Sem juros, rotativo ainda tem taxas elevadas
Federação sugere medidas, como o estabelecimento de teto para empréstimos, e critica proposta que pode prejudicar varejo
*Informe Publicitário
Na esteira das declarações dadas pelo presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, nessa terça-feira (15), reforçando que o governo busca com os bancos alternativas para diminuir os juros cobrados no rotativo do cartão de crédito, entidades que defendem os interesses dos setores do comércio e de serviços se manifestaram pelo real engajamento em torno da manutenção do parcelamento de compras sem juros nessa modalidade.
A Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), por exemplo, é contrária ao fim do parcelamento sem juros. De acordo com a entidade – que lidera empresas do comércio, serviços e turismo no estado de São Paulo –, a medida não serve como antídoto para o problema e pode prejudicar milhares de negócios, em especial os micro e pequenos. A Federação listou uma série de propostas e, entre elas, sugere um teto para o rotativo, a exemplo do que já ocorre com o cheque especial.
A preocupação da FecomercioSP é que o limite, ou o impedimento, da utilização do parcelamento sem juros cause reverberações adversas na economia. O crédito, aliado ao emprego e à renda, é um dos pilares essenciais na determinação dos padrões de consumo da população. A entidade ainda lembra que o instrumento desempenha papel imprescindível no desempenho econômico do varejo nacional, atuando como um propulsor das inclusões financeira e social. Além disso, a medida poderia comprometer, ao invés de melhorar, a saúde financeira dos consumidores, exacerbando a inadimplência.
O presidente do BC disse que é “preciso achar um equilíbrio”, referindo-se ao rotativo, ao discorrer sobre a possibilidade de os bancos retirarem cartões de circulação caso haja limitação de juros nessa modalidade. “Por outro lado, a função do parcelado sem juros é muito importante para a economia e consumo”, pontuou durante almoço promovido pela Frente Parlamentar Mista do Empreendedorismo (FPE) e representantes do Instituto Unidos Brasil (IUB), em Brasília.
Para a FecomercioSP, a ideia pode ficar apenas no discurso e foi ostentada apenas para acalmar os ânimos do mercado. E é nessa busca de soluções compensatórias que se instala o risco de aleijar o parcelado sem juros, quando concretamente essa modalidade não é a maior responsável pela inadimplência.
Alavanca
Para o comércio, esse mecanismo não só funciona como uma alavanca do valor médio das transações como também aprimora, significativamente, a administração do estoque, já que, ao terem a possibilidade de parcelamento, os consumidores podem adquirir outros produtos. Além disso, é importante reconhecer que o rotativo no cartão e o parcelamento sem juros são instrumentos diferentes. No primeiro caso, os juros incidem sobre o valor da fatura quando o consumidor não paga dentro do prazo. Já no segundo, um acordo é firmado entre consumidor, lojista e administradora de cartões para viabilizar as vendas do varejo. A mistura dos conceitos, alerta a FecomercioSP, pode gerar grandes problemas à economia caso o fato não seja levado em conta nas propostas.
Segundo a Federação, a concepção de que os exorbitantes juros do rotativo se devem ao parcelamento sem juros carece de precisão analítica. O dilema reside, pelo contrário, nas taxas astronômicas associadas ao instrumento. Essa análise se torna ainda mais evidente quando se nota a envergadura financeira que o mercado emissor de cartões de crédito representa.
Um levantamento realizado pelo J.P. Morgan revela que o universo dos cartões de crédito é intrinsecamente lucrativo, e os juros rotativos não desempenham papel primordial para equilibrar os custos inerentes ao parcelamento – modalidade essa que, por sinal, configura-se como um manancial de rentabilidade para os bancos. Em 2022, o segmento emissor de cartões de crédito mobilizou impressionantes 85 bilhões de reais. Desse volume financeiro, a Tarifa de Intercâmbio (TIC) correspondeu a 23,7 bilhões de reais (representando 28%), enquanto o rotativo abarcou 26,9 bilhões de reais (equivalente a 32%) e o parcelamento onerado com juros atingiu 22,3 bilhões de reais (ou 26% do total).
Além disso, os emissores colhem benefícios advindos de outras tarifas, como as anuidades pagas pelos portadores dos cartões. Dessa forma, conclui a entidade, é evidente que há margem para que as instituições financeiras procedam com a redução das taxas de juros no rotativo. Para enfrentar esse desafio, a FecomercioSP propõe:
- estabelecer limites para empréstimos de acordo com a faixa de renda do consumidor;
- promover a competição no mercado de crédito: diminuir barreiras para encorajar novos agentes a entrar no mercado;
- fortalecer a segurança jurídica: tornar o processo de empréstimo mais transparente e ágil;
- adotar iniciativas de educação financeira/uso consciente do crédito: conscientizar acerca dos riscos envolvidos e disponibilizar informações com linguagem acessível aos usuários – medida reconhecida como eficaz pelo próprio Banco Central.