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Fantasma da inflação assombra juros e vira problemão para Lula

Banco Central tem demonstrado preocupação com a inflação e sinaliza que caminho para não subir mais os juros é o novo governo ter 'responsabilidade fiscal'

Por Felipe Mendes Atualizado em 7 dez 2022, 17h22 - Publicado em 7 dez 2022, 11h47

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, tem reiterado em eventos nas últimas semanas que “é cedo para comemorar” uma melhora da inflação no país. A preocupação da autarquia monetária sinaliza que a manutenção ou a diminuição do atual patamar da taxa básica de juros (13,75% ao ano) depende de sinalizações do governo eleito em relação ao tamanho do “estouro” no teto de gastos. “A gente vê as expectativas na parte longa começando a desancorar, o que contamina o curto prazo. É importante ver o que vai sair (da PEC da Transição), o que isso significa em termos de trajetória da dívida, e obviamente a reação a isso faz parte da função do Banco Central”, afirmou Campos Neto, em evento organizado pela BlackRock.

Embora controlado, com um acumulado de 4,7% no ano até outubro, o indicador oficial da inflação do país apresenta algumas anomalias no espaço de 12 meses, o que mostra que esse “fantasma” ainda se faz muito presente no dia a dia da classe média brasileira. Uma das maiores preocupações, segundo André Braz, economista da Fundação Getulio Vargas (FGV), é o consumo da alimentação em domicílio, que acumula um avanço de 11,78% no período. “A alimentação, como é a despesa que mais pesa no orçamento das famílias de baixa renda, que são a maioria aqui no Brasil, está com uma variação média muito acima do IPCA. Isso mostra uma persistência inflacionária em cima daqueles que são mais vulneráveis”, afirma.

Dentro do quesito alimentação, há uma série de produtos fundamentais para a cesta básica do brasileiro que estão com números discrepantes no índice. É o caso, por exemplo, de frutas (22,4%), ovos de galinha (17,6%) e leites e derivados (28,4%). “Os pães, que são derivados do trigo, também sofrem os efeitos do conflito entre a Rússia e a Ucrânia, com alta de quase 20%. O óleo de soja e o açúcar, dois itens importantes, também têm pressões inflacionárias. Ou seja, faz sentido essa preocupação do Banco Central com os mais vulneráveis”.

Além da alimentação, Braz adiciona itens como roupas e medicamentos à cesta dos vilões da inflação brasileira. No segmento de vestuário, o avanço anualizado nos preços é de 15%, três vezes a inflação oficial. Os produtos farmacêuticos, por sua vez, acumulam alta de 13,3%. “A gente pode esses exemplos de descontrole no índice em bens duráveis, em mobiliários e eletrodomésticos, mas principalmente em vestuário, que acumula uma inflação muito alta”, afirma ele. “Alguns setores tiveram gargalos e acumularam custos altos na pandemia, tanto pela falta de mercadoria ou pelo aumento de preço da energia ou do petróleo, que é responsável por tecidos sintéticos, mas acho que ele já teve tempo para devolver isso, já que tanto os combustíveis como a energia ficaram mais baratos. É um setor que está realmente encontrando espaço para promover esses repasses.”

O economista destaca que um dos fatores que tem segurado o nível da inflação oficial em patamar razoável é a isenção de impostos promovida pelo governo de Jair Bolsonaro para subsidiar o combustível e a energia em 2022. Ele acredita que rever essas políticas no início do próximo governo pode acender um sinal de alerta em relação a um novo descontrole da inflação no país. “A gente viu um arrefecimento nas despesas de habitação e transporte devido muito à renúncia fiscal. Eu acho difícil que o novo governo mexa nessa questão do ICMS logo na entrada do ano, mas pode ser que aconteça devido a dificuldade que há em se encontrar uma solução para o problema fiscal do país”, ressalta. “Voltar com o ICMS da energia seria mais perverso, porque afeta o índice diretamente. A gasolina é um bem de luxo que só afeta mesmo a classe média alta.”

Ele acredita, por fim, que a autarquia monetária faz bem em não dar a inflação como vencida e iniciar um período de retração na taxa de juros do país. “O Banco Central tem razão em manter esse juro mais alto. Existe um perigo sobre os efeitos que as mudanças na política fiscal possam causar à inflação, o que pode tornar a política monetária ainda mais austera, comprometendo o crescimento e causando um efeito colateral que seria mais aumento de juros”, reitera Braz. O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC se reúne nesta quarta-feira, 7, e deve optar pela manutenção do atual patamar dos juros no país.

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