Assine VEJA por R$2,00/semana
Imagem Blog

Maílson da Nóbrega Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Por Coluna
Blog do economista Maílson da Nóbrega: política, economia e história
Continua após publicidade

O absurdo das emendas do relator

Recursos desse tipo dificilmente têm paralelo

Por Maílson da Nóbrega 29 ago 2021, 08h00

Herdeiro de tradições patrimonialistas portuguesas, o Brasil nunca levou a sério o Orçamento, a lei econômica mais importante do país, a qual estabelece as prioridades fiscais. Sua origem vem da Carta Magna imposta em 1215 ao rei inglês pelos barões feudais. Continha, entre outras, regras para criar impostos. Foi o começo da jornada que levaria à democracia moderna.

Aqui, aceita-se que o Orçamento é “autorizativo”, isto é, o governo cumpre apenas o que lhe convém, além de despesas obrigatórias como as previdenciárias e de pessoal. Isso não existe em países desenvolvidos, onde a lei orçamentária tem caráter impositivo. No passado, os parlamentares usavam o Orçamento para dar nome a ruas e promover funcionários.

Havia dois Orçamentos, um aprovado pelo Congresso — a Lei Orçamentária Anual (LOA) — e outro pelo Poder Executivo, o Orçamento Monetário (OM). A LOA era executada por um departamento do Banco do Brasil (BB). A gestão da dívida pública interna e externa cabia a gerências do Banco Central (BC). Dois tributos — o IOF e o imposto de exportação — integravam o OM, que incluía subsídios, custeio de órgãos públicos e até mesmo gastos como o da construção da Ponte Rio-Niterói. Fora do Orçamento, o BB concedia crédito com recursos públicos, mediante saques sem limites na “conta movimento” mantida no BC.

Reformas dos anos 1980 eliminaram essas aberrações. Remanesce, porém, a esquisita ideia do orçamento “autorizativo”. Criou-se a Secretaria do Tesouro Nacional, que assumiu funções fiscais realizadas pelo BC e pelo BB. A Constituição de 1988 aboliu norma do regime militar que proibia o Congresso de emendar o Orçamento.

Continua após a publicidade

“Aqui, aceita-se que, quando se trata do Orçamento, o governo cumpra apenas o que lhe convém”

A muito elogiada Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), de 2000, foi desmoralizada por Tribunais de Contas dos estados, que sancionaram manobras para esconder gastos de pessoal. O Supremo Tribunal Federal autorizou o descumprimento, perante a União, de obrigações financeiras estaduais.

O desprezo pela LRF foi lamentável, mas não se poderia admitir que viria um absurdo histórico e institucional como as emendas do relator-geral do Orçamento. Elas são feitas pelo parlamentar que prepara o parecer final da LOA. No Orçamento de 2021, foram 29 bilhões de reais, representando 58,9% de todas as emendas e 33,7% do investimento federal.

Continua após a publicidade

Dificilmente as emendas do relator têm paralelo no planeta. Elas transformam um deputado ou um senador em executor do Orçamento, função exclusiva do Poder Executivo mundo afora há mais de três séculos. Pior, os recursos podem ser liberados para financiar projetos que não seguem regras prudenciais sobre prioridade, justificativa e viabilidade da aplicação dos recursos. Surgiu, assim, um orçamento paralelo e sem transparência.

Não à toa, há indícios de corrupção no uso desses recursos para a compra superfaturada de tratores. Por suas disfunções, é preciso discutir as emendas do relator com vistas à sua eliminação. Elas não foram previstas na Constituição.

Publicado em VEJA de 1 de setembro de 2021, edição nº 2753

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.