Fórum VEJA/Lide em Zurique: em debate, questões vitais para futuro do país
Autoridades da República e empresários brasileiros e estrangeiros discutiram os caminhos do Brasil
Um dia inteiro com algumas das mais altas autoridades da República, com tempo para expor com clareza suas visões sobre questões vitais para o país, e para um diálogo direto e profícuo com empresários e investidores, brasileiros e estrangeiros, dos mais diversos setores. Esse foi o ambiente proporcionado pelo Brazil Economic Forum Zurich, uma realização conjunta da Editora Abril, por meio de VEJA, e do Lide-Grupo de Líderes Empresariais, na sexta-feira 19 de janeiro. O local foi o charmoso hotel Baur au Lac, com vista para o lago que banha a maior cidade da Suíça e seu centro econômico-financeiro.
Organizado como uma série de painéis seguidos de tempo para perguntas e respostas, o encontro percorreu um leque de assuntos cruciais da política, da economia, dos investimentos e da sustentabilidade. Grandes problemas nacionais e as soluções para enfrentar os obstáculos foram debatidos, assim como as vantagens comparativas do Brasil e o que fazer para tornar o cenário mais propício ao desenvolvimento e aos negócios. A presença das lideranças de dois poderes da República, o presidente do Congresso e do Senado, senador Rodrigo Pacheco, e o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Luís Roberto Barroso, assim como do ex-presidente Michel Temer, permitiu uma ampla conversa sobre a ordem jurídica e institucional.
Rodrigo Pacheco defendeu o fim da reeleição e mandatos de cinco anos no Executivo, considerando que o fortalecimento das instituições e da economia é pressuposto para o vigor da democracia. Para ele, a modernização do sistema eleitoral é uma das prioridades de 2024. “Faremos uma rediscussão acerca do nosso modelo. Há o questionamento: o instituto da reeleição para presidente, para governador, para prefeito deu certo no Brasil? Foi positivo ou negativo? O meu propósito, particularmente, é colocar o fim da reeleição no Brasil”, disse o senador. O argumento é que essa mudança pode trazer economia ao país sob o olhar do fundo eleitoral e também na Justiça Eleitoral, que tem um custo de 11 bilhões de reais por ano. “Mais importante que essa economia é que o Brasil saia desse estado de permanência eleitoral”, afirmou Pacheco.
No plano mais econômico, Pacheco fez um anúncio que deu grande repercussão. Disse que havia fechado um acordo com o presidente Lula e com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para renovação da desoneração da folha de pagamento de dezessete setores. Essa fala, no entanto, provocou Haddad a declarar que o presidente Lula ainda precisa ser ouvido e que não há decisão tomada. É o tipo do vaivém que justifica por que a insegurança sobre regras foi um dos grandes temas em Zurique. Luís Roberto Barroso abordou esse tema, sobre o qual se manifestaram executivos presentes, relatando casos de dificuldades que suas empresas têm com a demora de processos na Justiça, os licenciamentos ambientais e outros que atrasam e tornam os negócios inseguros.
O presidente do Supremo considerou que “há uma certa lenda” sobre insegurança jurídica, e argumentou que em sentido amplo o país oferece segurança ao investimento. Mas admitiu que há três áreas com “ambientes de incerteza”: a trabalhista, a tributária e a de saúde. Na trabalhista, embora a reforma feita no governo Temer tenha reduzido as reclamações na Justiça, Barroso disse que persiste uma “indústria de processos”, valendo-se da regulação ainda muito complexa e do fato de que há empresas que não cumprem as normas. Na área tributária, o ministro espera que a reforma recém-votada melhore um quadro em que o Brasil tem recorde mundial, acumulando 5 milhões de ações nos tribunais. No setor da saúde, a complicação das leis também resulta numa enorme litigância, em especial contra o poder público.
Entre os problemas brasileiros crônicos que precisam ser atacados, Barroso chamou a atenção para a violência e a disseminação do crime. Apontando o apuro pelo qual passa o vizinho Equador, disse que “o Brasil corre o risco de perder a soberania da Amazônia não para outros países, mas para o crime organizado”. Por outro lado, o presidente do STF listou fatores positivos que o país vem reunindo. Entre eles, a aprovação da reforma tributária, o crescimento do produto interno bruto em 3%, acima do esperado para 2023, a queda do desemprego, a inflação mantida abaixo do teto perseguido pelo Banco Central, permitindo o corte de juros, e a redução de 50% no desmatamento da Floresta Amazônica no ano passado.
A essa lista estimulante, outros participantes do fórum acrescentaram mais pontos. Os recordes de produção do agronegócio e do saldo da balança comercial, que beirou 100 bilhões de dólares. A recente elevação da nota de crédito do país por agências de classificação de risco. A matriz de energia elétrica majoritariamente limpa, com potencial para gerar muito mais com sustentabilidade. O enorme patrimônio de riqueza da própria região amazônica, que foi exemplificado pela exposição do empresário Milton Steagall, do Grupo BBF. Sua empresa, presente em cinco estados da Região Norte, produz palma de óleo sem causar desmatamento, uma diferença em relação à produção do Sudeste Asiático. “Nosso desafio é mostrar aos mercados americano e europeu que nossa produção não danifica a floresta”, disse Steagall. O óleo é utilizado para produzir biodiesel, mais uma alternativa sustentável em que o Brasil tem liderança.
No mesmo campo, da energia, o presidente da Shell, Cristiano Costa, fez uma apresentação sobre a atuação da empresa britânico-holandesa, há um século presente no Brasil. Ele destacou que a operação local está entre as cinco maiores do grupo no mundo. E disse que, por ser um dos países com a matriz energética mais limpa, a Shell tem apetite para aumentar o investimento no Brasil. Atualmente, a empresa é a segunda produtora brasileira de petróleo. A Shell também é sócia do grupo Cosan, produtor de etanol, na Raízen. “A qualidade da nossa parceria na Raízen é sempre enaltecida nas reuniões do board da companhia em Londres”, afirmou Costa.
Embora existam desafios pela frente, na visão de alguns importantes palestrantes, o cenário para o país é otimista. “O Brasil atrai investimentos. Oferecemos estabilidade política, econômica e social”, disse o presidente do conselho de administração do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco. “Temos vantagens que nos tornam competitivos em um mundo que busca a paz.” O testemunho de um investidor estrangeiro, o espanhol José Manuel Entrecanales, presidente global do grupo de construção e energia Acciona, corrobora o que disse Trabuco. Ele deu uma visão sobre problemas e atrativos do Brasil. “Passamos muitos anos difíceis porque tentamos nos manter longe dos problemas, digamos, éticos, do nosso setor”, disse. “É um setor complicado.” Ele afirmou, no entanto, que a experiência da empresa na construção da Linha 6-Laranja de Metrô de São Paulo, a maior obra de infraestrutura urbana da América Latina, deu mais confiança no mercado brasileiro. “Estamos ainda mais interessados. O Brasil tem talento, instituições, um sistema econômico invejavelmente estável, escala e recursos naturais. Além disso, vimos que as instituições e a sociedade em geral apoiam não só esse grande projeto, mas também outros que, sem dúvida, serão realizados no futuro”. O Brazil Economic Forum Zurich mostrou que há muito a fazer por esse futuro propício ao investimento e ao desenvolvimento.
Publicado em VEJA de 26 de janeiro de 2024, edição nº 2877