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Não era só Powerpoint

Idealizado há mais de dez anos por Eike Batista para ser o pináculo de seu império, o Porto do Açu deslanchou: virou um dos terminais mais modernos do mundo

Por Fernanda Thedim
Atualizado em 29 mar 2019, 07h00 - Publicado em 29 mar 2019, 07h00

Nos idos de 2007, Eike Batista estava com tudo. Seus negócios de mineração, construção naval, energia e óleo e gás (para ficar só nos principais) decolavam, e o empresário era recebido e festejado por autoridades e investidores. O sucesso permitia que sonhasse grande. Quando ouviu de um secretário do governo fluminense a história de que a Marinha dos Estados Unidos tinha identificado, ainda em 1942, um ponto no litoral norte do estado do Rio de Janeiro com as características geográficas ideais para uma base naval (ou um porto civil), Eike vislumbrou seu maior projeto. Batizou-o de Cidade X — todos os seus empreendimentos traziam um X no nome “para multiplicar os lucros” — e começou a desenhar um complexo cujo principal pilar seria o Porto do Açu, um superporto para exportação dos minérios de sua MMX e do petróleo de sua OGX, além de escoar contêineres de terceiros. Pensava também em uma termelétrica para aproveitar o gás natural do pré-sal e uma vila para 50 000 empregados, com áreas de proteção ambiental, expansão agrícola, zonas de implantação de empreendimentos comerciais e de serviços. Apresentações de PowerPoint da empreitada foram feitas à imprensa e a financistas.

Como se sabe, o esfarelamento de seu império, fruto de apostas erradas em campos petrolíferos na Bacia de Campos, acabou com o sonho. Mas não com o porto. A EIG, empresa americana do ramo de óleo e gás, investiu 1,1 bilhão de reais para assumir o empreendimento no município de São João da Barra no fim de 2013, reformulou o projeto e pôs o terminal em operação. Em 2018, já movimentou 655 000 toneladas de cargas, e somente nos dois primeiros meses de 2019 foram mais 170 000 toneladas. “Isso é apenas o começo. Já temos licença para operar veículos, estamos desenvolvendo a infraestrutura para movimentar contêineres e até 2021 teremos uma zona de processamento de exportações em atividade”, diz José Magela, CEO da Prumo Logística, braço brasileiro da EIG, a controladora do Porto do Açu.

FAÇA CHUVA OU SOL – Terminal coberto: carga e descarga, abastecimento e reparos acontecem ao mesmo tempo. Acima, Eike Batista mostra o início das obras, em 2009 (Marcos Michael/Marcelo Piu/Agência O Globo)

A razão do sucesso do porto, a despeito da grandiloquência de Eike Batista, é uma só: o petróleo. Graças à localização privilegiada, a 123 quilômetros dos poços na bacia de Campos (algo de que a Marinha americana nem desconfiava), o porto está assumindo o protagonismo na logística do setor que pertencia a Macaé e Vitória, distantes 191 e 340 quilômetros das plataformas em alto-­mar. No ano passado, 10% de todo o petróleo exportado pelo Brasil passou pelo Porto do Açu. Contratos recém-­assinados com a Petrobras e a Equinor farão esse número dobrar em 2019, chegando a 200 000 barris por dia. Hoje, as quatro maiores petroleiras em atividade no país — Shell, Galp, Equinor e Petrobras — estão ali. “Quando falamos da indústria do petróleo, qualquer economia de tempo é uma grande vantagem”, diz Paulino Nobrega, da Edison Chouest, empresa do ramo de transporte marítimo.

Desde 2016 no Açu, a Edison Chouest é uma das treze companhias já instaladas no local, onde administra a maior base de apoio logístico offshore do mundo. São nove vagas para atracação que funcionam 24 horas, sete dias por semana. Seguindo o modelo de estrutura usado pela empresa no Porto de Fourchon, nos Estados Unidos, os berços ficam dentro de um terminal coberto e equipado com esteiras rolantes suspensas que retiram as cargas pela parte traseira do navio. Esse arranjo, único no Brasil, permite que o abastecimento e eventuais reparos possam ser concluídos pela lateral das embarcações em paralelo à carga e descarga, o que gera um aumento de até 40% na produtividade. Até o fim do ano, mais seis berços da Edison Chouest entrarão em funcionamento no gigantesco complexo portuário.

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O espaço ali é tão grande que uma única foto não consegue capturar todo o porto. Com 130 quilômetros quadrados, 40 deles de reserva ambiental, a área do Açu é duas vezes a da Ilha de Manhattan, em Nova York. Quando ficar pronto, o cais terá 17 quilômetros — para efeito de comparação, Santos, o maior porto brasileiro, tem 16 quilômetros de cais e apenas 7,7 quilômetros quadrados para a instalação de empresas e terminais. Apesar de estar com apenas 40% da área de cais e 15% da área livre ocupadas, o empreendimento já consumiu 13,5 bilhões de reais em investimentos. Só a dragagem para aumentar a profundidade do terminal de petróleo para 25 metros sugou 400 milhões de reais, mas valeu a pena: o Açu é o único porto privado brasileiro que pode receber navios do tipo Very Large Crude Carrier, com capacidade de armazenamento de 2 milhões de barris. “Ele foi todo desenhado para proporcionar eficiência na veia. Não é um puxadinho como vemos em muitos portos do Brasil”, defende o criador Eike Batista.

A previsão é que a produção brasileira de petróleo cresça 70% nos próximos dez anos, o que vai atrair para o complexo mais empresas e novos negócios. Já está em andamento a construção do maior parque termelétrico da América Latina, com investimentos de 8,5 bilhões de reais na instalação de um terminal de regaseificação e duas térmicas a gás. Juntas, elas vão gerar energia suficiente para abastecer 14 milhões de residências, ou atender a todo o consumo residencial dos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo. O próximo desafio é melhorar o acesso do porto ao restante do Brasil. “Viabilizar o escoamento do petróleo e do gás é essencial para o desenvolvimento econômico de todo o país”, diz Magela, da Prumo. “E aí o Cristo vai voar novamente.” A torcida é grande.

Publicado em VEJA de 3 de abril de 2019, edição nº 2628

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