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Mais competitiva, energia solar cresce, gera emprego e mira inclusão

Mesmo na pandemia, setor cresceu 45% no primeiro semestre e gerou 47 mil novos empregos; futuro é promissor, mas esbarra em fatores como dólar e logística

Por Diego Gimenes
Atualizado em 7 out 2020, 15h37 - Publicado em 7 out 2020, 08h00

As instalações de energia solar são tendência no Brasil e no mundo. Desde 2012, a fonte é uma das que mais cresce no país. Foi justamente naquele ano que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) publicou a resolução normativa 482, que criou regras e permitiu aos consumidores realizarem a troca da energia gerada com a da rede elétrica. Logo em seguida, no ano de 2013, aconteceram os primeiros leilões estaduais para a instalação de usinas de energia solar e, em 2014, ocorreram os leilões federais para a construção das usinas de grande porte para atender a população — a maior delas está localizada na cidade de São Gonçalo, no Piauí, inaugurada em janeiro de 2020. Esses marcos, ainda que recentes, são fundamentais para explicar o crescimento dessa fonte renovável no Brasil. Outro fator muito importante para o bolso dos empresários e da população em geral — e que é uma consequência dessa evolução rápida — tem relação com a queda de preço da geração, ano após ano. Nos últimos 10 anos, houve uma drástica redução, de 85% do custo, associado à ampliação, ainda que pequena, da nacionalização da produção e aos programas de isenção de impostos do governo.

Dessa forma, apesar da pandemia, o setor apresentou crescimento de 45% em número de instalações no primeiro semestre de 2020 no Brasil. Consequentemente, foi capaz de gerar emprego em um dos momentos mais difíceis da história do país, fragilizado pela crise de saúde. Ao todo, foram abertos 47 mil novos postos de trabalho em toda a cadeia, que vai dos engenheiros até os técnicos de instalação. “O setor tem muita resiliência e pode ser uma alavanca importante para acelerar a recuperação da economia brasileira. São mais de 190 mil empregos acumulados desde 2012, mostrando a robustez do setor, que já crescia mesmo em outras crises, como as de 2015 e 2016”, comenta Rodrigo Sauaia, presidente da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica, que foi a responsável pelo estudo. Sauaia ainda lembra que os investimentos privados no setor somam 33 bilhões de reais desde 2012 e que o Brasil apresenta 6,4 gigawatts (GW) de potência operacional da fonte solar fotovoltaica, apesar de ela representar atualmente pouco menos de 2% da capacidade em operação no país.

Hoje, a tecnologia é muito competitiva e capaz de produzir energia a preços menores do que se os consumidores a comprassem de terceiros. A alta competitividade aliada à abertura de novas linhas de financiamento permitem a inclusão da energia solar também para a população de baixa renda, prova disso é que está nos planos do setor a instalação desses sistemas nas casas do programa Casa Verde e Amarela, anunciado em agosto para substituir o antigo Minha Casa, Minha Vida. Essas medidas prometem derrubar o mito de que a energia solar foi feita somente para os ricos.

Em agosto, o governo federal decidiu zerar a alíquota de importação de diversos equipamentos de energia solar. Os impostos de importação para módulos solares são, em média, de 12%, enquanto os inversores pagam tarifas de 14%. A isenção é válida até o fim de 2021 e divide opiniões entre os especialistas. As empresas que suplicaram pela medida receberam a notícia de forma positiva, afinal, a mudança deve provocar redução de custos. Por outro lado, há críticas de que os produtos que tiveram as alíquotas zeradas são voltados para projetos de geração centralizada, como as grandes fazendas solares, gerando pouco benefício para os pequenos consumidores. Além disso, as fabricantes nacionais devem enfrentar ainda mais dificuldades, em vista que a nacionalização da produção ainda é pequena. Logo, as fabricantes locais esperam que a medida aumente ainda mais a concorrência, que já considera desleal. A isenção, por esse ponto de vista, se transformou num desafio adicional para a produção brasileira.

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A reforma tributária também está na mira do setor. O governo estuda a criação do chamado “imposto verde”, com o objetivo de diminuir as emissões de carbono na atmosfera e frear o aquecimento global, além de tentar reduzir o desmatamento no país, por meio da destinação de parte da arrecadação para fundos com esse propósito. A adoção desse imposto pode impulsionar a geração de energia solar do país, por ser uma das fontes renováveis mais competitivas atualmente. “Temos uma oportunidade importantíssima a curto prazo, junto com o Congresso Nacional, de incorporar um tratamento tributário positivo para a energia solar nessa reforma”, afirma o presidente da Absolar.

