque isso interfere no mercado. No caso do IPI, já tem uma programação.

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Então, para os outros tributos também pode ter uma programação…

O IOF também é muito usado como regulador. Por exemplo, nós baixamos o IOF agora para aplicações em renda fixa, aplicações em renda variável e tomada de crédito lá fora para nos adaptarmos às condições.

O novo corte no Orçamento que o governo pode ficar próximo de 10 bilhões de reais?

Não vou falar o dado, mesmo porque não temos o número final, mas será o corte que pode ser feito nessas circunstâncias e que vai fortalecendo o resultado primário. Com as condições de hoje, temos garantido o primário do governo central.

Então qual o objetivo desse novo corte de gastos?

O objetivo é criar um colchão, uma reserva de primário para caso os Estados e municípios não venham a fazer sua parte… Até agora, já fizemos mais da metade da meta que temos que cumprir. Os governos estaduais estão um pouco abaixo, fizeram menos da metade, mas têm a chance de fazer até o fim do ano.

O senhor pode aumentar para acima de 45 bilhões de reais o desconto na meta de primário neste ano? O governo tem essa margem porque a lei prevê até 65,2 bilhões de reais.

A lei permite e nós trabalhamos com uma perspectiva de 45 bilhões de reais, foi montado assim. Agora, depende do desempenho dos governos estaduais. Se eles cumprirem a parte deles, está fechado nessa base. Mas, por via das dúvidas, como poderão frustrar uma parte, é por isso que faremos corte.

O corte de gasto pelo governo pode ser um problema para o crescimento?

Não acredito, porque não vamos cortar investimento, vamos cortar gastos de custeio menos essenciais, que são funcionamento das máquinas. Em compensação, acreditamos que com essa conduta haverá confiança maior do mercado para fazer investimentos.

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Haverá corte das emendas parlamentares?

Não está previsto corte nas emendas.

No lado da receita, o senhor espera um bom resultado da receita de concessões de infraestrutura previstas para os próximos meses?

Sim.

O último decreto possuía a previsão de receita para o governo de 15 bilhões de reais com as concessões?

O último relatório de despesa e receita não estava com clareza o campo (de petróleo) de Libra. Não vou falar em números, mas posso dizer que o número do relatório era inferior ao valor do campo de Libra, que foi definido recentemente.

Então vai entrar uma receita adicional e que ajudará nas contas?

Claro que ajuda.

A Petrobras tem de entrar com o mínimo de 30% de participação nos lotes do leilão do campo de Libra. Então, no mínimo, ela responderá por 30% do bônus. A Petrobras vai pagar isso com caixa próprio ou o Tesouro ajudará a compor esse capital?

Não tem nada a ver Tesouro com Petrobras e não estou falando como presidente do Conselho da Petrobras e não posso revelar nenhuma intenção da companhia, o que vai fazer ou deixar de fazer. O que sabemos é que a lei diz que a Petrobras pode exercer 30 por cento e é a operadora do campo, então a Petrobras viabilizará isso do jeito que puder.

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O governo está tentando recuperar a confiança dos agentes do mercado?

Vamos colocar as coisas em seus devidos termos. O que abalou a confiança dos mercados ultimamente foi a ação do Federal Reserve, que criou um estresse financeiro na economia mundial quando começou, de forma não muito organizada, a anunciar que iria desativar os estímulos monetários. Aqui (no Brasil) não faltava confiança.

E essa mudança na política do Fed é um problema?

O problema não é da mudança em si, que é positiva. Acho positivo que os Estados Unidos diminuam sua injeção de dólares no mercado. A questão é que essa transição para um estímulo menor tem que ser bem administrada. E, felizmente, o Ben Bernanke (chairman do Fed) fez boas declarações, dando maior clareza sobre como isso ocorreria.

O discurso do Fed não tem sido bem compreendido?

O mercado sempre exagera e se antecipa. Quer adivinhar o que vai acontecer para lucrar e quem sai na frente é quem lucra mais, e essa é a regra do mercado. No início, o Fed foi pouco claro na trajetória, muitos diretores falaram ao mesmo tempo às vezes em direções confusas e contraditórias, mesmo a ata do Fed não era clara, dava margem a várias interpretações.

O que aconteceu nesse período?

Isso paralisou os negócios financeiros, paralisou IPOs (ofertas iniciais de ações), causou problemas, incertezas num cenário em que a economia mundial não está bem.

Isso mudou nos últimos dias?

Na quarta-feira, Bernanke fez pronunciamento mais claro dizendo que não iria necessariamente diminuir estímulos no curto prazo… Com isso os mercados se acalmaram. Porque quando há volatilidade no câmbio, isso atrapalha todos os negócios.

O senhor acha que isso levará a uma menor volatilidade?

Essa semana já tivemos menos volatilidade. Não sei se a volatilidade vai terminar, porque isso depende das próximas declarações e do que os mercados entenderam. Acho que deu uma acalmada.

E qual será a consequência para o Brasil?

Quando acalmar, teremos a volta de aplicações financeiras para o Brasil em renda fixa e para a bolsa, porque quando do dólar se valoriza, a aplicação externa pode perder recursos no Brasil.

Isso acontecerá ainda em 2013?

Acontecerá em algumas semanas. Sinto que podemos estar no início de uma superação dessa turbulência. Não tenho certeza, mas os sinais são positivos.

