Ricardo Steinbruch: “Lula ainda não mostrou nenhum plano para a indústria”
Presidente do conselho da Abit, o empresário defendeu a queda dos juros e um 'Plano Safra' para o setor como forma de a indústria voltar a crescer no país
Empossado como presidente do conselho de administração da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), o empresário Ricardo Steinbruch defendeu, em entrevista a VEJA, um regime especial de tributação para a indústria nacional. Para ele, que desenvolveu carreira no setor têxtil, sobretudo na fabricante de denim Vicunha, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ainda não ‘tirou do papel’ o desejo de fortalecer o setor industrial. “O discurso do governo está correto, mas a gente precisa ver a execução. Até agora, isso não se materializou nem em menos impostos nem em juros mais baratos”, afirmou ele, que também acumula passagens como conselheiro da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e presidente do conselho do Banco Fibra. Além disso, Steinbruch crê que a indústria têxtil do país poderá se fortalecer com o movimento de ‘nacionalização’ de parte da produção da chinesa Shein, alvo de polêmicas recentes com o Ministério da Fazenda sobre a tributação de itens importados.
Os empresários da indústria têm reclamado do atual patamar dos juros no Brasil, a 13,75% ao ano. Como isso pode ser prejudicial para novos investimentos no mercado? É fundamental que se baixem os juros. A indústria brasileira ao longo dos anos saiu de uma representatividade de 27% do PIB e está atualmente em 11%. Basicamente, o que a gente não tem são condições favoráveis. A indústria precisa de juros competitivos com os nossos concorrentes. E também precisa ter condições fiscais favoráveis, com boa previsibilidade, para voltar a investir. Não dá para investir com o juro muito alto porque as características dos negócios vão mudando ao longo dos anos e, por isso, nós temos de ser muito cuidadosos. A verdade é que com esses juros extorsivos e os impostos que se tem no Brasil não sobra nada para fazer reinvestimento nas fábricas.
O Lula tem falado em reindustrializar o país. Ele está no caminho certo? Ele falou, mas não veio com nenhum plano ainda. Ele precisa mostrar como é que o governo vai fazer isso. É muito importante que o setor privado ande de mãos dadas com o setor público. Um não faz nada sem o outro. O discurso do governo está correto, mas a gente precisa ver a execução. Até agora, isso não se materializou nem em menos impostos nem em juros mais baratos. Hoje, a indústria de transformação representa 11% do PIB e paga 27% da carga de impostos. A agropecuária é 9,5% do PIB e paga 0,5% da carga de impostos. Eu não acho que eles têm de pagar mais, mas eu gostaria de pagar igual a eles. Eu tenho certeza que, se a gente tivesse um ‘plano indústria’ — assim como o agro tem o Plano Safra, com muito dinheiro subsidiado –, a indústria faria tão bonito quanto a agropecuária faz no Brasil. Os dois são igualmente importantes, mas o poder de desenvolvimento da indústria é mais material.
Quais são as possibilidades para a indústria brasileira dentro do conceito de nearshoring, que tem levado grandes empresas a investirem em fábricas próximas a seus mercados consumidores? A gente tem todas as chances de ser uma alternativa. A única coisa é que o governo precisa fazer a lição de casa. As indústrias aqui precisam ter condições mais atrativas, como menos impostos e juros competitivos. A indústria basicamente precisa de previsibilidade, estabilidade e confiabilidade. Se ela tiver isso, ela cresce. Mas, para uma estrangeira, é mais fácil investir no Brasil ou no México? A carga de impostos no Brasil é 34% e a do México é 18%. Onde você acha que ela vai querer estar? O Brasil ainda tem um problema de logística muito grande que eles não têm. Há uma série de coisas que precisam ser vistas e planejadas. O que a gente precisa é de um plano para a indústria do Brasil que dure dos próximos quinze a vinte anos.
Nesse sentido, como o senhor viu o anúncio da Shein trazendo parte de sua produção para o Brasil por meio de parceiros na indústria têxtil local? Se eles trouxerem a tecnologia deles de inteligência artificial para o mercado brasileiro, vai ser bárbaro. Precisa se materializar. Eu acho que vai dar certo. Eles têm sistemas muito desenvolvidos. Quanto mais aprimorar esse sistema de produção no Brasil, melhor para a indústria brasileira.
Qual é a necessidade da indústria que o país avance em relação aos acordos globais? O Brasil não tem nada. A gente tem que andar com esse acordo entre o Mercosul e a Europa o mais rápido possível, e fazer outros. A gente tem três acordos absolutamente não importantes a nível de mercado. A gente tem de fazer um acordo com a Europa, um com os Estados Unidos e também com os mercados consumidores. Não adianta fazer acordo com quem é concorrente e brigar com os nossos clientes.
Nos últimos anos, a Abit ficou associada, de certa maneira, ao bolsonarismo. Com a sua eleição para o conselho e um novo governo federal, essa imagem mudará? A gente não escolhe presidente da República. Temos de tocar os interesses da indústria com o presidente que tiver. Somos um órgão apolítico e a favor da indústria têxtil do Brasil, independentemente de o presidente ser a opção A, B ou C.