Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Sob os holofotes, de novo

Os Batista, que eletrizaram o país ao denunciar Temer, querem fugir do noticiário, mas a sina continua: estão no centro da disputa empresarial do ano

Por Marcelo Sakate Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 7 dez 2018, 07h00 - Publicado em 7 dez 2018, 07h00

A família Batista, protagonista da crise mais estrondosa da política brasileira ao gravar o presidente Michel Temer em conversa pouco republicana no Palácio do Jaburu, tem uma nova obsessão: fugir dos holofotes. Os acontecimentos que culminaram na prisão preventiva dos irmãos Joesley e Wesley e o acordo de leniência da holding da família, a J&F, com o Ministério Público Federal despertaram o sentimento de que eles só têm a perder com mais aparições em público. Nas palavras de uma pessoa próxima à família, “caiu a ficha”. Traduzindo: na busca para retomar a normalidade dos negócios e escapar de retaliações pelas denúncias contra políticos poderosos, a estratégia passa obrigatoriamente pela discrição. Saíram de cena a presença em festas concorridas e jantares nos melhores restaurantes, fotos em colunas sociais e capas de revista. As empresas da família só se manifestam em eventos corporativos, como a divulgação de resultados. E quem toma a frente são profissionais do mercado. Não por acaso, o novo CEO global da JBS é Gilberto Tomazoni — ele é o primeiro executivo de fora da família a comandar a empresa mais importante do grupo. Esse é o novo posicionamento.

(Arte/VEJA)

Mas quis o acaso (ou não) que os holofotes voltassem a mirar a família: os Batista estão envolvidos na maior e mais rumorosa disputa empresarial do país em muitos anos. É a contenda bilionária pela Eldorado, uma das principais produtoras de celulose do Brasil. Nesse embate, do outro lado está a igualmente bilionária família indonésia (de origem chinesa) Wijaya, dona da Paper Excellence e da Asia Pulp and Paper, empresas de destaque na indústria mundial de papel e celulose. É uma batalha que envolve alguns dos mais renomados escritórios de advocacia do país e grupos experientes de comunicação corporativa. Para desgosto dos Batista, não havia como não ganhar as manchetes. “Não tenho dúvida de que, se o grupo brasileiro envolvido tivesse outro sobrenome, as pessoas e a imprensa se interessariam muito menos ou dariam razão à gente”, queixa-se, pedindo anonimato, um membro da família.

No cerne da disputa pela Eldorado estão minúcias legais que já ganharam as cortes brasileiras — a ação corre em segredo de Justiça — e foram parar em um tribunal internacional de arbitragem, uma espécie de fórum independente do Judiciário para tratar de contendas empresariais. A solução só deve sair em 2020. Em resumo, a Paper Excellence acusa a J&F de não ter se empenhado, conforme estabelecido em cláusula do contrato, para que ela pudesse cumprir todas as exigências previstas para a compra integral da Eldorado, que seria feita por etapas. Com esse suposto corpo mole da J&F, a Paper Excellence permaneceu como acionista minoritária, com 49,41% do capital, sem nenhuma ingerência na administração da produtora de celulose. Os indonésios suspeitam que os Batista desistiram da venda da Eldorado. Há um ano, a empresa foi vendida por 15 bilhões de reais — um valor aparentemente robusto. Acontece que, de lá para cá, o mercado virou. O preço da celulose disparou mais de 40% e o dólar se valorizou cerca de 30% em relação ao real. Como a Eldorado exporta 90% de sua produção, os 15 bilhões de reais passaram a ser uma pechincha. E, diante disso, os Batista estariam inclinados a melar o negócio.

Continua após a publicidade

Por sua vez, a J&F, que se manteve como acionista controladora, com 50,59% do capital, alega que sempre teve interesse em fechar o negócio, mas que o modelo de pagamento apresentado pela Paper Excellence para viabilizar a compra integral da Eldorado alterava de tal modo as condições previstas em contrato que não havia como aceitar a proposta. E que, diante do impasse, o prazo previsto para fechar o negócio acabou expirando. A Justiça negou os pedidos da Paper Excellence de fazer valer sua proposta e de estender o prazo de compra, mas, por outro lado, impediu a J&F de se desfazer das ações da Eldorado. E jogou o caso para a arbitragem.

