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Marina Silva: ‘Vamos colocar um freio no avanço do bolsonarismo’

Ex-ministra durante o primeiro governo de Lula, Marina reaproximou-se do petista e prometeu colaborar com a retomada da agenda socioambiental para o país

Por Felipe Mendes Atualizado em 15 set 2022, 12h59 - Publicado em 15 set 2022, 08h04

Candidata à Presidência em três ocasiões e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva sabe que para governar o país é necessário fazer concessões. À frente da Rede Sustentabilidade, a agora candidata a deputada federal decidiu atender a um pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em favor de uma coalizão que seja capaz de fazer frente a Jair Bolsonaro (PL) nas eleições presidenciais deste ano, deixando para trás rusgas e feridas mal cicatrizadas em relação ao Partido dos Trabalhadores (PT). Em entrevista a VEJA, Marina disse que quer ajudar Lula a “recuperar o protagonismo do Brasil na agenda de enfrentamento às mudanças climáticas” por meio, sobretudo, de uma política de desmatamento zero e agricultura de baixo carbono. “O documento entregue por mim ao ex-presidente Lula se chama ‘Resgate atualizado da agenda socioambiental perdida’, uma agenda que vinha dando certo desde quando se iniciou, em 2003. Ninguém melhor do que Lula para resgatá-la”, afirmou ela, que desconversou quando questionada se aceitaria ser ministra do Meio Ambiente novamente em um eventual governo do petista.

A senhora rompeu com o PT no passado e chegou a fazer duras críticas ao ex-presidente Lula. Como se deu essa reaproximação? Muitas pessoas torciam para que isso acontecesse. Eu acho que aconteceu no tempo que foi necessário, e foi algo que partiu da minha decisão de dizer publicamente que estava aberta ao diálogo em cima de compromissos programáticos. E o próprio presidente Lula se dispôs a esse diálogo programático. Obviamente, ele que fez o convite para que pudéssemos conversar, mas eu já havia dito que estava aberta a falar sobre ideias, projetos e propostas.

Como a senhora classifica a importância desse movimento? Essa reaproximação política é muito importante para o momento em que nós estamos vivendo, ainda mais tratando-se da agenda de proteção ao meio ambiente e de desenvolvimento sustentável. O compromisso assumido pelo ex-presidente Lula foi um compromisso com a sociedade brasileira, não apenas comigo. É disso que o Brasil está precisando, de que a gente possa, neste momento difícil e de banalização do mal, fazer um esforço para derrotar o Bolsonaro e, mais do que isso, pôr um freio no avanço do bolsonarismo no seio da nossa sociedade.

Quais seriam os pontos que a senhora destacaria dentro desse conjunto de ideais firmado com Lula? É um compromisso de ter uma política ambiental que seja transversal para o enfrentamento do desmatamento, das mudanças climáticas, dos graves problemas que estão hoje degradando o patrimônio ambiental brasileiro e ameaçando o equilíbrio global do planeta. É um compromisso de recuperar e fortalecer o Sistema Nacional do Meio Ambiente (Sisnama), que foi completamente destruído no governo Bolsonaro, estabelecendo que a política ambiental será feita mediante transparência, controle e participação social, recuperando as atribuições do Ibama e de outros órgãos de gestão ambiental.

O candidato pretende adotar uma transição energética mais assertiva caso venha a ser eleito? Essa é uma agenda que, no que tange à mobilidade, envolve uma ação em parceria do governo federal com os governos estaduais e municipais. O problema da mobilidade urbana é que ela é um vetor de emissão de CO2, mas também um vetor de graves problemas de saúde pelos poluentes que advêm desta imensa quantidade de veículos que há no país. Existe uma necessidade de termos segurança energética, mas indo para fontes renováveis, como solar, biomassa e eólica, nos casos em que for possível fazer essa geração com sustentabilidade. É um olhar mais amplo e, como o próprio ex-presidente disse, a política ambiental brasileira será transversal, perpassando pelos diferentes setores, da agricultura ao transporte, do transporte à infraestrutura, e assim por diante.

