O agro é concentrador de renda?
O setor contribui para a geração e distribuição de boa parte da renda no país
O agronegócio brasileiro tem sido alvo de críticas sobre concentração de renda, mas a realidade é diferente do que se imagina. O processo que acontece é o de grande geração de nova renda, onde parte fica com o gerador (produtor rural, por exemplo) mas parte relevante é distribuída a um grande conjunto de pessoas. O crescimento das “agrocidades” (municípios que têm o agronegócio como a principal atividade econômica) exemplifica o poder de geração e distribuição desta renda. Cidades como Sinop (MT), Luís Eduardo Magalhães (BA) e Rio Verde (GO) passaram de pequenos povoados a prósperos centros urbanos, com Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) que superam a média nacional, em apenas algumas décadas. Boa parte deste desenvolvimento foi gerado graças ao empreendedorismo de se produzir lavouras e atividades animais, que gerara nova renda que foi distribuída.
Mais do que produzir, o campo (ou como chamamos, “dentro da porteira”) movimenta a complexa cadeia econômica do agro, que impulsiona diversas indústrias. A cada insumo (máquina, fertilizante, defensivo, vacinas, combustíveis etc.) comercializado, diversos agentes são ativados: fabricantes, técnicos agrícolas, representantes comerciais, empresas fornecedoras de peças, engenheiros, vendedores, pesquisadores e muitos outros. Na fase pós-produção, profissionais da agroindústria processam os produtos agrícolas que serão transportados por profissionais de logística e transporte até os pontos de venda. Ou ainda o produto pode ser comercializado via uma plataforma de e-commerce, que foi feita por um desenvolver de softwares, elo do agro que chamamos de agrosserviços.
Dessa forma, cada investimento na produção agrícola e pecuária aciona empresas e profissionais diversos, que utilizarão essa renda adquirida em outros estabelecimentos locais, como supermercados, restaurantes, farmácias, shopping centers, academias e outros; proporcionando um ciclo de geração e distribuição de renda.
Os números do agronegócio demonstram claramente sua importância para o desenvolvimento nacional. Em 2023, o setor foi responsável por impressionantes 23,8% do Produto Interno Bruto brasileiro, com uma contribuição de R$ 2,58 trilhões, sendo R$ 1,86 trilhão do setor agrícola e R$ 721 bilhões da pecuária. Em termos de empregos, o setor contribui com mais de 28,6 milhões de postos de trabalho, o que representa aproximadamente 26% de todos os empregos no Brasil. Apenas no campo, a renda gerada pela venda dos produtos agropecuários – que chamados de Valor Bruto da Produção ou VBP – deve somar R$ 1,217 trilhão em 2024, com as lavouras projetando R$ 820,2 bilhões e a pecuária R$ 397,47 bilhões. Esses números representam a capacidade do setor de gerar riqueza e distribuir recursos por toda a cadeia produtiva. Imaginem, portanto, o impacto financeiro e de oportunidades (empregos) que a geração desta renda origina.
A contribuição do agro vai além da economia e geração de empregos, pois também ajuda a manter serviços públicos essenciais por meio do pagamento de impostos. Apenas a cadeia da carne bovina brasileira foi responsável pelo pagamento de R$ 145,7 bilhões em impostos em 2023, o que representa aproximadamente R$ 400 milhões por dia. Cooperativas e empresas do setor, como a Cooperativa Alfa em Chapecó (SC), chegam a recolher R$ 1 milhão diários em tributos. Os recursos gerados pelos pagamentos de impostos são fundamentais para financiar serviços como escolas, hospitais, estradas e infraestrutura urbana e rural, transformando a renda gerada no campo em benefícios para toda a sociedade – e novamente empregos nas atividades em questão.
Outro exemplo para falar de distribuição de renda no agro está no sistema cooperativista. Exemplo mundial, esse modelo de distribuição desmistifica a ideia de concentração de renda. São 1.179 cooperativas que reúnem mais de 1 milhão de produtores, permitindo que pequenos agricultores acessem tecnologias e mercados que não alcançariam sozinhos. Nesse modelo, os resultados (sobras) são divididos entre os cooperados em um sistema democrático onde o resultado é distribuído proporcionalmente.
As críticas sobre concentração de renda não se sustentam. O que acontece é o investimento e empreendedorismo de desenvolver uma atividade agrícola e pecuária, que gera renda. Parte desta renda fica com o empreendedor e parte desta renda gerada é distribuída para centenas de agentes ao longo da cadeia produtiva. Se este investimento não tivesse sido feito, renda alguma teria sido gerada.
Marcos Fava Neves é professor Titular (em tempo parcial) da Faculdades de Administração da USP (Ribeirão Preto – SP) e fundador da Harven Agribusiness School (Ribeirão Preto – SP). É especialista em Planejamento Estratégico do Agronegócio. Confira textos e outros materiais em harvenschool.com e veja os vídeos no Youtube (Marcos Fava Neves). Agradecimentos a Vinícius Cambaúva e Rafael Rosalino.