A venda da Eldorado à Paper Excellence foi acertada há pouco mais de um ano, em setembro de 2017. Na ocasião, a oferta de 15 bilhões de reais surpreendeu concorrentes e analistas por ser considerada generosa em relação à avaliação de mercado. Jackson Wijaya, presidente da companhia, estava tão confiante no desfecho que até alugou um escritório de alto padrão em São Paulo para abrigar a nova operação. Para os irmãos Batista, ficou claro que seria um excelente negócio. Isso porque a transação praticamente encerrava, com chave de ouro, o agressivo plano de venda de ativos da J&F para levantar recursos e reduzir o endividamento, num momento em que a holding estava fragilizada e enfrentava uma crise de credibilidade por causa da revelação de envolvimento em esquemas de corrupção com congressistas e o governo. Havia necessidade de fazer caixa, uma vez que o grupo acertara meses antes, em junho, um acordo de leniência com o Ministério Público Federal no qual se comprometera a pagar multa de 10,3 bilhões de reais ao longo de 25 anos em troca do fim dos processos. Já tinham sido vendidas a Alpargatas (3,5 bilhões de reais) e a Vigor (4,3 bilhões de reais).

Ainda que Joesley e Wesley tenham sido presos de forma preventiva poucos dias depois do fechamento do negócio da Eldorado, tudo parecia finalmente encaminhado, a ponto de o então presidente da companhia, José Carlos Grubisich, entregar a sua carta de renúncia, dizendo que o seu compromisso estava chegando ao fim diante da “conclusão exitosa do processo de venda”. Grubisich viria a ser substituído, dois meses mais tarde, pelo jovem executivo Aguinaldo Gomes Ramos Filho, sobrinho de Joesley e Wesley. Aguinaldo, 27 anos, já havia exercido cargos na JBS no Brasil, no Paraguai e no Uruguai. Filho de Valére Batista, começou a trabalhar nos negócios da família quando tinha 17 anos. Seguia assim os passos de seus tios, que também puseram a mão na massa na JBS ainda jovens. Seria um mandato de transição, cuja duração prevista era de no máximo nove meses, até que a venda fosse concluída e, por tabela, os executivos da Paper Excellence assumissem a empresa. Aguinaldo Filho é um exemplo da nova postura da família: embora tenha conduzido a dura negociação com os Wijaya, ele evitou exposição na mídia. Além dele, Wesley Batista Filho, primogênito de Wesley, é outro membro da terceira geração que tomou a frente dos negócios com um estilo discreto. Wesley Filho, de 28 anos, comanda a operação da JBS na América do Sul.

Continua após a publicidade
À ESPERA - Escritório alugado (e até hoje vazio) pela Paper Excellence em São Paulo para operar a Eldorado; no detalhe, Jackson Wijaya, o presidente da empresa (Antonio Milena/.)

A ascensão e a queda dos irmãos Batista e o litígio com a família Wijaya formam o capítulo mais recente da saga de disputas que envolvem alguns dos mais famosos empreendedores brasileiros. No início da década, o empresário Abilio Diniz ganhou os holofotes com sua batalha para manter-se no controle e exercer influência sobre o Grupo Pão de Açúcar, fundado por seu pai, Valentim. O conflito com a rede francesa Casino foi parar também na arbitragem, mas, depois de dois anos, as partes chegaram a um acordo. Os franceses hoje comandam a empresa, enquanto Abilio Diniz acabou se desligando do Pão de Açúcar. São episódios que prendem a atenção das pessoas, apesar da vontade em contrário de seus protagonistas.

Publicado em VEJA de 12 de dezembro de 2018, edição nº 2612

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.