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Novo embate entre EUA e Brasil ameaça forte desempenho do mercado brasileiro em 2025

Fenômeno foi impulsionado pelos investimentos de estrangeiros, que hoje respondem por 30% das operações realizadas no país

Por Márcio Juliboni Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO , Ana Paula Ribeiro 12 jul 2025, 08h00

O mercado financeiro costuma ser alvo de críticas por sua aparente desconexão com a realidade e os desafios concretos enfrentados pela maioria da população. À luz do desempenho recente da bolsa brasileira, esse julgamento pode parecer pertinente. Mesmo com o agravamento do cenário fiscal — que levou o Banco Central a elevar a taxa Selic a 15% ao ano — e com o aumento das tensões geopolíticas internacionais, o Ibovespa, o principal índice acionário do país, acumulou alta de 15% no primeiro semestre, seu melhor resultado para o período desde 2016. A valorização seguiu até 4 de julho, quando o indicador atingiu 141 000 pontos, um novo recorde nominal, sem ajuste pela inflação. O otimismo contagiou o mercado, e diversas casas de análise revisaram suas projeções. O banco Santander, por exemplo, passou a prever que o Ibovespa poderia alcançar 160 000 pontos até dezembro, o que representaria uma alta de 16% sobre o nível atual. Entender o que impulsionou essa trajetória e quais fatores sustentam as expectativas positivas de curto prazo é fundamental para quem se pergunta se o melhor já ficou para trás ou se ainda há espaço para bons retornos.

VIRADA - Galípolo: início do ciclo de corte de juros poderá ser um gatilho extra para as ações
VIRADA – Galípolo: início do ciclo de corte de juros poderá ser um gatilho extra para as ações (Suamy Beydoun/AGIF/AFP)

Para chegar a uma resposta, é preciso entender sobretudo o comportamento dos estrangeiros, que hoje respondem por 30% das operações realizas no mercado de ações brasileiro. Em 2024, esses investidores retiraram 24 bilhões de reais da B3, a bolsa de valores de São Paulo, e foram decisivos para que o Ibovespa afundasse 10%. A primeira causa da debandada foi a deterioração das contas públicas, o que aumentou a aversão ao risco-­Brasil. Mas o cenário dos Estados Unidos também pesou. Os investidores rumaram para a América do Norte, atraídos pela taxa de juros de 5,5% ao ano, elevada para os padrões americanos, e pela expectativa de que Donald Trump venceria a eleição presidencial em novembro. Agora, as decisões erráticas de Trump, que tumultuam a economia global, e a aposta de que o Federal Reserve, o banco central americano, começará a cortar os juros a partir de setembro incentivam os estrangeiros a buscar outros mercados. No acumulado do ano até a primeira semana de julho, os gringos injetaram 28 bilhões de reais na bolsa — o que ajuda a explicar a alta recorde. Isso não significa que os problemas que os afugentaram estejam resolvidos. “A volta dos estrangeiros não é um mérito do Brasil”, diz Bruce Barbosa, sócio da casa de análises Nord Research. “Outras bolsas de países emergentes também estão subindo.”

Gestores costumam seguir um princípio simples: comprar papéis se estiverem baratos e puderem se valorizar e vendê-los na situação contrária. O fato é que, apesar da forte alta, a bolsa brasileira continua uma pechincha — e os estrangeiros sabem disso. Para determinar se uma ação está barata, um dos índices mais usados é a relação preço/lucro (P/L), que compara o valor do papel com o lucro gerado pela empresa que o emitiu. Quanto maior for o P/L, mais cara é a ação, já que o preço para a compra é elevado em relação ao retorno que gera. Na média, o P/L do Ibovespa oscila ao redor de 12. Neste ano, contudo, o índice está abaixo de 9. “Isso mostra como a bolsa está barata”, afirma Pedro Galdi, analista da AGF Investimentos, casa focada em educação financeira. “Não me parece complicado o Ibovespa alcançar os 150 000 pontos.” De acordo com Galdi, a renda variável ganhará um impulso extra quando o Banco Central, capitaneado por Gabriel Galípolo, começar a cortar a taxa Selic, hoje em 15% ao ano. Para a maioria dos analistas do mercado, porém, os juros só começarão a ser reduzidos a partir do ano que vem.

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EFEITO TRUMP - Nasdaq: em 2025, as bolsas americanas acumulam alta modesta
EFEITO TRUMP - Nasdaq: em 2025, as bolsas americanas acumulam alta modesta (Michael Nagle/Bloomberg/Getty Images)

Composto atualmente por 84 papéis de 82 empresas, o Ibovespa representa uma média ponderada das oscilações desses ativos — o que não significa, naturalmente, que todos sobem quando o índice avança. Dentro dessa carteira teórica, há disparidades expressivas: ações como as da Cogna, empresa do setor educacional, acumulam valorização de 153% no ano, enquanto outras, como as da rede de farmácias Raia Drogasil, amargam queda de até 37%. O cenário de incertezas ganhou um ingrediente a mais com o anúncio do presidente Donald Trump de imposição de uma sobretaxa de 50% às importações americanas de produtos do Brasil a partir de 1º de agosto (leia a reportagem na pág. 28). A medida, revelada na quarta-feira 9, aumenta a cautela dos investidores, ainda que, segundo analistas, o impacto direto sobre a bolsa seja limitado. “O efeito das sobretaxas na bolsa brasileira é marginal”, afirma Luiz Fernando Alves Júnior, executivo da gestora Versa Asset. Para ele, a Embraer, que tem 46% da receita atrelada às vendas de aeronaves aos Estados Unidos, tende a ser a mais afetada. Ainda assim, a fabricante brasileira mantém uma planta ociosa em solo americano que pode ajudar a neutralizar parte das barreiras. Outras companhias com foco no mercado externo podem redirecionar a produção para destinos diferentes, reduzindo o efeito das tarifas sobre os resultados.

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A única certeza é que o embate entre Brasília e Washington acerca da sobretaxa adicionará mais incerteza ao mercado de ações, e isso sempre se traduz em fortes oscilações de preço — é a chamada volatilidade. Em vez de o investidor se recolher à espera de tempos menos turbulentos, é hora de garimpar boas oportunidades. “Uma janela de investimentos será aberta se a bolsa cair muito devido ao episódio das tarifas”, afirma Fernando Ferrer, chefe de renda variável da gestora Lifetime. Enquanto os investidores institucionais, como os fundos de pensão, acumulam 32,8 bilhões de reais em saques na bolsa neste ano e apostam na renda fixa impulsionada pela taxa Selic de 15%, as pessoas físicas já investiram 6,6 bilhões em ações, um valor que só fica atrás do aportado pelos estrangeiros. Pelo menos no que se refere ao otimismo em relação à bolsa, brasileiros e americanos já se entenderam.

Publicado em VEJA de 11 de julho de 2025, edição nº 2952

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