Com guerra comercial e Amazônia, dólar vai a R$ 4,12, o maior em 11 meses
Moeda termina semana no maior valor desde setembro do ano passado, período pré-eleitoral; bolsa cai 2,3%, aos 97.667 pontos
Temperaturas altas com a troca de medidas e ameaças entre Estados Unidos e China e com a tensão diplomática entre o Brasil e outros países devido aos incêndios na Amazônia fizeram com que o dólar comercial fechasse esta sexta-feira, 23, no maior patamar deste ano. A moeda terminou a semana com alta de 1,15% no dia e cotada a 4,12 reais – o valor mais alto em 11 meses, período pré eleitoral, quando a moeda era negociada a 4,14 reais. Essa conjuntura também repercutiu na bolsa, que perdeu o patamar dos 100 mil pontos. O Ibovespa, principal índice acionário do país, teve queda de 2,34%, fechando a 97.667 pontos.
Nesta sexta-feira, a França ameaçou votar contra o acordo do Mercosul por causa das queimadas na região amazônica. “Dada a atitude do Brasil nas últimas semanas, o presidente da República só pode constatar que o presidente Bolsonaro mentiu para ele na cúpula (do G20) de Osaka”, declarou o Palácio do Eliseu, estimando que “o presidente Bolsonaro decidiu não respeitar seus compromissos climáticos nem se comprometer com a biodiversidade”.
Além dele, Boris Johnson, Angela Merkel e Justin Trudeau cobraram Brasil por queimadas na Amazônia. Irlanda também ameaçou tratado de livre-comércio. Segundo André Perfeito, economista-chefe da Necton, a tensão diplomática repercute nos negócios do Brasil. “O real foi a moeda que mais se desvalorizou ante ao dólar ontem devido a essa tensão. É preciso uma sinalização diplomática vinda do presidente Bolsonaro e do Itamaraty para reverter a situação”, analisou.
Entre ruídos da crise, o governo da Finlândia, que atualmente detém a presidência rotativa da União Europeia, pediu que os países do bloco avaliem a possibilidade de banir a importação de carne bovina do Brasil por causa da devastação causada pelas queimadas na Amazônia. A notícia refletiu nas ações de frigoríficos. As da JBS caíam 4,85% e da BFR, 2,45%.
Segundo Perfeito, a questão da Amazônia gerou mais tensão em um mercado que já estava tenso. Isso porque, após diversos avisos, a China, de fato, anunciou tarifas adicionais em produtos americanos. O valor é de 75 bilhões de dólares e as alíquotas vão variar entre 5% e 10% — parte delas entra em vigor em setembro e outra em dezembro. Donald Trump já disse que vai retaliar. A medida é uma resposta ao anúncio do governo americano, do início de agosto, de que vai impor tarifas de 10% sobre 300 bilhões de dólares em bens chineses. Assim como os chineses, os americanos vão dividir as tarifas entre setembro e dezembro. No Twitter, Trump afirmou: “Eu vou responder às tarifas da China essa tarde”.
A escalada de tensões entre os dois países derrubou os mercados mundo afora. Nos Estados Unidos, o Dow Jones caiu 2,37% e o S&P, 2,59%. Na Europa, os índices tinham alta até quase o final do pregão, quando veio a notícia sobre as tarifas. O alemão DAX fechou em queda de 1,15% e o francês CAC 40, de 1,14%.
Cenário interno
A bolsa também sofre as consequências do cenário corporativo. A Polícia Federal deflagrou nesta sexta a 64ª fase da Operação Lava Jato, baseada no acordo de delação premiada celebrado entre o ex-ministro Antonio Palocci firmado com a PF. O objetivo é apurar irregularidades na venda de ativos da Petrobras ao banco BTG e informações de recursos contabilizados pela Odebrecht na planilha “Programa Especial Italiano”. As ações do BTG caíram 15%, sendo o terceiro papel mais vendido na sessão.
Pablo Spyer, diretor da corretora Mirae Asset, chama a atenção para o atraso da reforma da Previdência, que também tem peso no índice. “No mundo, a coisa mais importante hoje para o mercado é a guerra comercial. Já no Brasil, é a reforma da Previdência, com o atraso no relatório pelo relator Tasso Jereissati (PSDB-CE). Se atrasa a reforma, a bolsa cai e o dólar sobe. Se a Previdência atrasa e o Trump briga com a China, o dólar sobe ainda mais e a bolsa cai mais.”