O que ocorrerá com o câmbio nas economias emergentes?

Os câmbios dos países emergentes não voltarão aos patamares anteriores, ficará todo mundo com um câmbio um pouco mais desvalorizado do que estava antes do início dessa turbulência e teremos competitividade maior para exportamos para os EUA.

O Brasil fica em situação melhor?

Sim, nossas exportações vão ficar mais baratas.

O dólar ficou quinta-feira em torno de 2,22 reais na quinta-feira. É um patamar bom para a indústria ou há muitos riscos?

Diria que os empreendedores brasileiros tem hedge. Não tivemos o problema de derivativos que tivemos em 2008, dessa vez não houve nenhum problema. Nós oferecemos liquidez, o Banco Central fez swap e fez também leilão de linha de crédito em dólar.

Na ata da última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o BC apontou que o dólar valorizado pressiona a inflação. Como o senhor vê isso?

Por definição, quando se desvaloriza o câmbio, pressiona a inflação. Não sabemos qual ´pass trough´ disso. Como estamos com economia mundial com crescimento baixo e esse movimento dos EUA diminui aplicações em commodities e aí caem um pouco, então a tendência no mundo é desinflacionária. Por enquanto, estamos com um mês de elevação do câmbio e até agora a inflação está caindo.

A inflação foi uma das causas do abalo na confiança no país?

Sim. A inflação causa temor, dificulta planejamento das empresas, causa perturbação da economia e, por isso, tem que ser combatida… Foi talvez o maior problema que enfrentamos no primeiro semestre, felizmente isso está sendo superado.

O fato de o BC ter sido mais agressivo do que parte do mercado esperava é uma das reações com efeito nas expectativas?

O BC fez o que tinha que fazer e isso também ajuda a recompor as expectativas. É preciso combater a inflação mesmo a custa de sacrifícios e juros altos. Isso foi feito. A inflação está sob controle, sempre esteve sob controle, teve um surto e as pessoas só acreditam depois que cai mesmo.

Se o BC subir os juros no ritmo que está sendo feito, há a preocupação de esfriar a economia?

Estamos hoje com os juros reais mais baixos da história do país. Para frear a economia, causar recessão, é preciso uma taxa muito elevada e não sei se eles vão fazer, pergunte a eles.

O que o sr. espera do crescimento para o segundo trimestre?

O crescimento começou bem no ano, fizemos 0,6% no primeiro trimestre. O segundo trimestre ia bem, porém tivemos esse evento do Fed e também tivemos as mobilizações sociais. Isso segurou um pouco o crescimento. A trajetória foi alterada, era mais positiva. Temos que esperar o segundo semestre, que terá muitos fatos positivos.

Quais são esses fatores positivos?

A inflação para baixo, as concessões, a produção da Petrobras aumentará. A queda da inflação tem influência sobre o consumo, porque quando sobe, o consumo cai. Depois os dissídios salariais recompõem o poder de compra, haverá recomposição (da renda) e o consumidor voltará a ter capacidade de consumo.

Qual é a previsão do sr. para o PIB do segundo trimestre?

Não arrisco uma previsão porque houve perturbação inesperada, não sei qual o resultado econômico de junho, só tenho dados até maio. Mas não deve ser muito diferente do resultado do primeiro trimestre, pode ser um pouco melhor.

O governo tem esperança de que o segundo semestre vai ser melhor. Mas no lado fiscal não há mais espaço para estímulos. É isso?

Não temos (espaço para mais estímulos). Agora, nós demos os estímulos e eles estão presentes, como o custo da energia elétrica reduzido… O cenário só não é mais favorável porque a economia internacional não deixa, porque o comércio internacional está parado.

Parece que o governo não tem mais armas para dar estímulos à economia.

Nós usamos as armas e estão surtindo efeito. Não é que não temos mais armas…. Mesmo em um cenário internacional adverso temos chances de crescer um pouco mais. Não estou achando que vamos crescer uma fábula, 6 , 8 por cento. A economia internacional nos tira 1,5% do crescimento potencial que teríamos.

O PIB potencial do Brasil é 3%?

Diria que hoje nosso PIB potencial é 4% em média, embora este ano nós não cresceremos 4 por cento. Mas teremos um potencial para isso.

Se o sr. vê o PIB potencial em 4% e se a economia mundial tira 1,% desse crescimento, estamos falando de um crescimento de 2,5% este ano?

Os dados não são precisos, mas pode ser entre 2,5% e 3%, pode ser.

O governo pode aumentar a taxa de retorno das concessões em infraestrutura que está preparando?

Para rodovias, há uma belíssima taxa de retorno e negociei isso. Sentamos na mesa com todas as concessionárias, discutimos e todos disseram que é atraente do jeito que está. O primeiro lote de ferrovia, cuja licitação vai sair mais rápido, fixamos em 8,5 por cento a taxa de retorno do projeto, a do investidor é em torno de 15%. É uma excelente taxa de retorno. Estamos oferecendo condições de financiamento muito favoráveis.

A situação internacional pode afetar o financiamento desses projetos?

Afeta um pouco, porque não vamos conseguir fazer todas essas concessões só com capital nacional, precisaremos de capital externo. E, neste momento, o mercado internacional está um pouco estressado. Mas a tendência é que o mercado internacional se normalize e tenhamos investidores, porque o negócio é bom e rentável.

(com agência Reuters)

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