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O fim da era Meirelles

Gestão do atual presidente do BC foi marcada por austeridade e uma busca incessante pela manutenção da estabilidade econômica

Por Ana Clara Costa e Benedito Sverberi
24 nov 2010, 16h25

O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, é reconhecidamente um dos maiores acertos do atual governo. O próprio presidente Lula nunca escondeu a importância do administrador para as conquistas econômicas de sua gestão. Com sua política austera de combate à inflação, Meirelles pavimentou o caminho da estabilidade que tem rendido tantos elogios aos petistas. Sua chegada ao BC, em 2003, foi uma boa surpresa para o mercado. Deputado eleito pelo PSDB no ano anterior, ele teve de se desfiliar do partido para aceitar oficialmente o convite para assumir a presidência do órgão.

Oito anos depois, sua saída não chega a ser uma surpresa dado o desejo da presidente eleita, Dilma Rousseff, de estar no centro das decisões econômicas. A presidente eleita reconhece os méritos do atual presidente do BC. Ambos são parecidos na austeridade com que defendem seus pontos de vista. E precisamente essa característica em comum acabou influenciando a própria saída de Meirelles. Enquanto o atual presidente da autoridade monetária não admite interferência do governo em seu ‘latifúndio’, a ex-ministra deixou claro que quer ter controle sobre a condução da economia. Ela também demonstrou interesse em ter uma equipe afinada. Assim, dada a confirmação do ministro ‘mão aberta’ Guido Mantega na pasta da Fazenda, automaticamente abriu-se caminho para a saída de Meirelles.

Rígido na política de juros como instrumento de controle da elevação dos preços, Meirelles seguiu à risca a cartilha econômica deixada pelo governo de Fernando Henrique Cardoso. Tal situação pode mudar após sua saída. Seu substituto, Alexandre Tombini, um funcionário técnico de carreira do BC, já deu sinais de que aceita discutir esse assunto e está aberto ao uso de outros instrumentos de política monetária.

Mudança à vista – O próximo presidente do BC poderá ser, provavelmente, mais dócil ou flexível aos pleitos da ala desenvolvimentista do governo. Nos recentes anos, Meirelles combateu a tentação desenvolvimentista e fincou pé em defesa da solidez dos fundamentos econômicos e das metas inflacionárias. Essa postura passou a ser seguidamente elogiada pelos colegas (presidentes de BC) mundo afora, principalmente após a crise de 2008. Mas seu antagonista, Guido Mantega, ávido defensor da utilização de recursos públicos para aquecer a economia, também recebeu muitos elogios.

Juntos, cada um a sua maneira, e balanceados pelo traquejo político de Lula, formavam um time considerado por muitos vencedor. Ao optar por mexer em apenas um lado desse time, Dilma mandou uma mensagem clara: não irá delegar autonomia total ao Banco Central, como vinha sendo feito nos últimos oito anos.

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Atuação no BC – Quando Meirelles assumiu, o país enfrentava uma crise de confiança derivada das incertezas geradas pela própria mudança de governo. Os investidores ainda temiam que Lula mudasse os rumos da política econômica e não honrasse os compromissos do país com a dívida externa. A taxa Selic estava em 25% ao ano e as expectativas do mercado apontavam uma inflação acima de 11% em 2003. O BC elevou a Selic até 26,5% no primeiro semestre daquele ano, mas isso não impediu que o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) – a inflação oficial – fechasse 2003 em 9,3%, acima da meta ajustada de 8,5%. Com a melhora gradual do cenário, a instituição seguiu o caminho natural de melhora dos juros. Em 2007, período de expansão da economia, a Selic foi mantida a 11,25% ao ano. Sua redução a um patamar ainda menor ocorreu entre 2008 e 2009, devido à desaceleração econômica causada pela crise mundial. Nesse contexto, Meirelles aceitou reduzir a Selic para a mínima histórica de 8,75% ao ano.

As políticas macroeconômicas do governo, entre as quais o controle da inflação perseguido pelo BC, foram citadas por agências de risco que deram ao Brasil, em 2009, o cobiçado grau de investimento. Durante sua gestão, Meirelles também foi taxativo em relação à manutenção do câmbio flutuante. Ao mesmo tempo, não mediu esforços em vender e comprar dólares para conter grandes oscilações da moeda durante a crise (quando o dólar chegou a quase 2,50 reais) e durante o recente afrouxamento quantitativo americano (que fez com que o real e outras moedas dos países emergentes se sobrevalorizarem). Essa atuação, somada a outros fatores, fez com que as reservas internacionais do país saltassem de 37,6 bilhões em janeiro de 2003 para os 285,7 bilhões de dólares atuais.

Teste de fogo – Curiosamente, um cenário semelhante ao de 2003, ainda que bem menos catastrófico, é o que se desenha para o início do governo Dilma. A inflação já dá sinais de alta – a última prévia do IPCA-15 surpreendeu negativamente o mercado com aceleração de 0,87%. No ano, o índice acumula alta de 5,07% – acima da meta de 4,5% estabelecida pelo governo. Diante desse cenário, o natural seria que um aumento de juros ocorresse logo em janeiro, durante a primeira reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC. Contudo, Dilma já deu sinais de que sua intenção é fazer com que a Selic caia, mesmo com a inflação em alta. Segundo a presidente eleita, a taxa real de juros deverá chegar a 2% ao ano em 2014 – a atual é de 5,4%.

Com alguns sinais iniciais em favor de uma política desenvolvimentista, a nova equipe econômica surpreendeu, nesta quarta-feira, ao assegurar o compromisso com austeridade fiscal, o regime de metas de inflação e a autonomia do Banco Central. Se cumprirem o prometido, a era Meirelles tem tudo para continuar. Sobre seu sucessor, o atual presidente do BC explicitou, em nota, estar confiante: “Alexandre Tombini é uma excelente escolha, e um profissional completamente preparado para a função. Trabalhamos juntos por cinco anos e tenho plena confiança nele”.

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