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De olho nos tributos

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Dados e análises sobre os impostos e seu efeito na economia
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O que é certo: tributar ganho ou tributar perda?

Desoneração da folha: o melhor caminho não é buscar arrecadação a qualquer custo, e sim dentro dos limites constitucionais

Por Adolpho Bergamini *
Atualizado em 9 Maio 2024, 18h30 - Publicado em 14 dez 2023, 18h25

O debate em torno da contribuição previdenciária tem tomado os noticiários nos últimos dias. Mas o tema não é novo. Em 2011, diversos setores da economia tiveram a possibilidade de substituir a contribuição de 20% incidente sobre a folha de salários pela Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta – CPRB. Em suma, os contribuintes foram autorizados a apurar a contribuição previdenciária pela aplicação de um percentual sobre sua receita bruta auferida, não mais pelas despesas incorridas com os salários pagos. Desde então, o novo regime passou a ser chamado de “desoneração da folha de pagamento”.

Embora fosse temporária em sua origem, a CPRB entrou na rotina dos contribuintes e em seus planejamentos de caixa em função do longo período de vigência – quase 13 anos – levado a cabo mediante sucessivas prorrogações. Passou por três governos. Foi inaugurada no início do governo Dilma, continuou na gestão Temer e permaneceu intacta no governo Bolsonaro. Mas, assim que ficou claro que Lula venceria as eleições, as primeiras notícias sobre sua revisão começaram a surgir. Ficaram ainda mais latentes nas entrevistas concedidas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, até que as intenções se concretizaram no veto integral ao Projeto de Lei 334/2023, que tinha como objetivo prorrogar mais uma vez a desoneração da folha de salários. As justificativas dadas pelo ministro passam, sempre, pela necessidade de aumento da arrecadação para cobrir as despesas da União. O Congresso derrubou o veto do governo nesta quinta-feira, e com isso a desoneração está mantida. 

A pobreza da qualidade do debate logo chama a atenção.

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O advogado e professor Adolpho Bergamini: busca pela arrecadação há de respeitar limites previstos na Constituição (./Divulgação)

Não há dúvidas de que o Estado, como entidade política, deve arrecadar recursos para fazer frente às suas despesas. Afinal, nossos direitos têm custos. Essa afirmação é tomada como premissa por Stephen Holmes e Cass R. Sunstein em “O custo dos direitos; por que a liberdade depende dos impostos” (tradução de Marcelo Brandão Cipolla. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2019). De acordo com o pensamento desenvolvido pelos autores, os direitos individuais, o direito de propriedade, a liberdade de ir e vir, a liberdade de contratar, o direito de transmitir bens por herança, o direito à saúde, os direitos sociais, entre outros, dependem da máquina pública.

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Sem um Judiciário com poder de coerção, sem cartórios, sem força policial, sem um aparato jurídico e burocrático para garantir a efetividade dos direitos escritos na Constituição Federal e nas leis, a sociedade voltaria ao estado de natureza, em que as pessoas deveriam garantir, elas próprias, a defesa de seus interesses. Sem tributos a garantir direitos, ruiria a ideia de uma sociedade formada por indivíduos que aceitam perder parte das suas liberdades e direitos em prol de certas seguranças. O “Contrato Social” de Rousseau não passaria de um sonho.

Mas, a busca pela arrecadação há de respeitar certos pressupostos, certos limites previstos na Constituição. Entre essas balizas está o princípio da capacidade contributiva.

De acordo com ele, os tributos devem ser cobrados segundo a capacidade econômica dos contribuintes. Se a relação jurídico-tributária implica a obrigação de o contribuinte entregar parcela de suas riquezas ao Estado, então parece óbvio que essa obrigação somente será pertinente se, e somente se, o contribuinte tiver auferido riquezas. 

Ocorre que a contribuição previdenciária sobre folha não incide sobre uma riqueza, mas, sim, sobre uma despesa. Embora possa não ser politicamente correto dizer que os salários pagos a funcionários constituem despesas do contribuinte, fato é que esses valores estão, sempre, no grupo de rubricas que reduzem os lucros da empresa. E, justamente por isso, a contribuição acaba por majorar o custo dos rendimentos pagos ao trabalhador que, ao seu turno, acaba ganhando menos do que poderia

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Por essa razão, mais do que debater sobre os gastos públicos, as melhores reflexões passam, antes, pela legitimidade da própria contribuição. 

Seguindo-se a linha da capacidade contributiva, não é a CPRB que deve ser extinta, mas, sim, a contribuição sobre folha. É mais legítimo tributar uma receita auferida do que uma despesa incorrida. É mais justo tributar os recursos que entram no caixa do que os que saem. É mais eficiente, para a economia, solicitar que contribuinte contribua ao Erário com o que ele ganha ao invés de pagar sobre o que ele perde.

O melhor caminho não é buscar arrecadação a qualquer custo, e sim dentro dos limites constitucionais. Talvez, economizar e enxugar um pouco o orçamento seja melhor do que extorquir contribuintes.

* Adolpho Bergamini é advogado, professor e autor de diversos livros e textos de direito tributário. Ex-conselheiro do Carf. Juiz do TIT/SP há 14 anos. 

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