‘BC não vai colocar o carro à frente dos bois’, diz Loyola sobre juros
Ex-presidente do BC comemora boas notícias que poderiam levar a um corte mais forte da Selic, mas alerta para caráter conservador da autoridade monetária

O Comitê de Política Monetária (Copom) decide nesta semana os rumos da taxa básica de juros da economia brasileira. As atenções do mercado financeiro estão voltadas para a reunião do Banco Central (BC), que acontece na quarta-feira, 2, mas não há consenso quanto ao ritmo que a autoridade monetária vai adotar neste início de ciclo de descompressão da Selic, atualmente em 13,75% ao ano.
A ata da última reunião, em junho, indicou que o BC iniciaria o processo de corte em 0,25 ponto percentual, mas desde então as condições para acelerar o ritmo para 0,50 ponto percentual se acumularam. Prévia do Produto Interno Bruto (PIB), o IBC-Br mediu uma queda de 2% da atividade econômica em maio; o Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) registrou deflação de 0,07% em julho. A agência de classificação de risco Fitch Rating elevou de BB- para BB a nota de crédito do Brasil. A classificação, chamada de rating soberano, indica qual o risco de o país dar um calote. Essa certificação dá segurança para os investidores aplicarem recursos por aqui. “São notícias positivas, que podem inclusive acelerar esse processo mais à frente, mas acho que o BC não vai apostar nesse cenário de maneira mais forte agora”, alerta Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central. “O BC prefere, nesse caso, não colocar o carro à frente dos bois e surpreender o mercado”, prossegue. Segundo o economista, mudar o que já estava precificado na ata da última reunião do Copom “pode levar até a uma desancoragem das expectativas”.
De fato, há argumentos para desacelerar o ritmo de queda da Selic. O mercado de trabalho segue em recuperação, o que joga a favor dos que defendem um BC mais conservador nesse início de corte. A taxa de desemprego ficou em 8% no trimestre encerrado em junho, o menor resultado para o período desde 2014.
Em entrevista a VEJA, Loyola lamenta que a autoridade monetária venha recebendo críticas injustas e que a melhora do cenário macroeconômico tem muito a ver com a postura contracionista do Banco Central.
O Banco Central iniciará o processo de corte de juros nesta semana. Qual a sua expectativa para o ritmo que o comitê vai adotar? Minha expectativa continua sendo de uma queda de 0,25 ponto percentual. Acho que o Banco Central vai começar de maneira mais cautelosa e, apesar de a inflação ter dado um alívio, não acho que isso vai mudar, neste momento, o ritmo que eles haviam sinalizado na última reunião.
Quando o Banco Central sinalizou que iniciaria o corte de forma mais “parcimoniosa”, não tínhamos notícias de desaceleração da atividade econômica e um processo de desinflação consistente. Isso não pode alterar os planos do Copom? São notícias positivas, que podem inclusive acelerar esse processo mais à frente, mas acho que o Banco Central não vai apostar nesse cenário de maneira mais forte agora. Não acho que a maioria da diretoria vai nessa direção. O Copom prefere, neste caso, não colocar o carro à frente dos bois, surpreendendo o mercado. Isso pode levar até a uma desancoragem das expectativas.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, vem sofrido críticas do governo pelo patamar da taxa de juros. Como o senhor avalia o trabalho dele? Ele é protagonista como presidente do banco, mas vem sofrendo críticas injustas. Essa melhora do cenário macroeconômico tem muito a ver com a postura do Banco Central. Muita gente não leva em conta que, se ele não tivesse uma postura mais dura, de repente você teria uma situação mais complicada e talvez não tivesse nem dado espaço para que o Brasil ganhasse esse upgrade de crédito. Foi uma conjunção de fatores mais favorável.
Uma crítica ao trabalho de Campos Neto é que é difícil prever sua política monetária, por isso a expectativa para este início de processo de corte na Selic. É justo que ele seja visto como um presidente do Banco Central “vacilante”? As pessoas têm suas convicções, mas a política monetária é ditada pelos fatos. Não é uma postura dogmática. Eu acho que tem uma diferença entre “vacilar” não tendo um objetivo claro e “vacilar” tendo estratégias diferentes de política monetária. É importante que o Banco Central não se desvie do seu objetivo, e seu objetivo é atingir a própria meta de inflação. Ele mostrou que não está vacilando ao resistir a pressões.
O Banco Central é alvo de críticas por ter mantido a taxa Selic em 2% por tempo demais no passado. Agora também é alvo de críticas parecidas por manter os juros no patamar de 13,75% por tempo demais. Como alinhar o tempo da política monetária? A condução da política monetária varia de acordo com dados. O Banco Central tem discricionariedade para acelerar ou desacelerar o ciclo de juros e decidir de acordo com a conjuntura. Se a conjuntura muda, o Banco Central não tem que ter vergonha de mudar de direção.