Indústria resiste ao aperto monetário e encontra fôlego na demanda interna
Apesar do recuo de 0,2% em outubro, setor está 2,6% acima do nível pré-pandemia e acumula crescimento de 5,8% em relação a outubro de 2023
A produção industrial brasileira sofreu uma leve contração de 0,2% em outubro, frustrando as expectativas do mercado, que previa um crescimento de 0,1%. O dado veio apenas um dia após a divulgação de um PIB trimestral robusto, que registrou expansão de 0,9%, elevando as projeções de um crescimento econômico acima de 3% para 2024. A discrepância entre o desempenho da indústria e a força do PIB, no entanto, não é necessariamente uma indicação de fraqueza estrutural. Pelo contrário, sugere um ajuste pontual em um setor que tem sido pressionado por condições monetárias.
Dos 25 setores analisados, 19 apresentaram crescimento, liderados por um salto expressivo de 7,4% no segmento de veículos automotores. Setores como bens de capital, que inclui máquinas e equipamentos, e bens duráveis, como automóveis e eletrodomésticos, também se destacaram com altas de 1,6% e 4,4%, respectivamente. Esses segmentos, tradicionalmente voláteis, têm mostrado força sustentada nos últimos meses. “O desempenho da indústria, especialmente em setores mais voltados ao investimento, reflete uma recuperação gradual da capacidade produtiva, mesmo diante de um cenário de juros elevados”, explica Claudia Moreno, economista do C6 Bank.
Embora o dado mensal seja negativo, a produção industrial brasileira ainda se encontra 2,6% acima do nível pré-pandemia e acumula um crescimento de 5,8% em relação a outubro de 2023. Isso demonstra que, apesar dos ventos contrários, a demanda interna permanece robusta, apoiada por uma recuperação lenta, mas constante do mercado de trabalho e medidas de incentivo ao consumo. “Os setores de bens duráveis e de capital são indicativos importantes do apetite por investimento e consumo no país. A julgar pelos números mais recentes, há sinais de resiliência no coração da indústria brasileira”, acrescenta Moreno.
Entretanto, os desafios estruturais não podem ser ignorados. A produção industrial ainda está 14,4% abaixo de seu pico histórico, alcançado em maio de 2011. Esse hiato reflete obstáculos antigos, como a alta carga tributária, burocracia excessiva e a baixa competitividade internacional, que continuam a limitar o crescimento de longo prazo. Além disso, o alto custo do crédito, com a Selic em 11,25%, continua a impor um freio às ambições do setor. “O ambiente global incerto e as condições monetárias restritivas são hoje os principais entraves à expansão industrial no curto prazo”, ressalta Alberto Ramos, economista do Goldman Sachs.
No entanto, a perspectiva para 2024 permanece otimista. “Nossa projeção é de um crescimento de 3,2% no PIB em 2024, com um viés positivo, impulsionado pela recuperação da demanda interna. A indústria deverá acompanhar esse movimento, com um crescimento próximo a 3% ao final do ano”, projeta Moreno.
Ainda que a indústria brasileira esteja longe de atingir seu pleno potencial, os dados recentes sugerem uma base de recuperação moderada, mas consistente. “Olhando adiante, o setor poderá encontrar suporte em uma política industrial mais assertiva e em medidas fiscais pró-cíclicas, embora continue a enfrentar os desafios de um ambiente global incerto e condições monetárias ainda apertadas”, conclui Ramos.
A leve contração de outubro não deve ser interpretada como um sinal de alerta, mas como parte de uma trajetória irregular de recuperação, típica de um setor que ainda luta para reconquistar o terreno perdido.