Vaticano chama a atenção para aspectos éticos do sistema financeiro
Uma Economia a serviço da vida humana
Dado ao conhecimento público em coletiva de imprensa no dia 17 de maio passado, o documento do Vaticano Oeconomicae et pecuniariae quaestiones. Considerações para um discernimento ético sobre alguns aspectos do atual sistema econômico-financeiro está chamando a atenção de leigos, principalmente de economistas – católicos e ateus – dedicados a acompanhar os movimentos do sistema financeiro.
O documento parte da proposta geral da Igreja Católica de um mundo ideal baseado numa “civilização do amor” e se propõe a recordar princípios éticos que devem, segundo o Vaticano, nortear todo o agir humano. De acordo com o escrito, apresentado pela Congregação para a Doutrina da Fé e pelo Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, as recentes crises no sistema financeiro deveriam ter sido aproveitadas como oportunidades para o desenvolvimento de uma economia “mais atenta aos princípios éticos”, valorizando o serviço da atividade financeira à economia real e neutralizando seus “aspectos predatórios e especulativos”.
O texto do Vaticano apresenta algumas considerações de fundo a respeito dos mercados e do bem-estar social, para depois tratar mais especificamente do contexto atual. Entre os pontos levantados, destacam-se a crítica ao Produto Interno Bruto-PIB como único critério de bem-estar da sociedade (n. 11); a inversão da ordem natural das coisas, com o dinheiro transformando-se em fim último, sendo o trabalho e a vida humana apenas um meio (n. 15); e a intenção especulativa que deteriora valores de convivência, solidariedade e responsabilidade pelo bem comum (n. 17).
Em seminário recente, “Finanças Públicas Brasileiras e a Idolatria ao Dinheiro”, realizado no Centro Cultural de Brasília e organizado pelo Observatório Nacional de Justiça Socioambiental Luciano Mendes de Almeida, os economistas Guilherme Costa Delgado e José Celso Cardoso Junior discutiram justamente sobre o erro que é confiar na autossuficiência dos mercados desregulados. Neste sentido, foi fortemente ressaltada a necessidade de regular o mundo econômico-financeiro e submetê-lo ao controle cidadão. Uma frase do Papa Francisco foi lembrada: “Não a uma economia da exclusão e da iniquidade. Essa economia mata”.
Sem dúvida! Mas, como lembrou o economista português João César das Neves, em entrevista recente, há riscos na “interpretação mundana de sentenças espirituais” do Papa. Tomar os escritos e ditos de Francisco ou do Vaticano como respostas científico-profissionais ou posições ideológicas e políticas sobre questões conjunturais de cada país pode levar a erros também fatais na condução socioeconômica, tanto pelo setor público, como por agentes privados. “¡Despacito por las piedras!”, diriam alguns…
Sandra Paulsen, casada, mãe de dois filhos, baiana de Itabuna, economista e doutora em Economia Ambiental. Sempre curiosa, atualmente estuda Teologia.