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A paternidade da reforma do IR entre Lira e Guedes

Presidente da Câmara imprimiu suas digitais no projeto e utilizou votação para passar recado ao governo de que Jair Bolsonaro depende dele

Por Victor Irajá, Felipe Mendes Atualizado em 3 set 2021, 13h31 - Publicado em 3 set 2021, 11h41

A noite da quarta-feira, dia 1º, foi de vitória para o governo — ainda que o sabor tenha ficado um tanto agridoce. Na ânsia de dar boas novas sobre a agenda de reformas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, saiu de cena e deixou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), como o verdadeiro dono do espetáculo. Como uma espécie de jogador do time que assume também a posição de técnico do time, Lira colocou o ministro no banco de reservas e costurou alianças, inclusive com oponentes do presidente Jair Bolsonaro, assumindo para si o projeto da reforma do Imposto de Renda. Conseguiu um apoio maciço: 398 votos a favor e, apenas, 77 contra. Para conseguir aval dos deputados, fez algumas mudanças no projeto, dando um caráter autoral ao texto.

A ironia é que Lira articulou a votação exatamente com os mesmos que o ministro da Economia havia procurado quando decidiu fazer política por conta própria — um movimento que Lira criticou. Na semana passada, Guedes chegou a pedir uma conversa com o líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), para ganhar adesões para o seu texto. Ao saber do movimento, Lira demonstrou temer a perda do controle da pauta e pressionou Guedes para abandonar a articulação junto à oposição. Guedes, então, recuou, temendo ver o texto vetado pelos partidos do Centrão. Dessa forma, Lira, então, garantiu para a si a paternidade do texto, voltou a campo e, então, num movimento rápido, como vem sendo característico de sua gestão, colocou a reforma à votação. Funcionou. Depois de semanas em que a apreciação da matéria vinha sendo adiada, a blitzkrieg de Lira entrou em ação, e, em poucas horas, no fim da quarta-feira, o texto foi aprovado.

Para que o projeto passasse na Câmara, o presidente da casa aceitou algumas concessões. A principal alteração foi sobre a tributação dos dividendos. Atualmente isentos de impostos, eles estavam se tornando um tema tabu para Guedes, que sentiu a fúria do empresariado brasileiro — muitos deles controladores de empresas de capital aberto. A alíquota proposta no texto-base era de 20%, mas, durante a votação dos destaques, foi reduzida para 15%. A isenção ainda permanece para dividendos de micro ou pequenas empresas, no valor de até 20 mil reais de faturamento. Mas também ficariam isentas empresas que optam pelo lucro presumido, com faturamento até 4,8 milhões de reais. Esse trecho da proposta, segundo especialistas, pode inibir o crescimento das pequenas e médias.

O projeto ainda propõe corte de 25% para 18% no imposto de renda pago pelas empresas. Além disso, a Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) cai de 9% para 8%. O corte total, de oito pontos percentuais, é menor do que os 12,5 pontos previstos numa das últimas propostas, mas maior do que os 5 pontos defendidos pelo governo na primeira versão enviada ao Congresso. Já os Juros sobre Capital Próprio (JCP), que também é uma forma de distribuição de lucros aos acionistas e cuja possível extinção foi alvo de críticas por parte do empresariado, vai de, fato, acabar com a aprovação do texto, que ainda precisa passar pelo Senado. O governo entende esse tipo de arrecadação como uma forma de driblar o lucro tributável. Ou seja, a distribuição de lucros via JCP, que foi criada nos anos 1990 para incentivar investimentos no Brasil, reduziria o valor de imposto a ser pago por uma companhia.

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A grande vitória de Lira, no entanto, foram as mudanças no imposto de renda de pessoas físicas. O presidente da Câmara costurou um ajuste no texto que aumentou a taxa de isenção do IR de 1.904 reais para 2.500 reais, fazendo com que 5,6 milhões de pessoas sejam consideradas isentas. Fora isso, o projeto de lei propôs a eliminação de benefícios fiscais, como a importação de medicamentos, a venda de gás natural e carvão mineral, além da isenção do imposto sobre auxílio-moradia de agentes públicos.

Costura

No fim, a aprovação do texto foi uma vitória do governo, mas sobretudo de Lira, que mostrou para Guedes quem é o verdadeiro dono da bola daqui para frente. Tal qual como o presidente anterior da Câmara, Rodrigo Maia (sem partido-RJ), durante a reforma da Previdência, Lira tinha interesse em cravar as suas digitais no projeto do governo e sair como pai de um grande projeto. “Lira transformou um projeto do Executivo em vitória dele, para que o governo tenha que comer nas mãos do presidente da Câmara”, diz um deputado. Com isso, Guedes fica mais fraco e dependente das ações do aliado. O ministro batia o pé em torno da manutenção da alíquota de 20% para a cobrança de impostos sobre lucros e dividendos. Mas, com a ofensiva para passar o texto, Lira topou reduzir a mordida para 15%.

A mudança foi articulada com o relator da proposta Celso Sabino (PSDB-PA), que precificou a redução. Com a alteração, o relator prevê arrecadação de 11 bilhões de reais no ano que vem e de 33,36 bilhões reais em 2023, como antecipou o jornal O Estado de São Paulo, informação confirmada por VEJA. O desafio central, agora, está no Senado, onde a proposta não deve encontrar facilidades para tramitar. Guedes pode ter aceitado abrir mão do protagonismo nessa matéria, mas convencer os senadores vai exigir mais articulações.

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