Demanda forte e possível queda do real colocam em risco preço dos alimentos
Preocupação já tem levado o governo a estudar manobras para garantir a meta
O aumento da inflação dos alimentos tem gerado tanto desconforto para o governo, produtores, distribuidores e consumidores, que o ministro Guido Mantega chegou a afirmar que poderá criar um novo índice de inflação sem o item Alimentos e Bebidas. Na prévia do indicador de novembro, o item subiu 2,1% – mais que o dobro do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA – 15), que registrou alta de 0,86% no período. Independentemente da manobra que aconteça, as perspectivas para o aumento do preço de alimentos para 2011 são pessimistas. Isso acontece, segundo Robson Gonçalves, professor de Macroeconomia da FGV, por três motivos: o crescente aumento da demanda no Brasil, a possível desvalorização do real e o aumento da demanda internacional.
O consumo dos brasileiros tem sido puxado pela grande oferta de crédito. Preocupado com esta pressão, o governo anunciou, na semana passada, uma série de medidas para conter a oferta de recursos. O problema é que, para o consumo de alimentos, estas são medidas de baixo impacto. Grande parte da demanda pelos produtos é paga à vista. Além disso, a economia brasileira tem reduzido seus índices de desemprego, o que significa que a renda do trabalhador segue em alta. O resultado é que o consumo interno deve continuar subindo.
Já a possível desvalorização do real deve ter forte impacto sobre o preço dos alimentos. Se ela acontecer, como anseiam os exportadores e o governo, a comida consumida pelos brasileiros deverá ficar ainda mais cara – sobretudo devido aos itens provenientes do trigo, como o pão francês e as massas, pois grande parte do produto utilizado no mercado brasileiro é importado. “Em 2011, vamos pagar um preço muito caro pela valorização excessiva do real ocorrida este ano”, afirma Gonçalves.
No caso da demanda internacional, o risco vem pelo aumento de preço das commodities agrícolas. Como o preço destes produtos é definido no mercado internacional, o Brasil acaba incorporando a alta dos preços em seus produtos, mesmo que eles sejam produzidos internamente. Este também é um fator com forte componente especulativo que acarreta em aumento de preços. Isso porque alguns investidores usam o mercado de commodities como investimento, principalmente quando os juros estão em queda. Recentemente, entre 2007 e 2008, a economia mundial já passou por esta situação. Caso tal movimento se repita, mesmo que em menor proporção, puxado pela leve recuperação das economias dos Estados Unidos e Europa, haverá um outro fator – além do câmbio e da demanda brasileira – a fazer com que a cesta do brasileiro se encareça ainda mais.
“Não há como negar que o mundo está em recuperação. E a demanda pode ser comparada, moderadamente, com a que tivemos entre 2007 e 2008”, afirma Fábio Romão, economista da LCA Consultores. Tendo em vista um cenário tão pouco animador, resta esperar para saber se, de fato, o real irá ceder e ocasionar essa alta inflacionária. Enquanto isso, os planos já anunciados do ministro Mantega de, no futuro, reduzir ainda mais a meta de inflação – que hoje é de 4,5% – parecem estar mais distantes.