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Só é possível ‘minimizar’ surto de cólera, diz brasileira

De Porto Príncipe, a médica Taís Rodrigues Lara descreve situação do país e diz que precariedade e falta de informação dificultam combate à doença

Por Natalia Cuminale Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 24 Maio 2016, 16h37 - Publicado em 17 nov 2010, 18h36

Depois de passar por uma guerra civil e um terremoto que quase destruiu o país, os haitianos enfrentam a cólera. Um surto já matou mais de mil pessoas e deixou cerca de 17.000 hospitalizadas em três semanas. Em uma nação em que mais da metade da população sobrevive com pouco mais de um dólar ao dia e que carece de saneamento básico, a única saída é “minimizar” a disseminação da doença. É com esse objetivo que a médica intensivista Tais Rodrigues Lara, do Hospital Albert Einstein, de São Paulo, está em Porto Príncipe, capital do Haiti, desde o último dia 10, a convite do Minitério da Saúde brasileiro. Ao lado de uma enfermeira e de uma fisioterapeuta, ela capacitará, durante dez dias, profissionais de saúde locais no atendimento a pacientes e fornecerá informações para o enfretamento da cólera, como a produção caseira do álcool gel e a distribuição de 100.000 cópias de um jornal, escrito no idioma local, o creole, com orientações sobre higiene. Causada por uma bactéria e transmitida principalmente pela ingestão de água ou alimentos contaminados, a cólera é uma infecção intestinal. Seus sintomas mais comuns são diarreia e vômito, que levam à desidratação e até à morte. Confira a seguir a entrevista que a médica brasileira concedeu ao site de VEJA por telefone a partir de Porto Príncipe.

Qual o objetivo da missão?

Queremos melhorar a educação dos haitianos para que isso impacte na prevenção da cólera. Estamos fazendo reuniões com os líderes das comunidades, para que eles orientem melhor a população. Reconheço que o mais difícil é fazer com que eles tenham capacidade de colocar em prática o que ensinamos: hábitos simples, como lavar as mãos e beber água potável.

Por que isso é difícil?

Por que nem sempre eles têm acesso a água potável. A princípio, as organizações não-governamentais fornecem água tratada. O problema é como a população lida com essa água em casa. Como o volume de água tratada é limitada, eles acabam reutilizando, para lavar a mão e fazer comida, por exemplo.

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E o saneamento básico?

O Haiti não tem saneamento básico e, ao mesmo tempo, possui uma grande concentração populacional. Isso dificulta a higiene e a prevenção da cólera.

As consequências do terremoto continuam afetando a vida dos haitianos?

A minha impressão é que a vida deles mudou pouco desde o terremoto e que essa falta de saneamento era anterior a esse evento.

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Como os haitianos encaram a situação?

Parece que eles já estão acostumados a isso, estão desanimados. Eles não esperam que as coisas melhorem. Nos próximos dias, terão eleições e o voto não é obrigatório. Vi nos jornais locais que o número de pessoas que pretendem votar é muito baixo. O país precisa de uma mudança muito grande.

Esse desânimo dificulta sua missão no país?

Com certeza. Não sei se eles estão desanimados ou se isso já é natural para eles. É difícil entender. Mas dificulta, sim, até porque eles têm modos diferentes de higiene. Encontramos essa barreira quando tentamos passar informações. Quando falamos de algumas medidas educativas, eles entendem como se fosse uma opção de higiene, não uma obrigação.

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O que mais dificulta o trabalho?

O trânsito é caótico no país e tudo é muito difícil. Encontro dificuldades para chegar em um lugar e também para transportar os materiais de prevenção até os locais, como álcool gel e cloreto de sódio. Falta organização nesse sentido.

Com todas as dificuldades, qual a saída?

Nosso enfoque é minimizar a disseminação da cólera, construindo uma barreira de prevenção e evitando que pessoas adoentadas contaminem outras. É preciso pensar quantos casos a mais teríamos se não fossem adotadas essas medidas de prevenção.

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O que recomendar para quem já está contaminado?

A instrução é que eles procurem uma unidade médica o mais rápido possível se tiverem um quadro grave de diarreia. Sabemos que é difícil que eles procurem uma equipe médica em tempo hábil, por conta do trânsito caótico. Além da educação, o que podemos fazer é distribuir cloreto de sódio para purificar a água e ensinar a fazer o álcool gel.

Qual a função do álcool gel?

O álcool gel pode servir como alternativa para a limpeza das mãos. Assim, sobra mais a água tratada só para cozinhar e para as necessidades básicas. Como a água é limitada, eles armazenam em baldes e galões. Muitas vezes, essa água é contaminada.

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Há alguma outra forma de evitar mais mortes?

Nas condições atuais, prevenção e educação. O que temos a fazer é realmente começar do zero, pela educação e conscientização das pessoas. O surto ocorreu por conta de algumas semanas de chuva. Com o lixo pelas ruas e a falta de saneamento, isso pode acontecer de novo no próximo ano. Educação é o primeiro passo para conter e prevenir o surto de cólera.

A senhora confirma o número de 1.110 mortos?

Infelizmente não sei dizer. Temos acesso limitado à internet aqui e é muito difícil conseguir alguma informação oficial. Acredito que você, no Brasil, tem mais informações do que nós que estamos aqui.

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