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A senhora considera que houve um retrocesso na política ambiental durante a gestão de Bolsonaro. Qual seria o tamanho desse retrocesso? O próprio Lula, quando ele estava se manifestando sobre o documento, falou claramente que teremos tolerância zero com essa criminalidade que foi incentivada e aumentada de forma terrível no governo Bolsonaro, com a destruição da Amazônia e dos outros biomas, inclusive dizendo que também será tolerância zero com o garimpo criminoso nas terras dos povos indígenas. A gente precisa fazer o enfrentamento de tudo isso como um passo importante para recuperar o que deu certo no passado, como o plano de prevenção e controle ao desmatamento na Amazônia.

Mas qual deverá ser a prioridade para o meio ambiente em um eventual governo Lula? Recolocar em funcionamento o fundo amazônico, como, inclusive, já está no próprio plano de governo do ex-presidente. É preciso ter uma recomposição orçamentária do Ibama e do ICMBio, trazer o serviço florestal de volta para o Ministério do Meio Ambiente, e usar a Embrapa para a proteção das florestas brasileiras. Então, é utilizar da forma correta as estruturas que nós já temos e que foram sucateadas e desmontadas no governo Bolsonaro, inclusive, trazendo o Exército brasileiro para o seu lugar constitucional, dando suporte logístico em algumas operações. Agora, quem investiga crimes ambientais é a Polícia Federal, quem faz autuações e aplica multas é o Ibama, quem faz a gestão ambiental é o ICMBio, e quem faz o monitoramento é o Inpe. Tudo isso está dentro do plano como compromisso de fortalecimento dos órgãos de gestão ambiental do Brasil por meio do fortalecimento do Sistema Nacional do Meio Ambiente.

A senhora acredita que ainda dá tempo para perseguir as metas estabelecidas para o país pela COP-25? A gente vai ter de fazer um esforço muito grande, mas é possível ter medidas que nos levem a fazer com que o Brasil venha a ser o primeiro país entre os maiores emissores a se tornar carbono negativo, porque o nosso maior vetor de emissão é o desmatamento, responsável por 75% das nossas emissões. Se a gente zerar o desmatamento, a gente reduz em 75% as nossas emissões. O Brasil tem a possibilidade de fazer isso, sem abrir mão de fazer as reduções também em relação ao setor elétrico, em relação à indústria, em relação à mobilidade urbana e a todas as demais agendas, inclusive em relação ao uso da terra.

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Como deveria ser o tratamento do governo em relação ao agronegócio, que é tido por alguns como vilão do desmatamento no país? É preciso um compromisso de que o Plano Safra vai ser feito, no novo governo, mediante critérios de sustentabilidade para transitarmos para uma agricultura de baixo carbono. Isso seria uma forma, inclusive, de proteger o agronegócio brasileiro de impedimentos a mercados e a investimentos. Se continuarmos destruindo as florestas, com violência aos povos indígenas, todos nós vamos sofrer. De novo, é preciso fazer todos os esforços para que cheguemos ao desmatamento zero. O Brasil não precisa desmatar mais para ser a potência agrícola que ele já é. Por isso, o documento entregue por mim ao ex-presidente Lula se chama ‘Resgate atualizado da agenda socioambiental perdida’, uma agenda que vinha dando certo desde quando se iniciou, em 2003. Ninguém melhor do que o próprio Lula, que deu início a ela, para resgatá-la. Esse foi o compromisso que ele assumiu.

Por falar em compromisso, caso Lula venha a ser eleito e a convoque para ser ministra do Meio Ambiente novamente, como a senhora veria essa hipótese? Por experiência própria, tendo sido candidata por três vezes, tudo o que um candidato não pode fazer é ficar dizendo quem são os seus ministros antes de ganhar. E tudo o que um candidato não precisa é de apoiadores falando em ministérios. Agora é a hora de trabalhar para ganhar e, obviamente, como deputada federal, eu estarei lá no Congresso para ajudar a evitar toda a agenda do pacote da destruição, além de dar suporte à implementação de todos esses compromissos que foram assumidos. O mais importante são os interesses do Brasil, como o fortalecimento da democracia, o combate às desigualdades, a proteção das nossas riquezas naturais para um modelo sustentável de desenvolvimento. Esse é o nosso grande desafio. Agora, em relação a ser ministra, o que eu posso dizer é que não faltam quadros altamente qualificados no Brasil.

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