“Lições” de economia de Lula
Falas do presidente estão desconectadas da realidade econômica, deterioram expectativas e deseducam grande parte da sociedade
No café da manhã com jornalistas na quinta-feira, 6, o presidente Lula falou muito sobre economia. Reagiu ao que lhe parece errado, ministrando três lições errôneas. A primeira abordou a Selic de 13,75%, fixada pelo Copom — Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC). Para ele, essa taxa não se justifica, pois não haveria problema de demanda.
Há duas inconsistências nessa afirmação. A primeira é achar que não é papel do BC combater inflação de oferta, como a causada por altas internacionais de commodities, já que não temos controle sobre elas. Ocorre que é preciso evitar seus efeitos secundários. O aumento das cotações de petróleo não influencia apenas os preços de combustíveis, mas também os de transportes e de uma gama de produtos que o utilizam como matéria-prima. Quanto à demanda, há pressões vinda dos serviços, que subiram com o arrefecimento da Covid-19, permitindo o funcionamento dos serviços presenciais. Em 2022, essa inflação atingiu 8%. As projeções para 2022 indicam redução, mas ainda em nível elevado: 6%.
A segunda lição trata da meta de inflação. Para o presidente, se a Selic não assegurou o cumprimento da meta é porque ela está incorreta e deve ser elevada, o que permitiria a queda da Selic. Se Lula quiser, é possível mudar a meta, que é fixada pelo Conselho Monetário, onde o governo tem maioria. A experiência mostra, todavia, que as expectativas dos agentes econômicos se amoldariam ao novo patamar, influenciando ajustes de preços e salários. Como a inflação adquiriria um ritmo mais forte, a Selic atual poderia não ser suficiente para trazer a inflação à meta. Se for assim, o BC seria obrigado a elevar a Selic, ao contrário do que disse o presidente.
A terceira lição refere-se à declaração do presidente do BC, Roberto Campos Neto. Lula se mostrou perplexo com a fala, na qual ele assinalou que o cumprimento da meta de inflação para 2023 (3,25%) exigira elevar a Selic para 26,5%. Isso não é razoável, disse o presidente, “porque a esse nível nenhum empresário se endividaria”. Ocorre que a tal fala é corriqueira. Nos documentos sobre a política monetária, o BC mostra habitualmente a Selic necessária para cumprir a meta de inflação. Nos dias atuais, esse exercício sugere que a meta não será cumprida e, portanto, será preciso mais tempo para alcançá-la. O BC diz, assim, que não dobrará a Selic, dado que seus efeitos afetariam excessivamente o emprego e a renda. Isso é correto. O próprio Campos aduziu que aquela taxa seria impossível. Lula provavelmente ignorou tal afirmação.
O presidente tem poder e legitimidade para criticar o Banco Central e para determinar a elevação da meta de inflação. Não deveria, porém, fazer isso, pois sua fala pode transmitir a ideia de que tenciona forçar o BC a baixar artificialmente a Selic. Muitos imaginarão que o objetivo é eleger um bode expiratório para explicar por que suas promessas de maior crescimento não se materializarão. Tudo isso assusta os agentes econômicos, acarreta ajustes nos ativos financeiros e desancora as expectativas sobre a inflação.
Seria melhor evitar tais lições, pois elas deseducam grande parte da sociedade.