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Carne fake, lucro real

Fabricante de hambúrgueres à base de plantas faz abertura de capital na bolsa americana e mostra que alimentos vegetarianos têm mercado para além do nicho

Por Lucas Cunha
Atualizado em 30 jul 2020, 19h47 - Publicado em 10 Maio 2019, 07h00
(Arte/VEJA)

Não é só com programas de computador e serviços tecnológicos que Bill Gates, um dos homens mais ricos do mundo, sabe ganhar dinheiro. Em 2013, o gênio por trás da Microsoft foi desafiado a comer uns tacos de frango e depois dizer qual deles não tinha carne de verdade. Sem saber o que responder, Gates tomou a decisão de investir na fabricante daquele “frango vegano”, a Beyond Meat, que prometia desenvolver alimentos feitos de plantas que pudessem atrair consumidores para além do restrito grupo de vegetarianos e veganos, que condenam qualquer fonte animal de proteína. “O que eu estava experimentando era mais do que um substituto esperto da carne. Era o sabor do futuro da comida”, descreveu o empresário em seu blog. Se seu paladar não estava assim tão aguçado, seu faro para negócios, mais uma vez, estava correto.

Na quinta-feira 2, a Beyond Meat abriu seu capital na bolsa americana Nasdaq com estrondoso sucesso. O valor inicial de cada ação era de 25 dólares, e, no fim do dia, os papéis já estavam sendo negociados a mais de 65 dólares, uma alta de 163%. Tendo como primeiro objetivo estabelecer-se como unicórnio, termo usado para uma startup independente que alcança o valor de 1 bilhão de dólares, a Beyond Meat terminou a última semana avaliada em 4,5 bilhões de dólares, o que foi entendido pelo mercado como um sinal claro: os substitutos da carne não são apenas um modismo restrito a alguns nichos. “A ideia predominante era que alimentos produzidos com plantas fossem exclusivos para vegetarianos, mas empresas como a Beyond Meat estão provando que é possível fazer uma comida vegetal que também agrade a comedores de carne”, diz Bruce Friedrich, diretor do Good Food Institute.

Embora seja o exemplo mais vistoso no momento, a Beyond Meat não está sozinha nesse mercado. Nascida no Vale do Silício, berço do movimento vegetariano nos Estados Unidos e também da última revolução tecnológica, a Impossible Foods faz um hambúrguer cuja textura, aroma e gosto são semelhantes aos do sanduíche tradicional. Melhor ainda, a produção de seus ingredientes utiliza cerca de 75% menos água, emite 87% menos gases do efeito estufa, ocupa 95% menos terra e, claro, emprega 0% de carne. Para realizar tal façanha, ela usa um composto de proteínas de batata, óleo de coco, ervilha, soja e levedura para atingir a textura e o sabor próximos aos da carne animal e beterraba para simular a cor e o sangue do alimento original. No mês passado, a companhia fechou uma parceria com o Burger King para oferecer o lanche vegetariano impossible whooper em algumas cidades nos Estados Unidos. A expectativa é vender o sanduíche no país inteiro até o fim do ano.

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A tendência por uma alimentação mais saudável, não prejudicial ao meio ambiente e zelosa do bem-estar dos animais vem ganhando cada vez mais espaço na indústria de alimentação. Entre os anos 2013 e 2018, houve um salto de 39% na venda de subs­titutos da carne em todo o mundo, ­alcançando 18 bilhões de dólares. Quan­do se trata de alimentos vegetarianos e veganos em geral, a cifra chega a 52 bilhões de dólares. Em mercados emergentes, como o Brasil, o padrão tende a se repetir. O país hoje é o sexto no mundo com maior crescimento no número de vegetarianos. Segundo uma pesquisa do Ibope encomendada pela Sociedade Vegetariana Brasileira, esse grupo soma 16 milhões de pessoas. “O acesso à informação e a diferentes produtos fez com que os jovens alinhassem seus valores aos hábitos de consumo, o que massificou esse tipo de alimento“, diz Alexis Frick, gerente de pesquisa da consultoria Euromonitor no Brasil. “A expectativa de que sua voz será ouvida e atendida faz com que os millennials acreditem que podem impactar o mundo com suas escolhas.”

O impacto por aqui ainda não chega perto do que acontece nos Estados Unidos. Mas algumas empresas já estão atentas às demandas desse consumidor mais consciente e vêm crescendo com isso. É o caso da Fazenda Futuro, startup cuja capacidade produtiva já alcança 150 toneladas mensais de carne vegetal, que lançou na última semana o Futuro Burger, para ser vendido em supermercados e hamburguerias do Rio de Janeiro e de São Paulo. “Nós nos preocupamos em produzir um hambúrguer mais saudável que o de carne animal, mas a um preço mais baixo, o que dificilmente acontece com alimentos vegetarianos”, afirma Marcos Leta, fundador da startup. A aposta de Leta é que há uma demanda grande por esse tipo de alimento, mas o custo alto acaba afugentando o consumidor. A Behind the Foods, empresa fundada em São Paulo em 2016, organizou um pré-cadastro para aferir o apetite das lanchonetes do país por seu hambúrguer vegetal. Seu site recebeu tantas inscrições que ela teve de aumentar sua produção, de 3,3 toneladas para 300 toneladas em apenas três meses. Apesar de disputarem um mesmo nicho de mercado, as duas foodtechs não querem concorrer entre si, mas roubar clientes dos frigoríficos. Se Bill Gates apostou nessa ideia — e faturou com ela —, é melhor os abatedouros levarem a concorrência vegana a sério.

Publicado em VEJA de 15 de maio de 2019, edição nº 2634

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