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O que está acontecendo com o dólar: movimento técnico e uma dose de dúvidas

Moeda americana rompe níveis históricos enquanto já acumula valorização de mais de 20% sobre o real no ano

Por Juliana Machado 29 nov 2024, 14h07

Ao longo das últimas semanas, conforme se aproximava a divulgação do pacote fiscal do governo, o mercado foi aos poucos embutindo cada vez mais o nervosismo dos investidores com o que viria pela frente, com queda da bolsa de valores e avanço do dólar ante o real. Quando colocado na mesa de fato, o pacote levou agentes da economia a uma conclusão: as propostas de contenção de gastos existem, mas não só elas não parecem ser suficientes para dar ao Brasil uma trajetória civilizada na dívida, como vieram acompanhadas de aumento de tributos – um tema que, definitivamente, não era desejado.

A consequência se vê materializada no movimento dos mercados na semana, sobretudo no dólar. Hoje, especificamente, os investidores aproveitam para embolsar lucros e aliviar a pressão, com o dólar cedendo 0,52% e se acomodando na faixa dos R$ 5,98. Mas nada disso significa trégua. A cotação da moeda americana chegou a encostar em R$ 6,10 na abertura dos negócios, maior nível já registrado na história, após romper ontem os R$ 6. Na semana, caminha para acumular alta de mais de 3%. No ano, avança impressionantes 23%.

Conforme gestores e operadores de câmbio consultados por VEJA, por trás do movimento está um “mix” de fatores. Do ponto de vista técnico, jargão do mercado para descrever movimentos de curto prazo que têm mais correlação com preços do que fundamentos econômicos, o mercado foi inundado de operações de “stop”, ou seja, ordens automáticas de venda quando a cotação do ativo atinge um determinado patamar. Conforme o dólar avançou na semana – em especial nos R$ 6 –, isso foi motivando movimentos como esse, que se avolumam e acabam retroalimentando a direção dos preços.

“Podemos dizer que aconteceu um ‘stop’ com quem apostava em um pacote fiscal mais robusto e havia montado posições de venda do dólar”, afirma reservadamente um operador de câmbio de uma grande corretora. “Claro que, quando tem movimento de ‘stop’, existe o exagero.”

Na visão desse interlocutor, com o pacote se mostrando menos crível do que o esperado, quem estava neutro “passou a ser mais pessimista” e quem estava otimista desfez o chamado “short”, ou posição vendida, isto é, que ganha na queda de um ativo – no caso, o dólar. “Teve ‘stop’ no câmbio e nos DIs (mercado de juros futuros da B3).”

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Mas a verdade é que o nível de preços mudou de lugar, refletindo a frustração de economistas, analistas, gestores e outros tantos participantes do mercado com o tratamento do problema fiscal do país. O grande ponto é que, na visão desse grupo, o governo está com dificuldade de emplacar a mensagem de que tem de fato compromisso em atacar excessos de gastos.

“Estamos perdendo a âncora fiscal”, diz um gestor de um grande fundo multimercado, que pede para não ser identificado. “Isso afeta as variáveis. Mais inflação, mais depreciação do real. Vira uma tendência.”

Na visão de vários gestores ouvidos, a deterioração fiscal leva a efeitos como o dólar em um novo nível “justo”, perto dos R$ 6, e a um movimento de queda da procura por ativos mais arriscados, o que prejudica a bolsa, ao menos no médio prazo. Resta a dúvida se, no decorrer do ano que vem, novos desgastes do projeto fiscal do governo vão piorar ainda mais a percepção do mercado ou se alguma nova medida poderá remediar o mau humor.

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