Galípolo: ‘O mercado perdeu as esperanças em uma potencial terceira via’
Ex-CEO do Banco Fator, Gabriel Galípolo acredita que o mercado financeiro tem se empenhado mais no entendimento de um eventual terceiro governo de Lula
CEO do Banco Fator entre 2017 e 2021, o mestre em economia política Gabriel Galípolo tem se destacado por promover um debate em alto nível sobre os impasses do capitalismo e da sociedade no mundo contemporâneo. Coautor de Manda quem pode, obedece quem tem prejuízo; A escassez na abundância capitalista e Dinheiro: o poder da abstração real, três estudos escritos em parceria com o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, Galípolo acredita que os representantes do mercado financeiro estão perdendo a resistência em relação a uma eventual vitória de Lula nas eleições deste ano. “O meu sentimento é de que o mercado migrou de uma aposta em uma potencial terceira via para uma ansiedade de tentar entender o que seria, do ponto de vista econômico, um eventual terceiro governo do Lula”, diz.
O economista diz que muito da “ansiedade” do mercado financeiro vem de uma impressão de que a terceira via não irá decolar. “Hoje, eu acho que existe uma certa precificação, para usar um jargão do mercado, de que a terceira via é pouco viável. Então, o mercado sofre com a ansiedade de querer que os candidatos, especialmente o Lula, explicitem seus programas econômicos, os interlocutores envolvidos, para identificar eventuais riscos em cima disso”, afirma. “Mas, na minha visão, não existem elementos para o mercado temer o Lula. Sua passagem enquanto presidente, inclusive, foi altamente exitosa para o mercado financeiro.”
Ele acredita que o próximo presidente terá o desafio de promover crescimento econômico por meio de parcerias público-privadas e se diz favorável ao aperfeiçoamento da reforma trabalhista e da discussão sobre a reforma tributária. “Há uma mudança cultural em curso, que passa por discutir desde o vínculo de um motorista com a Uber, como o entregador de um aplicativo de comida, ao agente autônomo do mercado financeiro. É uma relação mais complexa do que simplesmente estabelecer um vínculo empregatício a partir dos moldes da antiga legislação”, afirma. “A proposta de uma nova visita à questão da reforma trabalhista não significa desfazer com tudo que foi feito, que me parece ser o maior receio do mercado, mas sim olhar para frente.”
Ele também defende que haja uma abertura à discussão sobre o teto de gastos. O atual ministro da Economia, Paulo Guedes, por exemplo, já reclamou publicamente que gastos com saúde e educação façam parte do dispositivo. “O teto, como é hoje, claramente apresentou problemas por não se fazer uma diferenciação qualitativa das despesas do governo, colocando todas as despesas sob uma mesma régua”, diz Galípolo. “Vários custos que têm um crescimento orgânico, com reajustes muitas vezes acima da inflação, foram crescendo e expulsando das despesas o que nós chamamos de recursos discricionários, que muitas vezes são os mais essenciais. O teto transformou essas despesas nas únicas possíveis de serem cortadas. O investimento que há hoje em infraestrutura, por exemplo, não cobre nem a depreciação.”
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