Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Governo corre para acelerar privatizações e reformas

Pressionado pela falta de recursos, que ameaça paralisar vários serviços, país agiliza as mudanças

Por Machado da Costa Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 30 ago 2019, 08h55 - Publicado em 30 ago 2019, 07h40

 

(./.)

Dez entre dez planejadores financeiros darão a seguinte orientação a alguém que esteja no vermelho: para reequilibrar as contas, é preciso aumentar a receita ou diminuir a despesa — quem sabe até, dependendo da gravidade do caso, fazer as duas coisas. A obviedade sempre irrita o devedor — afinal, não é nada fácil, nem confortável, aumentar a entrada de recursos, muito menos ainda cortar gastos. Isso vale tanto para milhões de famílias brasileiras endividadas como para o governo de Jair Bolsonaro, que vive grave problema fiscal. A situação é tão calamitosa que o Congresso já autorizou, no Orçamento anual, um déficit de 139 bilhões de reais para 2019 — mas o “cheque especial” não foi suficiente. Faltando ainda quatro meses para a virada do ano, diversos órgãos públicos já estão com a corda no pescoço e ameaçam paralisar ou diminuir drasticamente os seus serviços, como é o caso do Exército, da FioCruz e da Receita Federal (veja os quadros).

A verdade é esta: o dinheiro acabou, e não há caminho simples para reequilibrar as contas. A saída de curto prazo é um pedido do presidente da República ao Congresso Nacional para que autorize o aumento do limite de despesas. A manobra, contudo, não resolve o problema em definitivo: no próximo ano, o rombo seria ainda maior. A única — e urgente — solução é levar adiante as reformas estruturais que atacarão os dispêndios da União, ou seja, as mudanças na Previdência (já aprovadas pela Câmara), no Pacto Federativo e na Administração Pública. “Sem as reformas, as contas vão começar a não fechar mais”, alerta Guilherme Afif, assessor especial do Ministério da Economia.

PORTÕES ARRIADOS – Posto da Polícia Federal na capital paulista: emissão de passaportes ameaçada (JEFFERSON COPPOLA/.)

Enquanto as reformas não vêm, os órgãos do Estado já estão em modo de gestão espartana. Haja o que houver, as luzes nos edifícios do Ministério da Economia, por exemplo, estão sendo desligadas às 18 horas. A medida reduz o gasto com eletricidade e impede o acúmulo de horas extras por parte dos servidores. O Exército foi mais longe e colocou a tropa em regime de meio expediente. Quando Bolsonaro anunciou que os radares móveis de velocidade seriam cortados, ele deixou de comentar que a Polícia Rodoviária Federal já esgotou todo o orçamento do ano e não tem mais caixa para alugar os equipamentos. Está em curso o “shutdown branco”, termo inspirado no “shutdown” americano, empregado sempre que serviços públicos são interrompidos por falta de verbas. Como aqui a interrupção não é abrupta, usa-se o adjetivo “branco”.

(./.)

A hipótese de aumentar receitas por meio de tributação está afastada. Com a economia travada, a arrecadação de impostos estanca junto. Na quinta-feira 29, dados do IBGE mostraram que o PIB cresceu 0,4% no segundo trimestre (leia mais). Assim, resta ao governo recorrer aos bancos públicos e a leilões de petróleo. Do BNDES, no entanto, voltarão para a União apenas 2 bilhões de reais até setembro — a instituição tem aproximadamente 100 bilhões de reais em caixa, graças à recente venda de suas participações em outras empresas, porém uma determinação contábil e estatutária impede que os recursos sejam repassados ao Estado antes do fim do segundo semestre. Na Caixa, os recursos não chegam a 4 bilhões de reais. Some-se isso ao dinheiro esperado do leilão da cessão onerosa do pré-sal, e o governo conseguirá fechar 2019 dentro do déficit previsto. Entretanto, como está no vermelho, ele precisará pedir ao Congresso o aumento do limite do “cheque especial”. No momento, são necessários 20 bilhões de reais extras.

Não há salvação fora das reformas. Se tudo permanecer como está, o problema será mais grave em 2020: o dinheiro poderá acabar ainda no primeiro semestre. Nas discussões do Orçamento do ano que vem — que estão atrasadas desde julho —, o Congresso já trata como certa a liberação ao Executivo de 265 bilhões de reais em créditos suplementares, quer dizer, em emissão de dívida, para evitar que o governo estanque. Para 2019, foram concedidos 249 bilhões de reais nessa rubrica. É insustentável. O governo precisa acelerar a agenda econômica. Depois de aprovado o projeto da Nova Previdência no Senado — a PEC deve ser votada na Comissão de Constituição e Justiça nos próximos dias —, o foco de atuação deve se voltar para as mudanças tributárias, administrativas e do Estado. Essas três medidas, conjuntamente, podem impulsionar a arrecadação fiscal, abrir espaço para a demissão de servidores ou flexibilização de sua jornada de trabalho e desvincular receitas de áreas como saúde e educação. As despesas da União com folha de pagamento, de ativos e inativos, tomam 67% de todo o Orçamento. Neste ano, os gastos discricionários — aqueles em relação aos quais o governo tem alguma margem de manobra — representam 6,6% do total. “Como o gasto corrente cresceu muito em razão das determinações da Constituição de 1988, uma hora a conta não iria fechar. Sem margem para investimentos públicos, não crescemos — cometemos um ‘austericídio’ ”, afirma o economista Raul Velloso.

Continua após a publicidade
‘SHUTDOWN’ – O Capitólio, nos EUA: parque fechou em janeiro deste ano por falta de verba (JEWEL SAMAD/AFP)

Qualquer medida de curto prazo será ineficiente para evitar apagões no serviço público. Executivo e Legislativo devem buscar uma solução que permita cortar a folha de pagamento e melhorar o uso de tecnologia na administração. “Não há evidência alguma no mundo de que apenas cortes são suficientes para balancear as contas públicas”, garante o professor Istvan Kasznar, da FGV. Todo governo em início de mandato se atrapalha devido à herança da gestão anterior. Depois de doze meses de comando, com os problemas já mapeados, as soluções precisam começar a sair do papel. As reformas e as privatizações são mais urgentes do que nunca.

Publicado em VEJA de 4 de setembro de 2019, edição nº 2650

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.