Novos hábitos de consumo
NOVOS ESSENCIAIS
Os hábitos e as decisões que emergiram com a pandemia parecem condicionar também às expectativas de consumo no futuro. A higiene pessoal e de casa continuará sendo uma prioridade: 87% dos entrevistados apontaram que pretendem consumir mais ou as mesmas quantidades de produtos para tratar da casa e da higiene.
As categorias ligadas aos cuidados pessoais ganharão relevância no pós-COVID, uma vez que 85% dos entrevistados dizem que irão aumentar ou manter os gastos com esses itens. Ao mesmo tempo, 72% acreditam em aumento ou manutenção do nível de consumo de serviços de cuidados pessoais e 75% pretendem ampliar ou manter o consumo de itens de beleza e cosméticos, o que reflete uma atenção do brasileiro à sua aparência e ao “sentir-se bem”.
No pós-pandemia, um novo estilo de vida, centrado na casa, deve se consolidar. Além do consumo de alimentos frescos, em que 89% dos consumidores têm em vista aumentar ou manter seus gastos atuais, o serviço de entrega de kits de comida será demandado por 64% dos brasileiros e 62% comprarão refeições preparadas em uma loja para consumo posterior. Mesmo a compra de alimentos congelados mostra potencial, com 72% dos entrevistados projetando aumento ou manutenção do atual patamar de consumo.
É preciso levar em conta que essa preferência por uma vida mais focada na casa se dá em um momento de recomposição da renda familiar. Por isso, categorias ligadas ao entretenimento e consumo fora do lar ficam em segundo plano: 33% dos entrevistados dizem que irão reduzir os gastos com atividades recreativas fora de casa, 33% esperam gastar menos durante férias e feriados e 35% irão cortar gastos com academias de ginástica. [Figura 7]
Vale a pena ressaltar que existem diferenças significativas nos padrões de consumo de acordo com a faixa etária dos entrevistados. O público da Geração X (consumidores entre 45 e 60 anos), por exemplo, tem uma disposição ainda maior em consumir mais ou a mesma quantidade de alimentos frescos (89%), itens de limpeza e higiene doméstica (87%) e itens de cuidados pessoais (84%). Por outro lado, 35% dos integrantes desse grupo afirmam que pretendem gastar menos com férias e viagens no futuro próximo, 40% consumirão menos em serviços de delivery de restaurantes e 30% darão menos presentes ou doações para entidades assistenciais. [Figura 8]
Já entre os Baby Boomers (consumidores acima dos 60 anos), o consumo de mais alimentos frescos (ou da mesma quantidade) é apontado por 89% dos entrevistados. O uso de itens de limpeza e higiene doméstica chega a 86%, com aumento ou manutenção dos níveis atuais, e o uso de itens de cuidados pessoais (87%) também fica acima da média. Por outro lado, 24% dos integrantes desse grupo estão dispostos a gastar menos com produtos e serviços de construção e reforma da casa, 40% reduzirão o uso de academias de ginástica e 30% planejam diminuir gastos com férias e viagens. [Figura 9]
Esses recortes indicam que, para uma parcela considerável da população, especialmente aquela com maior poder aquisitivo, existe um movimento claro de mudança de prioridades. Ficam em segundo plano as experiências externas (restaurantes, viagens, passeios) e ganham relevância os cuidados com aspectos mais básicos da vida, como a higiene pessoal e doméstica. A casa ganha relevância como espaço de interação pessoal ou remota. Com a possibilidade de novas ondas de infecção, o consumidor ainda se mostra pouco afeito a retomar padrões de comportamento e de consumo pré-crise.
O CONSUMO EM UM AMBIENTE DE REDUÇÃO DE RENDA
A migração do consumo outdoor para dentro de casa não se dá somente pelo medo de contaminação. Existe um forte fator financeiro nessa mudança de comportamento. A pandemia trouxe uma redução significativa da renda da população: 27% tiveram uma perda de até 25% em seus ganhos e 35% apresentaram uma redução de 50% ou mais. Apenas 1% da população teve aumento de renda durante a crise e 36% conseguiram manter seus níveis pré-pandemia.
Esses números, sobre um cenário macroeconômico que já apresentava um volume de desemprego próximo dos recordes históricos, crescimento do PIB na casa de 1% por três anos consecutivos e um aumento do volume de trabalhadores informais, reforçam a necessidade de um comportamento mais comedido do consumidor. Mais de 50% dos brasileiros que tiveram redução salarial por conta da pandemia esperam adquirir marcas mais baratas no futuro. Mesmo entre a população que teve sua fonte de renda inalterada, 28% esperam consumir produtos mais baratos, o que aponta para uma mudança de prioridades e de alocação de recursos, em conformidade com um novo estilo de vida. [Figuras 10 e 11]
Com isso, ocorre uma mudança de prioridades dos consumidores na decisão de compra, com forte influência do cenário econômico. Para 78% dos entrevistados, o preço se tornou um atributo mais importante na tomada de decisão. Na outra ponta, o luxo se tornou menos importante para 59% dos entrevistados e a marca perdeu relevância para 23%. A pressão financeira é clara.
Ainda assim, outros fatores se tornaram mais relevantes na decisão de compra dos consumidores. A qualidade do produto/serviço, por exemplo, ganhou importância para 74% dos entrevistados, enquanto a saudabilidade − tendência à alimentação e a hábitos saudáveis − tornou-se mais relevante para 76%. Com as restrições à circulação de pessoas e o aumento da disposição de compra em canais on-line, a possibilidade de entrega dos pedidos ganhou importância para 68% dos consumidores e a disponibilidade dos produtos, para 68%. [Figura 12]
A mudança na relevância dos diversos atributos na decisão de compra dos consumidores indica oportunidades e ameaças para marcas estabelecidas e novos concorrentes. Ao mesmo tempo em que o preço ganha relevância, a qualidade continua em alta, desafiando as empresas a oferecer propostas de valor que aliem esses dois componentes e deixem em segundo plano aspectos que tradicionalmente são explorados pelas marcas, como a força de suas marcas.
