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Wharton School faz parceria com ChatGPT e inclui ferramenta no currículo

Com Erika James, primeira mulher a comandar a mais antiga escola de negócios dos EUA, a IA começa a moldar o futuro da formação de lideranças

Por Luana Zanobia Atualizado em 10 jun 2024, 12h01 - Publicado em 7 jun 2024, 09h50

Erika Dean James fez história ao se tornar a primeira mulher a liderar uma das principais escolas de negócios dos Estados Unidos em mais de 100 anos desde sua fundação, em 1881. Sua nomeação não apenas desafia o establishment, mas também marca um momento mudanças na sociedade. Isso porque para tornar uma sociedade diversa e inclusiva é precisar mudar pelo topo. Dean assumiu a reitoria em 2020, em meio à pandemia e teve que enfrentar as mudanças que essa crise trouxe, a nível educacional e empresarial. Agora, um novo titã tem desafiado o mundo: a inteligência artificial (IA). Envolta em polêmicas e debates, é inegável que essa tecnologia veio para ficar e já tem gerado mudanças significativas. Sob a liderança de Erika James, a Wharton School deu um passo ousado e inovador ao fechar uma parceria com o ChatGPT, integrando a IA no currículo acadêmico. Esta colaboração busca democratizar o acesso à tecnologia de IA para todos os alunos, permitindo-lhes desenvolver habilidades tecnológicas e éticas essenciais no mercado de trabalho moderno. “Estamos implementando, pois estamos incorporando essa tecnologia em como nossos alunos aprendem, preparando-os para os empregos que estão sendo fundamentalmente transformados pela IA,” destacou James.

Essa iniciativa reflete a visão de James de que a competência em IA não é apenas uma vantagem competitiva, mas uma necessidade para os líderes do futuro. Ao abraçar a IA, a Wharton School não apenas responde às demandas do mercado, mas também molda o futuro da educação empresarial, preparando seus alunos para navegar com sucesso em um ambiente de negócios em constante evolução. Como diz o popular ditado: “Se você não pode vencer o inimigo, junte-se a ele.”

Você poderia falar mais sobre o anúncio que fez na semana passada sobre a parceria com o ChatGPT ? Eu não tinha percebido o quanto trabalho já estava acontecendo na Wharton utilizando inteligência artificial, até assistir a uma aula com vários dos nossos professores que estavam ensinando executivos de negócios. Eles estavam absorvendo a informação de maneira intensa porque reconheciam o quanto a IA estava influenciando seu trabalho e suas organizações, mas não sabiam quase nada sobre isso. Assim que percebi quantas pessoas na Wharton já estavam trabalhando nesse sentido, quis encontrar uma maneira de ter um impacto maior.

O que fez você perceber a importância de incorporar mais a IA na Wharton? Nossa grande responsabilidade é para com a comunidade de aprendizagem que vem para Wharton. Alguns deles tinham acesso e estavam usando ferramentas como o ChatGPT, enquanto outros não tinham ideia de como começar, não sabiam onde encontrar ou como usar.

Como vai funcionar essa parceria com a OpenAI? Trabalhamos com eles para fornecer uma licença para que cada aluno da Wharton pudesse usar essa tecnologia. Nossos professores ajudarão a desenvolver as habilidades necessárias para usá-la corretamente, de forma ética. Isso faz parte das mudanças curriculares que estamos implementando, pois estamos incorporando essa tecnologia em como nossos alunos aprendem, preparando-os para os empregos que estão sendo fundamentalmente transformados pela IA.

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Então a parceria é uma forma de democratizar a ferramenta para os alunos? Sim. Uma das maneiras de democratizar isso é garantir que todos os alunos da Wharton tivessem acesso a uma tecnologia como o ChatGPT. Iniciamos conversas com a OpenAI, que já tinha começado uma iniciativa universitária, mas ainda não tinha trabalhado exclusivamente com uma escola de negócios até nós os abordarmos.

Há muitas discussões sobre o uso ético da IA no ensino. Com o intenso debate sobre o uso dessa tecnologia, não há preocupação com a possibilidade de uso antiético? Como vocês abordam essa questão? Deixamos a decisão para cada professor. Cada um pode determinar se os alunos podem ou devem usar essa tecnologia, estabelecendo os limites de como ela será usada e quando será apropriado utilizá-la. Alguns professores dizem que, dado o tipo de trabalho que fazemos na aula, não é apropriado usar IA. Outros dizem que, considerando o trabalho que nossos alunos farão quando saírem daqui e as empresas em que ingressarão, é fundamental que saibam como usar a IA corretamente. Portanto, abordamos essa questão permitindo que cada professor decida.

