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Mulheres no centro das atenções

Corrida presidencial tem duas candidatas. Em primeiro lugar nas pesquisas, Dilma Rousseff apostou no eleitorado feminino

Por Adriana Caitano e Marina Dias
29 ago 2010, 10h15

Fátima Pacheco, socióloga: “As mulheres não querem somente números e realizações. Elas querem a certeza de que haverá cumprimento do que é prometido, querem ser protagonistas e têm enxergado essa virtude em quem é como elas”

Como nenhuma outra, esta eleição joga luz sobre a presença feminina na corrida às urnas e sobre a influência do voto delas no resultado do pleito. O fato de haver duas mulheres na disputa pelo cargo mais alto do Executivo – Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV) – reforça essa ideia. Primeira colocada nas pesquisas, Dilma apostou todas as fichas no voto feminino. A estratégia deu certo e não foi montada à toa. As mulheres representam mais da metade (52%) do eleitorado brasileiro, de 135 milhões de pessoas. São 70 milhões de votos.

Mas será que o gênero pesa mais na hora da escolha delas? Ou, no caso de Dilma, a herança e a imagem de Lula predominam? VEJA.com consultou especialistas sobre a questão. Eles não são unânimes em garantir que as mulheres tendem a votar em outras simplesmente por serem mulheres. Porém, o crescimento da petista entre o público feminino indica que apostar em uma campanha direcionada a elas pode fazer a diferença.

No início do ano, José Serra (PSDB) tinha a história a seu favor. Desde a primeira candidatura, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sempre teve mais eleitores homens que mulheres. Elas costumavam ser maioria no voto aos tucanos. Em março, a diferença no voto feminino entre Dilma e Serra era de 16 pontos porcentuais a favor dele. Até aquele momento, a petista não era tão conhecida e tinha uma imagem sisuda e considerada séria demais para representar as mulheres. O PT entendeu o recado e mudou de estratégia.

Já na pré-campanha, Dilma adotou o ritual de abrir os discursos cumprimentando as mulheres presentes e fez mudanças radicais no visual. Trocou os óculos por lentes de contato, fez cirurgia plástica, arrumou os dentes, pintou os cabelos. Na última semana, a transformação chegou ao guarda-roupa. O renomado estilista Alexandre Herchcovitch foi contratado pelo marqueteiro João Santana para ser o consultor de moda da candidata.

A ofensiva petista para conquistar as mulheres não parou por aí. Integrantes da campanha e do governo passaram a chamá-la de “a primeira presidenta do Brasil” – assim mesmo, com “a”. O feminismo da palavra, apesar de incomum, não é errado e foi enfatizado estrategicamente pelos marqueteiros. “Não foi uma simples mudança gramatical e de imagem, eles perceberam que havia esse vácuo na representação feminina na política e apostaram nisso”, analisa a socióloga do Instituto Patrícia Galvão, Fátima Pacheco Jordão.

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Estratégia – O resultado da tática petista é visto com clareza na pesquisa Datafolha de 20 de agosto, ao fim da primeira semana de propaganda eleitoral na TV. O programa de Dilma apelou para o lado emocional da história da candidata, com destaque explícito para seu papel de mãe. “Essa questão da família tem um peso muito grande, é uma instituição muito forte no mundo ocidental”, argumenta Rui Tavares Maluf, cientista político da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo.

Até a polêmica passagem de Dilma pela guerrilha na época do regime militar foi usada em benefício de sua imagem. “Com depoimentos de amigas dela, a guerrilheira virou guerreira. Conseguiram transformar o fator negativo da luta armada em fator positivo”, comenta Fernanda Feitosa, cientista política e consultora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea). “É uma estratégia de cálculo muito sutil e inteligente que está conduzindo a essa perspectiva de vitória”. De acordo com o Datafolha de 25 de agosto, Dilma passou a ter 15 pontos porcentuais a mais que Serra entre as mulheres.

Análise – Uma das explicações dos especialistas para a mudança repentina nas intenções de voto baseia-se também nos números: as mulheres demoram mais a decidir o voto. O último Datafolha aponta que 10% delas ainda não sabem em quem votar, enquanto 5% dos homens não tomaram a decisão. “Boa parte das mulheres espera os programas eleitorais na TV, porque é nessa etapa que as campanhas passam a tratar de temas cotidianos e trazem características pessoais dos candidatos”, explica Fátima Pacheco. “É também o meio de informação mais acessível para as mulheres que têm jornada dupla e não têm como ler jornais e se ligarem em bastidores políticos”, completa Fernanda Feitosa.

Todos os especialistas ouvidos por VEJA.com concordam que o principal motivo da reviravolta de Dilma nas pesquisas foi ter ficado claro que ela é a candidata de Lula. “A imagem do Lula representa um governo bem avaliado, que trouxe um maior poder de compra. Quem não sabia quem ela era ainda agora percebeu”, resume o cientista político, autor do livro “A Cabeça do Eleitor”, Alberto Carlos de Almeida.

No entanto, eles divergem em um ponto: a questão de gênero determina ou não o voto entre as mulheres? Almeida limita-se a ressaltar que Dilma ainda tem preferência maior do voto masculino que do feminino. “A proporção continua na mesma situação de antes, os números gerais é que cresceram”, destaca.

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Maluf, por sua vez, acredita que as barreiras negativas que impediam a candidata petista de ter uma boa imagem foram derrubadas, entre elas o visual e o tom de voz. “Mas isso em particular não ganha eleição, deve haver uma mensagem mais clara. A mulher é tão heterogênea enquanto categoria como o próprio homem, existe o peso geográfico, o grau de politização, o grupo social do qual faz parte, a renda e a escolaridade”, elucida o cientista.

Diferenças – Já a socióloga Fátima Pacheco acredita que há componentes na escolha da mulher que vão além. “A questão de gênero se manifesta nesta eleição de uma forma inédita no Brasil”, considera. Para ela, apesar de tratar de assuntos sensíveis às mulheres, como saúde, o candidato José Serra não soube falar diretamente com elas. “As mulheres não querem somente números e realizações. Elas querem a certeza de que haverá cumprimento do que é prometido, querem ser protagonistas e têm enxergado essa virtude em quem é como elas”, detalha.

Fernanda Feitosa, do Cfemea, defende que, apesar de peculiar nessas eleições, a visão de uma candidata mulher ainda é secundária entre as eleitoras. “A vinculação não é automática porque as candidatas não incluem no discurso de forma concreta bandeiras do público feminino, como aborto e violência doméstica, mas falam de assuntos comuns a todos”, analisa.

Rui Tavares Maluf emenda a visão de que ter mais mulheres votando ou disputando um cargo político pode não representar, necessariamente, uma mudança no comportamento feminino. “O Chile, que é um país conservador e machista, elegeu Michelle Bachelet como presidente, mas os chilenos não deixaram de ser machistas por isso”, conclui. “O fato é que isso começa a deixar de ser uma questão de gênero, passa a ser comum ter uma presidente mulher, sem que isso faça tanta diferença.”

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