Em outros países, o imposto é usado para taxar atividades poluentes que contribuem para o aquecimento global e acabam por auxiliar na expansão das energias provenientes de fontes renováveis. Um relatório da BloombergNEF, publicado no começo do mês de setembro, indica que, pela primeira vez na história, as energias solar e eólica responderam pela maior parte da nova geração de energia do mundo. Apenas a solar representou 45% de toda a nova capacidade energética em 2019. Ao acrescentar a eólica, dois terços da chamada “nova energia” no mundo são provenientes dessas duas fontes. Para se ter uma ideia, em 2010 ambas representavam apenas um quarto da nova geração. Considerando a energia gerada total, as fontes renováveis — o que também inclui as hidrelétricas — representaram 27% do total produzido no mundo.

Outro levantamento, dessa vez elaborado pela organização ambiental britânica Ember, indica que em países da Europa o percentual de energia produzida pelos aerogeradores e painéis solares é muito maior. Na Alemanha, por exemplo, esse índice chega a 42%. No Reino Unido, alcança 33%. Apesar da tropicalidade brasileira, por aqui o percentual não passa dos 10%. “Um dos maiores problemas ainda é a logística, em especial, para projetos de grande escala”, analisa Talvani Hipólito Nolasco Filho, diretor de desenvolvimento de novos negócios da Statkraft no Brasil. “Em compensação, temos, em média, 30% de fator de capacidade. Na Irlanda, por exemplo, contratos recentes foram fechados com apenas 10% desse mesmo fator. Por ser um país tropical, a energia solar brasileira é uma das mais competitivas do mundo, mesmo com todas as dificuldades apresentadas.”  Esse índice mostra a capacidade de geração. A Statkraft é a maior geradora de energia renovável na Europa. “Outra dificuldade é o dólar, hoje não é possível ter uma matéria 100% nacional para a construção de módulos, representando algo entre 40% e 50% da instalação”, informa o especialista.

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O otimismo do setor também passa pela possibilidade de inclusão da energia solar em residências populares. Uma família média brasileira, ou quatro pessoas morando numa pequena residência, apresenta um consumo de energia elétrica na faixa de 190 quilowatt-hora (kWh) por mês. Essa família precisaria de um sistema fotovoltaico que custaria de 10 mil a 15 mil reais e que reduziria na faixa de 80% a 90% o consumo de energia elétrica, com retorno de investimento no prazo de 4 a 7 anos e durabilidade de 25 anos do sistema. Já, para uma habitação popular, o presidente da Absolar acredita que com menos de 5 mil reais seria possível montar um sistema que reduz 70% do consumo de energia elétrica de uma família de baixa renda, o que tornaria a tecnologia acessível aos programas sociais. “Estamos mantendo diálogo com o Ministério do Desenvolvimento Regional sobre o assunto e otimistas de que o governo federal vai incorporar a tecnologia no programa Casa Verde e Amarela, em favor dos consumidores brasileiros mais vulneráveis e que foram fortemente impactados pela pandemia”, revela Sauaia.

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Um dos principais exemplos de utilização em massa das energias de fontes renováveis ocorre no estado americano da Califórnia. Por lá, todas as térmicas foram desligadas nos últimos cinco anos para dar espaço à geração solar. O que se discute entre os especialistas é se o risco iminente de um apagão é proveniente das fontes renováveis. A resposta seria que não. São dois os fatores principais que explicariam a crise de energia na Califórnia: o primeiro é de gestão, investigações de longa data apontam falhas na manutenção das linhas de transmissão de energia do estado, o que contribuiu para a propagação de grandes incêndios e culminou na condenação seguida de falência de uma gigante de energia elétrica do país, a PG&E; o segundo fator é o próprio mecanismo da rede elétrica americana, que restringe o “intercâmbio” de energia proveniente de outros estados. A probabilidade disso ocorrer no Brasil é pequena, pois a nossa rede elétrica é nacionalmente integrada, ou seja, quando uma fonte está escassa, é possível aproveitar a abundância de outros recursos para completar o atendimento àquela determinada região enfraquecida. “Se subestimarmos o crescimento de energia solar, isso pode de alguma forma gerar um efeito colateral negativo para o sistema, mas ainda temos alguns anos para planejar com calma e aprender com os erros dos outros países”, tranquiliza Nolasco Filho, da Statkraft Brasil.

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