Como as escolas universitárias estão preparando os alunos para um mundo governado pela IA? Estamos modificando o currículo para ser mais inclusivo em relação à tecnologia e IA, incorporando seu impacto nas vidas atuais dos alunos e no mercado de trabalho. Também estamos fornecendo recursos para que nossos professores criem novos conhecimentos relacionados à IA, com cerca de 25% deles realizando pesquisas nesse domínio. Promovemos a colaboração interdisciplinar, envolvendo áreas como engenharia, medicina, ciências da saúde e ciências sociais. Além disso, temos a responsabilidade de compartilhar nossos recursos com comunidades que têm menos acesso à tecnologia.

Quais tópicos de pesquisa estão atualmente sendo desenvolvidos na Wharton School com auxílio da IA?Como mencionei, há muita pesquisa em IA na Wharton, incluindo a interface entre inteligência humana e artificial. Também temos professores trabalhando no impacto das mudanças climáticas no seguro, habitação e bairros. Outra área fascinante é o estudo das gerações e como estão mudando, com pessoas mais velhas voltando à escola e jovens começando negócios. Esse entrelaçamento de gerações e seu impacto no local de trabalho é uma área de grande importância. Esses são apenas alguns exemplos das nossas pesquisas.

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Diante dos desafios econômicos globais, quais habilidades se tornaram mais importantes para os líderes? A competência cultural e a empatia são cruciais. Os líderes precisam entender profundamente as vidas, meios de subsistência, normas sociais e valores em diferentes partes do mundo, o que exige disposição para aprender sobre outras sociedades. Além disso, com o mundo mudando rapidamente e a tecnologia avançando, a capacidade de adaptação rápida e agilidade são essenciais. Saber usar a tecnologia para facilitar o aprendizado e o crescimento também se tornou uma habilidade indispensável.

Quais são os principais desafios para os futuros líderes? Minha resposta imediata seria o esgotamento, porque há tanta pressão externa, há tantas coisas acontecendo no mundo, e os líderes são esperados para ter todas as respostas, mesmo para questões que estão fora de seu controle e de suas organizações. Eles estão liderando instituições compostas por pessoas que se importam com todas essas questões. Está se tornando cada vez mais difícil para um líder criar os limites entre o que é a missão da organização e o que os funcionários, clientes e o próprio líder esperam que a organização represente.

Você mencionou o esgotamento, mas existem outras preocupações que você tem quando pensa no futuro da liderança? Relacionado ao esgotamento dos líderes, estou preocupada especialmente após a pandemia. Criamos uma geração de jovens que não têm a mesma habilidade para se envolver em interações humanas. Eles estão tão conectados a dispositivos, falam nas redes sociais em frases truncadas. A noção de aprender a se comunicar é muito diferente do que aprendemos na escola e do que os jovens de hoje estão aprendendo. Eles estão entrando no mercado de trabalho sem conseguir manter contato visual da mesma forma, sem conseguir sustentar uma conversa por mais de cinco minutos, porque tudo o que fazem precisa ser em 140 caracteres. Isso é um problema real.

A IA e a bipolarização também são preocupantes? Embora Wharton esteja abraçando a IA, ainda é uma tecnologia que não entendemos completamente e que está evoluindo mais rápido do que o cérebro humano é capaz de acompanhar. Como mantemos o ritmo? Essa é outra preocupação, especialmente para alguém que lidera uma instituição acadêmica. Sobre a bipolarização, não sei onde isso vai acabar, mas não parece que estamos em um bom caminho.

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Quando você assumiu essa posição, quais foram os principais desafios que identificou, especialmente no que diz respeito à educação da nova geração?Quando cheguei à Wharton em 2020, nos primeiros meses da pandemia, o maior desafio era mudar fundamentalmente a forma de entregar a educação. A pandemia mudou como os alunos aprendem, o que aprendem e suas expectativas. Isso agora se reflete no local de trabalho, com gerações mais velhas acostumadas ao escritório todos os dias e jovens que não sabem como formar relacionamentos com seus supervisores. Como escola responsável por preparar a próxima geração, precisamos pensar em como gerenciar essas diferenças.

