Muito se escreveu sobre efeitos e expectativas de prosperidade com as descobertas de recursos naturais, sobretudo de petróleo. Na maioria dos casos, ao contrário do que diz o senso comum, elas provocam menor crescimento e geram problemas sociais. É o que se chama de “maldição dos recursos naturais” ou também “maldição do petróleo”.
O FMI estudou o fenômeno em 2017 (análise disponível no site da instituição). Citou como exemplo o que ocorreu em Gana, alvo de uma onda de otimismo ao tornar-se, em 2009, o primeiro país africano visitado pelo presidente americano Barack Obama. A economia crescera em média 7% ao ano entre 2003 e 2013.
Grandes reservas de petróleo e gás foram encontradas entre 2007 e 2010. O presidente da República, John Kufuor, vibrou: “Se já vamos bem sem petróleo, com ele vamos voar”. A bonança deu origem a imprudência, excesso de gastos e, por fim, dívida. Gana não voou. O crescimento, ao invés de se intensificar, caiu para menos de 4% entre 2014 e 2016.
O Brasil viveu situação semelhante com as descobertas do “ouro negro” na plataforma de Campos e depois no pré-sal. Municípios fluminenses desperdiçaram royalties. O pré-sal deu origem a más políticas econômicas, que interromperam a agenda de modernização e reformas do governo FHC, mantida nos três primeiros anos do período Lula.
Ao contrário do que diz o senso comum, a descoberta do “ouro negro” pode provocar crescimento baixo e problemas sociais
O cientista político Marcus Melo mostrou que tal interrupção começou com a interpretação dada por Lula à crise financeira mundial de 2008, entendendo-a, num keynesianismo equivocado, como senha para ampliar gastos. No mesmo ano, a Petrobras fez a primeira extração do pré-sal. Entusiasmado, o governo embarcou em expansão fiscal e outras medidas para supostamente aquecer a economia. A fatídica Nova Matriz Econômica de Dilma Rousseff transferiu cerca de 500 bilhões de reais ao BNDES para distribuir subsídios e causou nossa maior recessão. De quebra, houve o esquema de corrupção organizada.
A maldição do petróleo costuma ocorrer em países onde as instituições são fracas, assim falhando em inibir ações irresponsáveis. A Venezuela, infeliz exemplo, desarranjou-se a partir de 1999 com Hugo Chávez e ultimamente com Nicolás Maduro. Já os países dotados de instituições fortes escapam da maldição, gerenciam bem a economia e transformam descobertas em bênçãos.
A Noruega, bom exemplo, utilizou o petróleo para construir uma forte indústria associada à sua exploração e produção, revertendo a bonança a um fundo soberano — o maior do mundo — em favor das gerações futuras. O governo gasta apenas os rendimentos das respectivas aplicações. Seus ativos superam 1 trilhão de dólares.
No Brasil, uma diminuta parte dos recursos do pré-sal se destina a um fundo social. São elevadas as pressões para usá-los em mais gastos e transferências a estados e municípios — o que ocorreu com o recente leilão da cessão onerosa. Felizmente, nossas instituições, incluída a imprensa, são sólidas e podem limitar experiências ruins e, quem sabe, tornar nosso petróleo uma bênção.
Publicado em VEJA de 13 de novembro de 2019, edição nº 2660
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