Bolha Covid: ações de tecnologia chegaram ao topo?
Zoom, Tesla, Facebook, Amazon despencaram nesta quinta e seguem em queda hoje; Apple perdeu 180 bilhões de dólares só ontem. Correção ou mercado urso?
“Rendeu muito este período de ‘zoom'”, escreveu outro dia o bilionário Jorge Paulo Lemann para um colega, gabando-se de como, por viajar menos, teve mais tempo. Assim como o empresário, milhões de pessoas passaram a usar o aplicativo Zoom para reuniões. E é por essas e outras que as ações da empresa do Vale do Silício explodiram durante a pandemia do coronavírus, tornando a companhia num colosso de 100 bilhões de dólares. É três vezes mais que o valor da Ambev, a cervejaria brasileira que alçou Lemann ao topo do mundo corporativo. Mas, no começo da semana, as ações do Zoom mostraram que havia espaço para mais valorização e em um único dia subiram 40% na Nasdaq. Parecia haver justificativas para isso. Os resultados do segundo trimestre mostraram que a situação da empresa é ainda melhor do que os investidores esperavam. E o otimismo estava transbordando na bolsa americana. O apetite pelas ações de tecnologia era tamanho que as ações da Apple e da Tesla também dispararam na segunda-feira simplesmente porque as empresas desdobraram as suas ações – por exemplo, dividindo cada ação em duas –, o que costuma dar liquidez aos papéis, ao facilitar a negociação em preços menores. Mas a euforia foi tanta que, nesta quinta-feira, os investidores começaram a se questionar se não estava um tanto exagerada. Resultado: alguém começou a vender e um monte de gente foi atrás, com a Nasdaq caindo mais de 5% no dia, afetando ações também no Brasil. Nesta sexta, a Nasdaq já abriu em queda livre.
O estrategista-chefe da Avenue, uma corretora para brasileiros que querem investir diretamente em ações americanas, William Castro Alves, diz que não houve um motivo forte para que a Nasdaq caísse tanto, sejam dados econômicos ou políticos. Para ele, parece mais que os investidores perceberam que as ações de tecnologia estavam caras e venderam para adquirir ações que estavam há muito tempo defasadas, como a de empresas de cruzeiros ou lojas como a Macy’s. De fato, essas ações subiram no pregão de quinta. Mas o que os analistas começam mesmo a se questionar é se os preços das empresas de tecnologia não podem cair mais. Existiria uma nova bolha das pontocom, como a do começo dos anos 2000? Em agosto, muito já se falava em bolha da Covid com os investidores se posicionando como se a única coisa que tivesse restado ao mundo fosse a internet. E assim as empresas valorizaram 100%, 200%, 300%, 400%, 500%, como foi o caso do Zoom.
Mesmo com os alertas de bolha, as techs continuaram a subir em agosto. A Tesla, por exemplo, a empresa de Elon Musk, que fabrica carros elétricos, se valorizou 70% no mês só porque os investidores ficaram na expectativa de um grande anúncio de uma nova tecnologia de bateria. Afinal, em setembro, Musk se encontra com os investidores da empresa. A expectativa, então, era de um anúncio bombástico. Aí, de repente, a empresa caiu 22% nos três primeiros dias de setembro. A Apple, que bateu os 2 trilhões de dólares em valor de mercado também em agosto, continuou subindo porque os investidores agora querem acreditar que o 5G vai fazer a empresa vender como nunca. O fundador do Suno Research e investidor de longa data em Apple, Tiago Reis, suspeita que possa haver algum exagero na cotação: o valor da companhia é hoje 40 vezes o que ela deve lucrar no ano. Pelas suas análises em fundamentos da empresa, isso deveria ser de 10 a 15 vezes. Ele não recomenda a compra de ações da Apple, mas também não recomenda vender. Nesta quinta-feira, as ações da Apple caíram 8%. Trilionária do jeito que é, perdeu 180 bilhões de dólares em valor de mercado na quinta, a maior perda em valor da história. Hoje a ação já está caindo quase 6% e a Apple não vale mais os 2 trilhões de dólares.
Amazon, Facebook, Microsoft, Google (Alphabet), Apple, Tesla, Zoom. Em menor ou maior grau, todas as ações tiveram um comportamento parecido no ano. Uma queda em março para uma curva crescente até agora. A dúvida é se a queda desta quinta e sexta-feira é apenas uma correção de preços ou se tem um mercado de urso – como os especialistas chamam os períodos de baixa – a caminho para as empresas de tecnologia. No Brasil, o efeito da queda das techs em Nova York, se refletiu nas perdas das ações das empresas de e-commerce. “Elas são as nossas techs na bolsa”, diz Reis, da Suno Research. São elas hoje que materializam na B3 esta nova onda de investimentos em internet. E foi assim que Magazine Luiza caiu 5%; Via Varejo, quase 7%; B2W, 7,5%; e Mercado Livre, quase 10%. Agora a expectativa está no fechamento do mercado nesta sexta-feira. O urso está à espreita?