Quais são os principais desafios para preparar os alunos para o mercado de trabalho? O fato de que o mercado de trabalho está mudando tão rapidamente, e geralmente, na educação superior, leva muito tempo para implementar mudanças. Demora para realizar pesquisas que se alinhem com o que está acontecendo no mercado. Então, acho que o tempo é o maior desafio que enfrentamos. Há uma urgência agora; os alunos precisam aprender novas habilidades muito rapidamente, mas é difícil prepará-los para essas habilidades necessárias. Portanto, o tempo é o maior desafio que estamos enfrentando. O mercado de trabalho é desigual em muitos países.

Você acredita que o investimento em educação e o combate à desigualdade são mais eficazes em países em desenvolvimento? A sabedoria convencional sugere que as economias desenvolvidas, com seus recursos intelectuais e financeiros, estão em vantagem para fazer avanços. No entanto, acredito que as economias em desenvolvimento têm mais vantagens porque precisam engajar em criatividade e assumir riscos para emergir. Enquanto as economias estabelecidas podem se acomodar devido à sua infraestrutura e mecanismos de suporte, as economias em desenvolvimento estão mais propensas a assumir riscos e focar em prioridades fortes. Portanto, acredito que as economias emergentes têm uma vantagem sobre as desenvolvidas nesse aspecto.

Aqui no Brasil, para promover a igualdade na educação em um país grande, o governo implementou cotas para pessoas de baixa renda ou raciais. Você acredita que esse sistema é eficaz? Nos EUA, já tivemos cotas para universidades, posições em conselhos diretores e contratações em diversas organizações, evoluindo para ações afirmativas, que criam oportunidades para pessoas em desvantagem. Recentemente, esses sistemas foram legalmente desafiados e deixaram de ser uma opção. Embora cotas possam funcionar, elas também criam outros problemas. Ainda não encontramos uma solução mágica para a desigualdade, mas continuamos evoluindo nosso pensamento e experimentando novas abordagens.

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Como vocês conseguem equilibrar a promoção da igualdade ao escolher os melhores candidatos, considerando que nem todos têm as mesmas oportunidades? Levamos tudo isso em consideração, e é por isso que nosso processo de inscrição é tão rigoroso. Analisamos notas, pontuações em testes, experiências de trabalho anteriores, recomendações, como os candidatos se apresentam em entrevistas individuais e em grupo, e realizamos exercícios em grupo. Coletamos muitos dados ao longo de um longo período de tempo. Isso nos permite avaliar o quão bem-sucedido um candidato será em nosso ambiente específico. Isso não significa que eles são os melhores em qualquer uma dessas dimensões, mas, em múltiplas dimensões, demonstraram a capacidade de ser o que consideramos os melhores para o contexto da Wharton.

Os EUA estão enfrentando uma diminuição do número de estudantes, especialmente nas universidades. O que você acha disso? É um problema real e muito preocupante. Isso está acontecendo em todas as áreas. Há uma diminuição no número de estudantes que vão para a faculdade em geral e, especificamente, nas escolas de negócios. Isso se deve ao alto custo financeiro, à incerteza sobre o retorno do investimento na educação e à existência de outras maneiras competitivas de obter informações para certos empregos. Algumas instituições mais desejáveis e elitistas não estão enfrentando essa queda, enquanto as escolas menos conhecidas estão realmente lutando.

Como você se sente sendo a primeira mulher – e negra-  nessa posição? Sinto uma responsabilidade imensa, porque sei que há pessoas me observando para ver o que faço e se posso ser uma líder bem-sucedida, já que nunca viram uma mulher liderar a Wharton School antes. Sei que os jovens estão me observando como um exemplo de algo que agora é possível e que não viam antes. E sei que, devido ao meu histórico e às experiências que tive como mulher, posso trazer essas perspectivas para minha liderança e para a visão que tenho para a escola. Quanto mais as pessoas tiverem a oportunidade de trazer todas essas experiências para posições de liderança, mais veremos que a liderança não existe apenas em um tipo de pessoa, mas que todos têm potencial. Precisamos apenas garantir que eles tenham a oportunidade de demonstrá-lo.

 

 

 

 

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