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“É preciso reformar as leis para proteger os acionistas minoritários”

A advogada brasileira Érica Gorga, que atua como perita na ação coletiva movida nos Estados Unidos por quem busca indenização por prejuízos com a Petrobras, diz que a ideia de que a estatal brasileira é apenas vítima de um processo de corrupção é mito, e que o Brasil precisa melhorar suas formas de proteção ao investidor minoritário

Por Marcelo Sakate Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 26 jun 2015, 21h06

Se o desfecho dos julgamentos do Grupo EBX, de Eike Batista, e da Petrobras consolidar a visão corrente de impunidade das fraudes que causaram perdas a milhares de investidores, o mercado de capitais brasileiro será o principal prejudicado. A avaliação é da advogada Érica Gorga, pesquisadora na Escola de Direito de Yale e professora da FGV-SP, que atua como perita no processo coletivo nos EUA em que investidores buscam indenização pelo prejuízo com a Petrobras. Em entrevista a VEJA, Érica defende a ideia de que as leis brasileiras sejam reformuladas para proteger os acionistas minoritários.

Gestão omissa

A estatal é processada por fraude a investidores com base nas leis americana e brasileira. Só entre 2012 e 2014, a Petrobras levantou 26,5 bilhões de dólares de investidores internacionais. Por lei, a empresa tem obrigação de fornecer demonstrações contábeis completas e verídicas de sua real condição financeira. É processada por emitir declarações inverídicas e dar informações falsas, isto é, mentir, omitir e enganar investidores e induzi-los a erro de avaliação sobre o investimento.

Repercussões

Os investidores brasileiros que compraram títulos da companhia nos Estados Unidos também têm direito a ser ressarcidos dos prejuízos sofridos. É a alegação que defendo na ação na corte federal em Nova York. O processo é coletivo, ou seja, beneficia a todos os investidores na mesma situação. Se o juiz decidir que a ação tem de prosseguir, haverá grande impacto: mostrará que as normas brasileiras de proteção a investidores não cumpridas no Brasil serão aplicadas nos Estados Unidos.

Eike e Petrobras

Até hoje, a lição deixada pelos casos do Grupo EBX, de Eike Batista, e da Petrobras é que cometer ilícitos contra investidores compensa – e muito. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) aplicou multas no total de 1,4 milhão de reais a Eike, valor irrisório quando considerados os prejuízos causados a investidores – que ainda não foram indenizados. Nesse caso há uma ação civil pública em estágio inicial. Se o resultado final consolidar a visão corrente de impunidade de fraudes a investidores e crimes financeiros, o mercado de capitais brasileiro como um todo tenderá a minguar ainda mais. As empresas sofrerão descontos nos preços de seus papéis devido à desconfiança do mercado internacional.

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Amarras da lei

Para que houvesse um processo coletivo para a indenização dos investidores no Brasil no caso da Petrobras, o Ministério Público teria de ingressar com uma ação civil pública. Mas não o fez, porque tem focado somente a esfera criminal. No Brasil, existem apenas ações individuais esparsas de pequenos investidores. Com as leis atuais, minoritários quase nunca são indenizados.

Maior rigor

É preciso reformar as leis. Deve-se permitir que acionistas com menor propriedade acionária ingressem com ações de responsabilidade civil contra administradores em benefício da companhia, como ocorre em países da Europa, e reformar a lei da ação civil pública, para que outras partes privadas ingressem com processos coletivos, como ocorre nos EUA. Precisamos reformar a lei de mercado de capitais para estabelecer multas mais altas e parâmetros mais claros para a responsabilização de bancos de investimento, auditores e advogados – todos os que têm obrigação legal de monitorar as empresas.

Inversão de papéis

Propagou-se o mito de que a Petrobras é vítima. Uma companhia que captou bilhões de dólares e de reais dos investidores não pode dissipar tais recursos sem assumir sua responsabilidade. A lei impõe obrigações às companhias que captam poupança popular. A vitimização diminui a possibilidade de responsabilizar os administradores perpetradores de ilícitos. Além disso, afugenta investidores, que são as vítimas reais, pois uma companhia não é gerida para remunerar a si mesma. Ninguém quer investir em companhias que não são responsabilizadas pelo uso do dinheiro dos seus acionistas. É inconcebível que pessoas honestas trabalhem a vida inteira para ter a aposentadoria dissipada em corrupção.

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Exemplo americano

A Enron foi processada por um grande esquema de fraude e ressarciu mais de 7 bilhões de dólares a investidores; seu ex-presidente foi condenado a 24 anos de prisão. O argumento de que a companhia que capta dinheiro do público e comete fraudes é “vítima coitadinha”, não responsável por suas ações, não prospera nos Estados Unidos. Os americanos sabem que, se não houver proteção dos direitos dos investidores, a economia não crescerá, porque não haverá investimentos.

Direito ameaçado

O governo brasileiro rapidamente aprovou a Lei de Arbitragem, que é utilizada como argumento para afastar a jurisdição americana e levar o processo da Petrobras para a câmara de arbitragem sigilosa da BM&FBovespa. O mesmo governo que não quer privatizar a empresa quer impor a privatização das disputas da companhia com investidores e barrar o acesso ao Judiciário, o que é inconstitucional. A escolha entre Judiciário e arbitragem privada para resolver disputas deve ser do investidor. A arbitragem é muito mais cara e não é viável para a maioria dos investidores minoritários. Além disso, no Judiciário o processo é público, enquanto na arbitragem é secreto.

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