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Matheus Leitão

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Blog de notícias exclusivas e opinião nas áreas de política, direitos humanos e meio ambiente. Jornalista desde 2000, Matheus Leitão é vencedor de prêmios como Esso e Vladimir Herzog

Inflação, ruído político e dólar justificam alta dos juros, diz economista

Roberto Padovani conta a razão de o Banco Central subir a Selic apesar de a economia estar estagnada

Por Matheus Leitão Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 17 mar 2021, 19h09 - Publicado em 17 mar 2021, 18h56

O economista-chefe do Banco BV, Roberto Padovani, diz que a reunião desta quinta-feira, 17, do Banco Central, que elevou fortemente os juros em 0,75%, teve um paradoxo. A economia está estagnada, mas a inflação está acima da meta. Por isso, o nome que começa a ser usado pelos especialistas é “estagflação”.

Padovani acredita que a decisão de subir os juros foi correta, mesmo nessa situação. Entre os vários complicadores da economia brasileira está a falta de confiança no presidente Jair Bolsonaro. “Ele cria muitos conflitos e ao mesmo tempo, com a interferência na Petrobras, lembrou o período Dilma na economia”.

Outra dificuldade do Banco Central é que ele passou a ter autonomia na lei, mas precisa provar que é autônomo. Diante de tanta pressão inflacionária, desconfiança, ruídos, alta do dólar, o BC tem que subir os juros, apesar da economia estar fraca.

Entre as várias dificuldades da economia brasileira, diz Padovani, está ainda o seguinte: mesmo se a alta do PIB esse ano for de 3,5% o país não estará crescendo. Será efeito estatístico da comparação com a média do ano passado. “Mesmo assim tem muito economista que está prevendo um número como 2.5%, o que na prática estará sendo um resultado negativo”, explicou à coluna.

Leia abaixo as explicações do economista para as muitas complicações da economia brasileira. E também como é difícil a decisão que o Banco Central toma de subir os juros.

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Veja – Por que subir juros se a economia não está crescendo?

Roberto Padovani – Porque basicamente a inflação está muito alta. O Banco Central no Brasil tem essa metodologia: ele olha não só a inflação corrente, mas as expectativas de inflação. A alta de juros hoje não vai fazer muita diferença, mas sim daqui a nove meses, um ano. O que os especialistas estão dizendo é que, lá na frente, a inflação vai estar bem acima da meta. A meta é 3,75%, mas a inflação pode fechar o ano em 4,6%. Então o BC tem que reagir a isso.

Veja – Que efeito a alta de juros terá na inflação, já que estamos falando de aumento em alimentos (que não adianta subir juros para contê-los), e problemas de aumento de matéria prima, como aço, plástico, gás para a indústria. Adianta subir juros se existem pressões de aumento de preços que não serão afetados?

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Roberto Padovani – Quando você sobe a taxa de juros, o canal de transmissão de política que ajuda a controlar os preços, é o câmbio. Então quando você sobe o juros, o câmbio tende a ceder um pouco, o dólar cai. Se o dólar cai, reduz os custos das empresas. E, ao reduzir os custos das empresas, você repassa menos. Então o canal de transmissão de política econômica é o câmbio. Mas adianta com commodities? Não adianta. Você não vai reduzir o preço do aço se subir os juros. Mas você inibe o repasse. Então a preocupação do Banco Central não é que a inflação não suba por conta desse choque de câmbio e commodities. É  que seja controlado o que os economistas chamam de agente secundário. Então, é para que os repasses desses recursos sejam menores. Mas por que subir os juros, se a economia está fraca? É uma baita questão. Há uma expectativa que a economia retome – eu pessoalmente acho que ela vai andar  -, mas a dúvida não é saber se vai andar. O que a gente não sabe medir direito é como será o efeito da segunda onda sobre o crescimento. Tem dois argumentos hoje que deixam o BC numa situação complicada, que é um choque do câmbio e das commodities, e por outro lado economia fraca. Então, o que pesa mais? Pela tradição brasileira, tende-se a olhar mais o efeito da inflação. Mas se subir muito, a economia perde força.

