Aos 20 anos, Google quer tornar usuário ainda mais dependente dele
No mercado de tecnologia, a empresa não pode deixar de evoluir. E o Google está fazendo isso neste exato momento
Em 27 de setembro de 1998 nascia um mito. A empresa que moldaria a forma com que a sociedade global consumiria informação era lançada a partir de um pequeno escritório no Vale do Silício, na Califórnia. Larry Page e Sergey Brin, que investiram 100 mil dólares no projeto, foram os responsáveis pela criação do Google. Vinte anos depois, a terceira empresa mais valiosa do mundo quer reforçar a dependência por seus serviços e dessa forma tornar-se ainda mais onipresente.
Em 2018, o Google detém a liderança dos mercados de buscas, de publicidade online, de hospedagem de e-mail e de sistemas operacionais para celulares. Isso faz com que seu nome seja confundido com a própria internet. Um exemplo: a definição mais fácil para o grupo de sites não indexados nos mecanismos de busca, a Deep Web, é “a internet além do Google”.
No decorrer dessas duas décadas, as pessoas reduziram as idas a bibliotecas, fizeram menos perguntas a professores e pessoas mais velhas, e até passaram fazer autoconsultas médicas no buscador, o famoso Dr. Google. A informação, que antes precisaria de uma pesquisa para ser encontrada, passou a ser encontrada após uma busca instantânea.
O Google moldou desde os relacionamentos (quem não se lembra do Orkut) à forma como ganha-se dinheiro no mundo. A empresa criou o modelo winner takes all, ou o vencedor leva tudo, que pauta o plano de negócios de todas as grandes empresas de tecnologia. A lógica é criar um monopólio e navegar sozinho em mar regido sob as próprias regras.
Apesar de não ser o único mecanismo desse tipo disponível, afinal a companhia detém 60% do mercado – Microsoft e Yahoo detêm 21% e 12% respectivamente –, seu nome virou verbo. Esse é o principal motor que faz com que a Alphabet, holding criada para cuidar de todas as empresas do grupo, valha 832 milhões de dólares.
Em um mercado dinâmico, como o de tecnologia, a empresa não pode deixar de evoluir. E ela está fazendo isso neste exato momento. Em seu aniversário, o Google fará uma atualização severa em seu mecanismo de busca ao implementar novas funcionalidades de inteligência artificial. Se faltar luz no seu bairro, o buscador saberá. E ao fazer qualquer pesquisa relacionada ao tema, o motor de busca mudará os resultados exibidos a você. É uma tentativa de deixar seus rivais obsoletos e garantir que o usuário se mantenha fiel ao Page Rank – trocadilho entre o nome do fundador e o algoritmo responsável por hierarquizar os resultados da busca.
“Focamos no usuário. Seja quando você busca receitas, estuda para uma prova ou procura informações sobre onde votar, estamos focados em entregar a informação que você precisa”, escreveu Ben Gomes, vice-presidente de busca, notícias e assistente, em seu blog.
Para Luiz Peres Neto, pesquisador do programa de pós-graduação em comunicação da ESPM, é difícil imaginar uma internet sem o gigante do Vale do Silício. “Não sabemos qual o futuro do Google em 20 anos. Mas a corporação soube, em momentos muito críticos, tomar decisões arriscadas e que deram certo”, afirma o pesquisador.
Ele cita as transformações causadas pela criação da publicidade programática como um exemplo da importância do Google, não apenas para o funcionamento, mas para a lucratividade da internet. “Hoje somos totalmente dependentes do Google, seja no campo pessoal ou no profissional”, decreta Peres Neto.
Gigantismo
Em 2017, a empresa conquistou uma receita de 111 bilhões de dólares. Ano a ano elas crescem. Não há um único corretor de Wall Street que não acredite que a empresa passará o valor de mercado de 1 trilhão de dólares, assim como Apple e Amazon.
Sua liderança e gigantismo sugere riscos para a sociedade. Como acreditar na idoneidade de uma empresa tão grande e que precisa gerar lucros altos para dar retorno a seus acionistas? Além disso, a quantidade de dados pessoais em posse do Google pode ser vista como algo indesejável para um grande número de pessoas e empresas.
“Quem nunca pesquisou no Google um produto e depois não se deparou com o anúncio no Facebook?”, questiona a advogada especialista em direito digital Gisele Truzzi. “Há pouca transparência em relação a coleta e tratamento de dados”, diz.
Às vezes, parece até que o Google ouve o que você conversa. Entre outros motivos, isso gerou uma reação global em relação à privacidade de dados. Na Europa, foi publicado o General Data Privacy Regulation (Regulação Geral da Privacidade de Dados) para resguardar os usuários. No Brasil, medida semelhante foi sancionada em agosto deste ano, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais.
Apesar do gigantismo, o Google não lidera em em todos os mercados em que atua. No segmento de computação em nuvem, por exemplo, os primeiros colocados são Amazon e Microsoft. Porém, ninguém duvida que o Google, que entrou tardiamente no mercado, irá tomar a galope fatias de mercado dos dois rivais. Como em outras apostas, a companhia não poupa dinheiro nem esforços para alcançar seus objetivos.
“O Google investiu 30 bilhões de dólares e já possui uma receita de um bilhão de dólares por trimestre”, afirma Mario Ciabarra, CEO da Quantum Metric. “O Google está estrategicamente posicionado para vencer esta guerra”, diz.
Doodle
O Doodle do Google desta quinta-feira presta uma homenagem ao aniversário de 20 anos da empresa. Nesses 20 anos, muita coisa mudou na empresa. As buscas, por exemplo, podem ser feitas em mais de 150 idiomas e em 190 países.
“Talvez, a nossa mais importante lição seja colocar o usuário em primeiro lugar. Isso faz parte da verdades que acreditamos e está presente no Google desde os nossos primeiros anos”, afirma a empresa. “O nosso objetivo é aprimorar cada vez mais a experiência do usuário na Busca, acrescentando cada vez mais recursos para que ele encontre as informações que precisa”, conclui.