Alta da Selic inibe Ibovespa, e futuro depende de demanda estrangeira
Investidor local se reposiciona com alta da taxa básica de juros, e fluxo estrangeiro será determinante para futuro da bolsa
A recente decisão do Banco Central de elevar a taxa básica de juros para 10,75% é um balde de água fria para o mercado. Embora esperada, a alta da Selic representa um fator adicional de dificuldade para as empresas, ao piorar potencialmente a alavancagem delas, em especial das mais endividadas. Os juros mais altos também têm impacto para a avaliação de preço, o “valuation”, das companhias listadas, que fica menos atrativo conforme a taxa sobe.
A esperada decisão para a Selic abre portas, agora, para que novas altas venham, trazendo perspectivas marginalmente piores para a bolsa de valores. Com isso, o investidor local, especialmente o institucional, reduz sua exposição a ações brasileiras, o que explica a queda do Ibovespa até o patamar dos 131 mil pontos nos últimos dias. Em um mês, a queda do índice já soma 3,21%.
Em meio a esse cenário, existe apenas uma coisa que pode mudar o rumo do mercado: a demanda dos estrangeiros por ações brasileiras. Isso porque, nos EUA, o Federal Reserve, banco central do país, deu início ao ciclo de cortes de juros — o que motiva o investidor global a recalibrar sua posição e buscar mercados considerados mais arriscados, caso dos emergentes. Embora parte desse movimento já tenha ocorrido, especialistas afirmam que há mais por vir, a depender das próximas sinalizações do Fed.
“As recentes quedas do Ibovespa mostram um pessimismo do mercado em relação à alta da Selic. A principal arma para conter a inflação também desacelera a economia e, obviamente, impacta as empresas de capital aberto”, afirma João Kepler, presidente da Equity Fund Group, em nota a clientes. “Por outro lado, a queda do juros nos EUA fará com que o fluxo migre para países emergentes, como o Brasil, por exemplo. Nas próximas semanas saberemos quem ganha essa queda de braço.”
Há quem argumente que o fluxo estrangeiro para o mercado brasileiro e outros emergentes já aconteceu em uma janela curta, nos últimos dois meses, e, depois, cessou. Alguns gestores destacam, porém, que um novo movimento de mesma natureza ainda pode acontecer no curto prazo.
“O aumento da Selic foi anunciado na quarta-feira após o fechamento do mercado, e a reversão do fluxo externo geralmente leva algum tempo para acontecer. Assim, a queda do Ibovespa pode ter sido influenciada por uma maior dependência do desempenho do mercado interno, que, com taxas de juros elevadas, tende a reduzir os lucros das empresas”, afirma Volnei Eyng, CEO da gestora Multiplike. “No entanto, há uma expectativa de que, no curto prazo, esses números possam se recuperar.”
A despeito da possibilidade de novos recursos estrangeiros inundarem o mercado local, as dúvidas em relação ao futuro da política monetária americana também entram como fator importante na definição do destino do dinheiro, já que as falas do presidente do Fed, Jerome Powell, deixaram em aberto os próximos passos da autoridade monetária — diferentemente do que havia sido feito até então, quando os sinais estavam mais claros.
“Nos EUA, o Fed tem mantido uma postura cautelosa em relação à redução das taxas de juros. A demora em realizar cortes mais expressivos, como o esperado 0,5 ponto percentual, gera incerteza nos investidores, que buscam melhores retornos em outros mercados”, diz Alex Andrade, CEO da Swiss Capital Invest. “Além disso, fatores como a desaceleração global, tensões geopolíticas e a valorização do dólar frente ao real também têm contribuído para um cenário de volatilidade.”