Em coluna na Folha de S.Paulo (29/4/2023), o economista Joel Pinheiro da Fonseca discorreu sobre grupos radicais de direita e esquerda que recentemente se tornaram moderados com o objetivo de entrar no jogo político. O mesmo ocorreu com partidos de esquerda europeus criados na segunda metade do século XIX, que então professavam duas ideias radicais de Karl Marx: o acesso ao poder por uma revolução e a propriedade estatal dos meios de produção. Mudaram de opinião. O poder foi buscado pelo voto popular. E aderiram à ideia da economia de mercado sob regulação do Estado.
Dois casos são interessantes: Espanha e Reino Unido. O Partido Socialista Operário Espanhol, liderado por Felipe González, alterou os estatutos para abolir a regra sobre estatização dos meios de produção. No governo, após uma vitória histórica nas eleições gerais de 1982, González promoveu reformas estruturais que asseguraram o ingresso do país na atual União Europeia. Controlou o déficit público, privatizou estatais e garantiu independência ao banco central.
No Reino Unido, o Partido Trabalhista, no famoso artigo 4º do programa partidário, advogava o controle estatal dos meios de produção. Assumiu o governo no pós-guerra, mas erros de política econômica propiciaram a vitória esmagadora de Margaret Thatcher em 1979. Os trabalhistas foram alijados do poder por dezoito anos, o que os convenceu da necessidade de abandonar ideias arcaicas. Seu líder, Tony Blair, conseguiu revogar o artigo 4º, o que teve forte influência na grande vitória do partido trabalhista britânico nas eleições gerais de 1997. Blair manteve a política econômica de Thatcher, privatizou estatais e concedeu independência ao banco central.
“O maior líder do partido, o presidente Lula, deseduca a sociedade em questões fiscais básicas”
Aqui, o Partido dos Trabalhadores nunca defendeu a ditadura do proletariado. Preferiu chegar ao poder pelo voto popular. Não adotou, todavia, a visão da esquerda europeia na área econômica. Aferra-se a ideias econômicas equivocadas. Não entende o valor da independência do Banco Central. Acredita que o gasto público é o que impulsiona o crescimento, e não a produtividade. Demanda aumentos reais irrestritos do salário mínimo, sem notar seus danosos efeitos na Previdência (dois terços dos benefícios são reajustados pelo mínimo). Em dez anos, os custos acumulados dessa política pública eliminarão todos os ganhos da reforma previdenciária de 2019.
Seu maior líder, o presidente Lula, deseduca a sociedade em questões fiscais básicas. Vive a propagar uma diferença inexistente entre gastos e investimentos como os da educação. Na verdade, ambos consomem recursos escassos. Critica os que o alertam para o abismo. Recentemente, declarou que a discussão sobre déficit público, que se trava no Brasil, não existe em outros países. Isso é verdade, mas não pelo motivo que imagina o presidente. Nos países que levam a sério o Orçamento, o que não é o nosso caso, esse assunto está pacificado. Ninguém questiona a necessidade de controlar o déficit.
O PT e o país ganhariam se Lula e o partido modernizassem seu pensamento econômico.
Publicado em VEJA de 24 de maio de 2024, edição nº 2894