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As famílias do futuro

Cerimônias acadêmicas tendem a ignorar um elemento fundamental para o sucesso e a felicidade: o papel da família

Por Anne-Marie Slaughter
8 jun 2014, 19h36

Este é um período em que ocorrem cerimônias de formatura em muitos países, um momento em que uma geração de jovens brilhantes e afortunados colocará seus capelos e becas, receberão seus diplomas e ouvirão os conselhos dos mais velhos. Os discursos de graduação de alguns oradores destacarão as realizações dos formandos; outros enfatizarão os desafios que as futuras carreiras apresentarão. Mas essas cerimônias acadêmicas tendem a ignorar um elemento fundamental para o sucesso e a felicidade: a família.

Na verdade, as famílias desses alunos (ou seja, aqueles que deram amor e apoio, independentemente da ligação biológica) são tão protagonistas como os próprios formandos. Cada um a sua maneira, todos alcançaram o mesmo resultado: ver os seus filhos atingir um nível de educação pode ser um sonho inatingível para muitas pessoas.

Mas, além de reconhecer e agradecer o que as suas famílias fizeram por eles, os graduados também devem perguntar-se que tipo de família eles desejam constituir. E ao fazê-lo, eles terão de refletir a respeito das relações e papéis de gênero.

Dada a enorme diferença de expectativas entre homens e mulheres (algo que, é claro, depende do contexto cultural), as perguntas a serem feitas variam consideravelmente. Mas há uma pergunta, levantada anteriormente às mulheres – de como conciliar a vida profissional e a vida familiar -, que surge hoje de maneira igualmente intensa para os homens.

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A identidade masculina tradicional enquanto “provedor” da família levou muitas vezes os homens a priorizarem o trabalho ao invés de passarem mais tempo em casa. Na verdade, refletindo sobre suas infâncias, muitos graduados talvez possam lamentar o pouco que conviveram com seus pais e o pouco que tiveram seus pais envolvidos em sua educação.

É necessário que os homens encontrem a forma de desenvolver o lado afetuoso de sua personalidade, e não apenas o lado competitivo, o que lhes permitirá progredir em suas carreiras. Deveriam também aprender a amar para responder plenamente, não só como pai, mas também como marido, filho, irmão, tio e até mesmo como amigo. Para isso, deveriam perguntar a seus pais e avós o que eles teriam feito de maneira diferente e em seguida tirar suas conclusões.

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Em vez de esperar que apareçam os desafios, os jovens devem começar a estabelecer, assim que possível, as suas prioridades futuras. Como poderão garantir uma relação igualitária com a sua futura parceira? Que ajustes poderão fazer para permitir que as suas parceiras cumpram as aspirações pessoais da carreira? Eles estariam dispostos a mudar de cidade, caso sua parceira precise, por razões profissionais? Estariam dispostos a parar de trabalhar ou reduzir a carga horária para cuidar de uma criança ou da parceira?

Por meio dessa reflexão, os homens não devem perder de vista que a adoção de outra mentalidade não necessariamente implicaria no abandono do papel de provedores. Afinal de contas, dar carinho e atenção às crianças é tão importante quanto garantir o sustento familiar. A recompensa é especialmente a estreita relação que as crianças normalmente têm com a mãe.

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Também as mulheres devem pensar cuidadosamente sobre o futuro que lhes seria certamente mais gratificante. Para muitas delas, o desafio está em abandonar a ideia de que na busca por um equilíbrio entre a vida profissional e vida familiar elas tenham sempre que optar pela família e sacrificar suas carreiras. Claro que para muitas mulheres (assim como para muitos homens), a opção escolhida é priorizar a família. A liberdade de escolha é importante: escolher a quantidade de energia que pretende dedicar ao lar, escolher uma carreira guiando-se pela paixão, e a escolha de um parceiro que seja genuinamente semelhante.

Contudo, para que ambos possam sustentar uma relação de igualdade entre homem e mulher como provedores e chefes de família, deverá haver compromisso de ambos os lados. Uma mulher com grandes ambições profissionais necessitará encontrar um companheiro disposto a trabalhar menos ou inclusive parar de trabalhar para apoiá-la, algo que todo homem deveria estar disposto a fazer.

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Mas a luta contra os estereótipos é uma faca de dois gumes. De fato, para que a essa dinâmica funcione, a mulher também deve reavaliar o que ela espera de seu cônjuge. A mulher que pretenda criar uma família com um homem não deve permitir ser afetada pelos clichês tradicionais de masculinidade. Por exemplo: se a mulher sente-se desconfortável em ganhar mais que o marido, estará limitando a ambos.

Simplificando: o tipo de ajuda que os seus pais e avós provavelmente ofereceram às suas mães e às avós não é o único tipo de ajuda que uma mulher pode ou deve esperar de seu companheiro. O papel da mulher não deve se prender às regras ultrapassadas, mas às suas virtudes e ambições individuais. E o seu parceiro deve ter a segurança e a capacidade para incentivá-la a explorar todo seu potencial.

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Finalmente, a cerimônia de formatura não significa que o trabalho da família tenha terminado. Os pais e avós devem continuar a desempenhar um papel crítico de continuar a reformular expectativas – ou, pelo menos, apoiar as escolhas de seus filhos e netos. Isso implica em aceitar a decisão de um filho ou neto em não querer utilizar o diploma universitário que tanto custou conseguir para se tornar o principal provedor de sua futura família. E também implica compreender que a filha ou neta possa não precisar de um ‘provedor’ no sentido tradicional, mas sim um parceiro disposto a fazer sacrifícios em sua carreira para ajudá-la a seguir em frente.

O dia da formatura é o marco de um fim e de um começo. É um dia para os jovens graduados pensarem em todos os sacrifícios que suas famílias fizeram por eles e considerarem o tipo de sacrifícios que eles farão por suas próprias famílias. E é um dia para reconhecer que, se a família vem em primeiro lugar, o trabalho não vem necessariamente em segundo: pelo contrário, a vida vem junto.

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Anne-Marie Slaughter, presidente da New America Foundation, é autora de The Idea That Is America: Keeping Faith with Our Values in a Dangerous World (A ideia que é a América: manter a fé em nossos valores em um um mundo perigoso)

(Tradução: Roseli Honório)

© Project Syndicate 2014

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