Autoridades reúnem-se em Davos em busca de ‘soluções compartilhadas’
A necessidade de coordenar ações para resolver os problemas do mundo será o tema da reunião; interesses nacionais ainda são o grande obstáculo
O luxuoso resort de Davos-Klosters, na Suíça, abriga a partir de hoje até domingo mais um Fórum Econômico Mundial (World Economic Fórum-WEF). Com a expectativa de receber 2 000 autoridades (o dobro de dez anos atrás), trata-se de um dos mais importantes eventos de economia do mundo. A 41ª edição do encontro, que traz o tema “Normas Compartilhadas para a Nova Realidade”, tem como desafio criar condições para que os países encontrem soluções para seus graves problemas comuns – o que implicaria rever políticas que, por enquanto, mostram-se benéficas a alguns interesses locais. Não será nada fácil.
Os países emergentes – sobretudo os latino-americanos, liderados pelo Brasil – prometem fazer barulho contra a guerra cambial – combinação da resistência histórica da China em aceitar uma valorização do yuan e a recente política do governo dos Estados Unidos de injetar dinheiro no mercado doméstico, intensificando o processo de depreciação do dólar. Com moedas desvalorizadas perante as divisas de outras nações (principalmente das emergentes que são exportadoras de commodities), as duas maiores e ultracompetitivas economias do planeta ganham força para continuar inundando os mercados com seus bens e serviços, a despeito do risco que oferecem às indústrias nacionais.
As autoridades da América Latina tentarão expor os riscos da manutenção desta política, não só mirando o prejuízo para suas indústrias, mas também como indutora de movimentos especulativos. O excesso de liquidez no mercado global, em busca de rendimento, tem aportado nos países emergentes e inflado os preços de ativos. Convencer líderes americanos e chineses não será fácil. Os EUA, com juros perto de zero, encontram-se com poucos instrumentos para fazer o PIB avançar. Os primeiros sinais de aquecimento começaram a surgir e, possivelmente, não será agora que a estratégia será abandonada. Já Pequim pode até aceitar no longo prazo, e de forma muito lenta, uma desvalorização. Logicamente, não o fará porque o mundo está pedindo: seus interesses internos falam mais alto.
Commodities – A valorização de ativos no mundo é particularmente preocupante entre as commodities agrícolas e de energia. As cotações destes produtos já estão acima dos picos registrados antes da crise, em 2008, e não dão sinais de acomodação. O primeiro alerta que este movimento desperta é o da formação de “bolhas” – grosso modo, a valorização desmedida e artificial dos preços. Ao que tudo indica, eles engataram um ritmo de alta que não se sustenta apenas pela leis de oferta e demanda, sendo inflados por pura especulação de investidores em busca de rentabilidade fácil. O segundo risco é a disseminação da inflação pelo mundo, que deixou de ser fenômeno de economias pujantes. Até mesmo a Europa, envolvida na crise de dívida soberana, vê o índice de preços ao consumidor superar a meta de 2%.
Os europeus, liderados pelo presidente francês, Nicolas Sarkozy, querem emplacar reformas duras nestes mercados. A discussão aportará em Davos, mas o grande debate vai se dar mesmo em Paris, em 18 e 19 de fevereiro, no encontro do G20 – o grupo das 19 maiores economias do planeta mais a União Européia. Sarkozy quer criar estoques para o regular os preços das commodities, impor limites à sua apreciação e ainda criar uma espécie de código de conduta sobre os fluxos de capital. Em Davos, tentará angariar apoio para sua proposta. Grandes exportadores destes bens, Brasil e EUA uniram-se para barrar essas intenções, ainda que aceitem negociar políticas para minimizar a especulação nos mercados.
Economias – Enquanto os preços sobem mundo afora, multiplicam-se as decisões de política monetária – elevações nos compulsório e nos juros principalmente, inclusive no Brasil – para aplacar o avanço da inflação. O problema mostra-se mais sério nos emergentes, cujo frenesi consumista é combustível para o descontrole dos preços. Pequim está especialmente preocupada com o fenômeno e vem tomando medidas – o que consegue fazer com muita rapidez e eficácia – para frear a atividade. Aí, o dito “pouso forçado” da economia chinesa (uma eventual desaceleração brusca decorrente de decisões de política econômica) desponta como um dos maiores medos. Afinal, o mundo acostumou-se a ver o país como um dos carros-chefe do crescimento global. Em Davos, todos tentarão acalmar as autoridades chinesas, aconselhando moderação.
Uma desaceleração da economia internacional – ainda distante, mas não impossível – poderia agravar os problemas da Europa. Diversos países da região, com destaque para os PIIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia e Espanha), precisam crescer a todo custo para ampliar a arrecadação e melhorar sua situação fiscal. A importância da economia global se agiganta num ambiente como esse, já que, nos mercados domésticos, o que se vê são políticas que têm efeito contracionista – tais como demissão de funcionários públicos, cortes de benefícios sociais, e despesas governamentais de forma geral. O risco de que a crise da Europa se prolongue por anos a fio traz novos riscos para a economia mundial e aprofunda as divisões dentro do próprio continente.
Enfim, os grandes temas a serem discutidos descortinam as mudanças por que passou o planeta nas últimas décadas, com a ascensão de novas potências, e que se aprofundaram após a crise financeira de 2008. Encontrar soluções para estes problemas passa por renovadas tentativas de diálogo e articulação, além da remodelagem dos organismos de representatividade dos países.
Nesta 41ª edição, estão confirmadas as presenças do presidente francês Nicolas Sarkozy, da chanceler alemã Angela Merkel, do primeiro-ministro britânico David Cameron, além de presidentes, ministros, dirigentes de bancos centrais de outros países desenvolvidos e também dos emergentes. A presidente Dilma Rousseff não comparecerá, mas será representada também pelos ‘recém-empossados’ Antônio Patriota, ministro de Relações Exteriores; e Alexandre Tombini, presidente do Banco Central. A delegação brasileira contará ainda com o presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho; o presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli; o presidente da Embraer, Frederico Curado.