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Obsessão por energia levou Murilo Ferreira a Dilma

A presidente era defensora ávida do carvão mineral, enquanto o executivo conseguiu implantar a fonte energética dentro da Vale

Por Da Redação
6 abr 2011, 10h22

Em 2004, durante a inauguração da mina de cobre de Sossego, em Canaã dos Carajás (PA), o novo presidente da Vale, Murilo Ferreira, e a presidente Dilma Rousseff tiveram a primeira interação pública. Ele, então diretor de Energia da mineradora, discursava em um pequeno púlpito, que contava, inclusive, com a presença de Roger Agnelli como espectador. Ela, como ministra de Minas e Energia com pouco mais de um ano no cargo, sentiu-se contrariada com uma das ideias expostas por Ferreira sobre a distribuição de energia no Brasil. No ápice da ira, Dilma não se conteve e interrompeu o discurso, pedindo a palavra. O executivo ficou calado e a ministra prosseguiu, defendendo seu ponto de vista.

Poucos imaginariam que, sete anos depois, a ministra implicante seria presidente da República e o diretor, o presidente da segunda maior mineradora do mundo – por indicação indireta, justamente, do Planalto. O nome de Ferreira, que havia sido definido há mais de um mês no seio do conselho de administração da Vale, causou surpresa no mercado. Contudo, ainda mais surpreendente foi o fato de o executivo ter sido o candidato escolhido pela presidente; desbancando Tito Martins, atual presidente da Vale Inco e o nome mais cotado para assumir o posto. Apesar da discreta aproximação, o envolvimento de Ferreira e Dilma com o setor de energia fez com que se conhecessem e se dedicassem a projetos similares – ele para a Vale, ela para o Brasil.

Interesse por energia – Administrador de empresas formado pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), Murilo Ferreira é, definitivamente, um conhecedor da mineradora. Entrou na companhia antes da privatização, na década de 1980, mas não durou muito. Voltou em 1998, como diretor financeiro e comercial das operações de alumínio (incluindo a Albras). Entre todos os metais, este é o que exige maior consumo de energia para ser produzido, o que fez com que Ferreira se tornasse, no início desta década, o diretor da Vale com maior interesse em fontes alternativas. “Um interesse que beirava a obsessão”, afirma um executivo que o conheceu na época. No mesmo período, Dilma entrava no Planalto como ministra de Minas e Energia, com o grande desafio de rearranjar a estrutura do setor elétrico. Sua principal tese era justamente a ampliação da geração e a diversificação da matriz brasileira.

Sob o comando de Murilo Ferreira na área de energia, a Vale expandiu de forma expressiva sua atuação em hidrelétricas, com os projetos de Porto Estrela, Aimorés, Capim Branco 1 e 2, entre outros. Ele também se encarregou de ampliar a utilização de outras fontes, como gás natural e carvão mineral. Com isso, a mineradora chegou em 2009 produzindo 40% da energia que consumia, sendo que, três anos antes, essa participação não chegava a 20%.

O uso do carvão mineral foi uma das maiores bandeiras de Dilma durante o período em que foi secretária de Minas e Energia no Rio Grande do Sul, no governo de Olívio Dutra (PT). O estado é o maior produtor do país e abriga as termelétricas de Candiota 1, 2 e 3. No início deste ano, a primeira visita oficial da presidente ao estado foi prevista justamente para inaugurar Candiota 3, que estava no papel há 23 anos e só foi iniciada em 2006, sob o comando dela. No entanto, a presidente cancelou a visita dois dias antes, frustrando o governo local.Trata-se da maior obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na região Sul, com orçamento de 1,3 bilhão de reais.

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Na Vale, Ferreira era o principal entusiasta do carvão mineral. Tanto que conseguiu fazer com que o produto fosse adotado como fonte de energia nas principais indústrias de alumínio do grupo: a Albras e a Alunorte. Essa harmonia de ideias, além das constantes visitas a Brasília, acabaram aproximando o executivo e Dilma – apesar do contato desagradável ocorrido em Canaã dos Carajás. “A Dilma foi uma ministra que se aproximou muito das mineradoras. Naquela época, não era só a Vale que estava próxima do ministério. Todos queriam ter uma relação com ela”, afirma o presidente de uma mineradora que preferiu não se identificar.

Um homem político – A personalidade do novo presidente da Vale também foi crucial para estreitar o relacionamento com a ministra. Um executivo do setor elétrico, que chegou a negociar com ele em meados de 2001, afirma que poucas vezes viu alguém com tanta capacidade de negociação. “Ele sabia jogar. Se não conseguia o que queria, sempre usava o argumento ‘mas a Vale é uma grande geradora de impostos’, entre muitos outros, para pressionar a outra parte a ceder”, afirma o executivo.

Tal característica fez com que Ferreira acumulasse, com o passar dos anos, diversas funções no grupo e fosse considerado “os olhos e ouvidos” de Roger Agnelli fora do Brasil. Em 2004, ele iniciou a aproximação com a mineradora canadense Noranda, alvo de compra da Vale naquele ano, mas que acabou sendo vendida a uma concorrente chinesa. Em 2006, foi a vez da Inco, que acabou se convertendo na maior aquisição de uma companhia estrangeira realizada por uma brasileira – a Vale pagou 13 bilhões de dólares pelo ativo. Ferreira, que comandou a operação, foi transferido ao Canadá no ano seguinte para presidir a empresa, e só saiu em 2009, quando pediu demissão. Segundo um ex-diretor da mineradora, Ferreira teve um início de infarto em um voo de volta ao Brasil, e decidiu parar e montar, junto com seu colega de diretoria, Gabriel Stoliar, a Studio Investimentos – gestora de recursos localizada no Rio. Sua decisão de sair também foi potencializada por desentendimentos com os diretores da Vale nas negociações de compra da mineradora suíça Xstrata, que acabou não acontecendo. Ao voltar para a empresa, Ferreira terá de lidar com os desafetos ou montar outra equipe. “Ele certamente irá formar o time dele na direção”, diz um ex-diretor.

Mesmo longe da Vale, o contato com o Planalto não foi perdido. “Ele sabe se relacionar muito bem, apesar de ser extremamente discreto. Tem uma habilidade imensa em lidar com situações de conflito”, afirma um executivo que trabalhou na companhia no mesmo período que ele. “É um típico mineiro”, diz. Nascido em Uberaba (MG), Murilo Ferreira é filho do falecido médico pediatra e pesquisador da Doença de Chagas, Humberto de Oliveira Ferreira, e de Nívia Pinto Ferreira – ambos figuras ilustres na cidade. Seu irmão, Roberto, é engenheiro e vive em Belo Horizonte. Murilo vive no Rio de Janeiro com a esposa, Fernanda, e a filha, Luiza, de 20 anos.

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