A questão da saúde e do bem-estar pode ser um caminho a ser explorado por marcas que consigam se posicionar nesses atributos. O estudo EY Future Consumer Index mostra que 46% dos consumidores consideraria pagar um prêmio de preço em itens que tragam esses benefícios. Itens de alta qualidade podem custar um pouco mais para 48% dos entrevistados, enquanto 45% pagariam mais por itens mais sustentáveis.
Neste momento, o consumidor claramente mostra estar disposto a mudar seu comportamento na direção de produtos, serviços e marcas que mostrem ter impacto positivo sobre o meio ambiente e a sociedade. Marcas que contribuem para a comunidade poderiam cobrar mais por seus produtos, na opinião de 37% dos entrevistados. Já 36% deles aceitam pagar mais por produtos de fornecedores certificados/naturais/orgânicos. [Figura 13]
Por outro lado, itens tradicionalmente considerados dignos da cobrança de um prêmio perdem espaço neste momento. Somente 9% dos consumidores aceitam pagar mais por alimentos e bebidas de luxo, 20% pagariam mais por produtos personalizados e 16% pela conveniência de comprar rápido ou de receber rapidamente suas compras.
UMA VISÃO DE LONGO PRAZO
No pós-pandemia, grande parte dos benefícios considerados importantes no atual momento irão se manter para os próximos anos. Quando perguntados sobre o que deverão valorizar no futuro, 60% dos consumidores apontaram a qualidade dos produtos, seguida pela saúde (47%). Em uma outra faixa de respostas, sustentabilidade (33%), responsabilidade social (30%) e segurança financeira (21%) foram considerados itens importantes.
Embora essa priorização reflita algumas das mudanças trazidas pelos efeitos da COVID-19 sobre a vida pessoal, ela também parece indicar uma nova ordem de valores, que pode ter efeitos importantes sobre as relações de consumo nos próximos anos. [Figura 14]
É importante destacar que atributos como personalização (5%), autenticidade (7%), privacidade (7%), velocidade (7%) e escolha (7%) foram pouco citados. Quando analisados em conjunto com outros dados do EY Future Consumer Index, esses resultados não indicam que esses aspectos perderam prioridade. Na realidade, eles são considerados tão essenciais que já não representam oportunidade de diferenciação.
De acordo com 73% dos entrevistados, a autenticidade e a honestidade do que está sendo oferecido são fatores extremamente importantes que influenciam a decisão de compra. Somente 1% dos consumidores não dão importância a esses aspectos, demonstrando que, atualmente, marcas que não se comunicam de forma sincera perdem espaço entre as opções de escolha dos clientes. Os crescentes casos de boicote às marcas nas redes sociais indicam uma menor tolerância dos consumidores a discursos pouco embasados na realidade. [Figura 15]
Comparado com a média global, o brasileiro pode ser considerado bem mais exigente quanto a esses fatores, visto que, no geral, 51% dos entrevistados consideraram autenticidade e honestidade como item extremamente importante, uma diferença de mais de 20 pontos percentuais. Por outro lado, o “boca a boca” é considerado extremamente importante na decisão de compra de apenas 37% dos brasileiros, enquanto para os chineses esse índice sobe para 60%.
Em um dado que aponta oportunidade para negócios locais, princípios éticos, garantia de origem e certificação de produtos são atributos considerados extremamente importantes para a decisão de compra de mais de 60% dos consumidores. A transparência nas informações a respeito da cadeia de suprimentos foi considerada importante por 62% dos consumidores. Considerando o conjunto de respostas “muito importante” e “importante”, 96% dos brasileiros julgam que questões ligadas à ética, à responsabilidade social e à garantia de origem são relevantes para a tomada de decisão de consumo.
Esses são itens que já povoam o vocabulário do consumidor, embora estejam sujeitos no atual momento às limitações orçamentárias trazidas pela crise. Quanto mais esses atributos ganham importância na decisão de compra, mais decisões precisam ser tomadas em relação à substituição de marcas que não compartilham esses princípios, ou ao consumo de produtos com um prêmio de preço – o que força decisões de trade-down em outras categorias. [Figura 16]
DIFERENÇAS ENTRE GERAÇÕES
Quando comparamos as diferentes gerações de público no Brasil, percebe-se uma diferença sensível entre os atributos valorizados pelos mais novos e mais velhos. Embora todas as gerações considerem que a autenticidade e a honestidade são fatores extremamente importantes, os motivos ligados ao uso de tecnologia perdem influência quanto mais idosa é a população. Assim, 59% dos Millenials consideram os reviews on-line como extremamente importantes, índice que cai para 33% entre os Baby Boomers. As mídias sociais são um instrumento extremamente importante de decisão de consumo para 38% dos Millenials e apenas 15% dos Baby Boomers, uma diferença de 23 pontos. [Figura 17]
Os números mostram, porém, que o impacto dos meios digitais no comportamento dos consumidores de mais idade não deve ser descartado, porém, a publicidade tradicional (22%) continua como sendo um meio de mídia relevante para esta faixa etária. Os mais idosos consideram também os reviews on-line (42%) praticamente tão importantes quanto o tradicional “boca a boca” (43%). O público acima de 60 anos também é digital, embora não utilize tecnologia com tanta intensidade quanto os mais novos.