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Loyola lamenta ‘fulanização’ do BC em críticas de Lula a Campos Neto

Ex-presidente do Banco Central destaca compromisso fiscal do governo, apesar de texto não ser 'ideal', e início de processo de desinflação

Por Pedro Gil Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 16 jun 2023, 13h51 - Publicado em 16 jun 2023, 13h49

Presidente do Banco Central entre 1992 e 1993 no governo de Itamar Franco e entre 1995 e 1997 durante o mandato de Fernando Henrique Cardoso, que implementou o plano real na economia, Gustavo Loyola falou a VEJA sobre o dragão que aflige o País: a inflação.

É verdade que o monstro perdeu força nos últimos meses. Temos uma das menores inflações do mundo. Em maio, o IPCA, subiu míseros 0,23%, muito abaixo das expectativas do mercado, o que resultou numa alta de preços equivalente a 3,94% em doze meses.

Mesmo ferido, o dragão está à espreita. Sempre esteve. Dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) mostram que, entre 1980 e 1989, os preços no País subiram, em média, 233,5% ao ano. Em 1989, na despedida do governo José Sarney, o índice anual chegou a intoleráveis 1.764,8%.

É trabalho do Banco Central debelar a ameaça da inflação com uma política monetária restritiva — juros altos. Desde janeiro, o presidente Lula vem repetindo a mesma crítica à alta dos juros, em 13,75%. Ele falou sobre o assunto em suas viagens internacionais, nas diversas entrevistas que deu desde que assumiu o cargo e tem comprado uma briga pública com Roberto Campos Neto, a quem acusa de ser uma espécie de infiltrado do ex-presidente Jair Bolsonaro, que o nomeou ao posto como presidente do Banco Central. “Algumas declarações vão na direção de que o presidente não entendeu a regra do jogo”, lamenta Campos Neto. “A autoridade monetária pode ser criticada, mas o que me preocupa nas falas do Lula é a fulanização do processo e as ameaças à independência da instituição”, afirma Loyola. Apesar das críticas, Lula começará a colher agora os efeitos da Selic que tanto criticou: uma inflação sob controle.

Como o senhor vê a trajetória recente da inflação no país? Os resultados têm sido bons. Temos que considerar todo o contexto, tanto o cenário doméstico quanto o externo. Dentro disso, a trajetória da inflação, entre outros fatores, está reagindo à política monetária. Não é o único fator, houve melhor nos preços das commodities, mas a política monetária ajudou a inflação a não se propagar mais, com efeito sobre o setor de serviços e um câmbio desvalorizado, o que também ajuda. Além disso, o fato do Banc o Central ter mantido a posição, apesar das pressões, ajudou a manter as expectativas relativamente confortáveis. A politica monetária tem se mostrado correta.

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Uma crítica recorrente do governo é contra a autonomia do Banco Central. Ela deveria ser revista? O Banco Central muitas vezes tem que fazer movimentos que acabam tendo efeitos negativos inclusive do ponto de vista político, por isso ele precisa ser autônomo. Não pode ser refém do ciclo político. Imagina se o Banco Central atendesse sempre as expectativas do político do momento… A inflação não cairia nunca! Isso não quer dizer que ele não erre e não possa ser criticado. Mas as críticas do Lula me preocuparam. É comum que o chefe de governo reclame de juros altos, mas o que me deixou mais preocupado foram as ameaças à independência do Banco Central e a fulanização do processo. Campos Neto está exercendo uma função institucional. Qualquer economista sério faria a mesma coisa. O risco era o Lula atentar contra a autonomia, mas não acredito que ele fará isso. Seria uma briga política bastante ingrata.

As críticas são que a Selic está em patamar elevado há muito tempo. Com a inflação sob controle, o BC não poderia ter iniciado a trajetória de corte antes? É claro que política monetária não é engenharia, então é difícil pensar o que poderia ter sido, mas temos que analisar os resultados, que são bons. Por outro lado, quando se olha o desempenho da economia, embora tenha muito a ver com o agronegócio, a gente vê que não caímos em recessão, os indicadores de emprego estão relativamente bons. O custo dessa alta de juros não tem sido tão elevado quanto muitas vezes se observou em situações anteriores. O BC está fazendo um trabalho correto. Esse processo de desinflação é lento e, no Brasil, tende a ser ainda mais lento por conta do componente inercial, mas vemos outros países sofrendo da mesma maneira.

Outra crítica é ao regime de metas, estabelecido pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que estabelece que a inflação brasileira deve ficar em torno de 3,5% ao ano. Não poderíamos rever a meta para que não tenhamos uma taxa de juros tão alta? Se a gente pegar o histórico a gente vê que a inflação ficou acima da meta nos anos recentes, mas o Banco Central teve bastante sucesso em manter a ancoragem das expectativas e fazer com que houvesse a volta da inflação para a meta dentro de um período razoável. Então eu faço um balanço positivo do regime de metas, embora a inflação tenha ficado acima dela nos últimos 2 anos. Mesmo assim, ela tem servido de balizador para o Banco Central e tem ajudado a ancorar as expectativas. Alteração da meta poderia sinalizar maior tolerância com inflação.

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A política monetária é a principal ferramenta de combate a inflação, mas não a única. Política fiscal também influencia? O Banco Central acabou ajudado por outros fatores, mas o bode saiu da sala com a aprovação do arcabouço fiscal pela Câmara, que não é o ideal, mas pelo menos sinaliza algum compromisso com a política fiscal. O efeito foi positivo sobre as expectativas. No geral, o desempenho da economia está melhor do que se poderia esperar.

O início do processo de corte na Selic se aproxima. Quando veremos os resultados de reaquecimento da economia? A gente tem que olhar para 2024. Não tem como a política monetária influenciar muito neste ano. Tivemos uma queda nas expectativas da inflação para o ano que vem. A notícia boa é que as expectativas caíram, mas o Banco Central tem que ter muita cautela na redução do juros. A minha expectativa é que o Copom vai dar algum sinal de melhora nas condições no balanço de risco na reunião da semana que vem e pode sinalizar que em breve começará processo de redução da Selic de maneira gradual. A primeira queda viria em agosto.

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