Veja – Existe mais algum ponto que pesou para a decisão de hoje?

Roberto Padovani – Uns outros pontos que pesam a favor de uma alta agora: as incertezas globais, e como os Estados Unidos vão agir em relação à economia. Ou seja, os fatores externos. Mas eles são menores. Tem a parte que é mais importante, que é local. A questão da Petrobras consolidou uma dúvida que todo mundo tinha em relação ao governo Bolsonaro. Ele é ruidoso, a estratégia política de confronto dele sempre atrapalhou a condução da política econômica. A Reforma da Previdência, por exemplo, deu certo, mas não por conta do Bolsonaro, que deu susto o tempo todo. Temos alguns exemplos. Teve um episódio no ano passado quando o Bolsonaro queria criar um novo projeto social. No final, teve toda uma rusga com o Paulo Guedes e plantou-se a dúvida se o ministro ficaria ou não. Será que vai ter mais gasto público? Isso aumenta a dívida do governo. Ou seja, outra dúvida. E neste ano agora teve o episódio da PEC emergencial, que necessita de contrapartidas para controlar, ao longo do tempo, as despesas obrigatórias. Mas o próprio Bolsonaro foi contra. Então, o mercado ficou confuso: o presidente quer ou não quer controlar a dívida. Aí veio o episódio da Petrobras, e ficou esse sentimento de que ele estava adotando a mesma política que a Dilma adotou. Quando percebeu-se que o perfil da gestão da Petrobras era o mesmo de controlar preço, o mercado entendeu que todos os sustos eram reais. Ou seja, o Bolsonaro não está tão comprometido com a agenda liberal. Não importa se é ou não é. O fato é que há uma desconfiança instalada. Depois veio o Lula elegível. O mercado tentou entender qual seria a reação do Bolsonaro. Ele vai ficar mais populista ou menos populista preocupado com a eleição? Não importa. O fato é que, quando há muitas incertezas e muita indefinição, junto com o cenário externo ruim, isso acontece. E ainda tem as críticas em relação à gestão sanitária e à gestão da pauta do meio ambiente. A leitura é muito ruim de Brasil e o dólar disparou por conta da falta de credibilidade do governo.

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Veja – Para quem é leigo: há um dilema político do Banco Central na primeira reunião após a aprovação da autonomia?

Roberto Padovani – O Banco Central está mostrando agora que é responsável, que sobe juros e que controla os gastos. Uma parte disso é “reancorar” as expectativas. É uma questão de reputação institucional.

Veja – Dá pra chamar o que estamos vivendo de estagflação?

Roberto Padovani – Sim, dá para dizer isso. A gente vai ter uma economia muita fraca no primeiro trimestre. Talvez tenha uma queda no segundo. Estamos com expectativa de crescimento de 3,5%. Mas se você crescer zero, crescer nada, a média deste ano comparada com a do ano passado, dá um crescimento de 3,5% porque a base é muito baixa. Então, quando se fala que a economia vai crescer 3,5% vai ser zero. E tem muita gente boa dizendo que, na verdade, vai ser 2 ou 2,5%. Então é um cenário de retração. O curioso é que o cenário deveria jogar os preços para baixo, mas por conta do choque no câmbio e das commodities, o preço tá subindo. No final da história, a inflação vai cair. Mas se você não dá sinais que está disposto a controlar a inflação, acaba subindo. Um fator é pelas expectativas mesmo. Mas é uma questão paradoxal. Você tem que subir juros para conter a inflação, enquanto tem uma economia fraca. Então, respondendo sua pergunta: a gente pode dizer que está vivendo uma estagflação. Mesmo que não haja uma recessão, a economia cresce muito pouco.

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