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João Kepler: ‘As startups estavam gastando os recursos indevidamente’

Investidor-anjo que já aportou em mais de mil empresas acredita que relação com fundos de investimento passa por 'freio de arrumação'

Por Felipe Mendes 15 ago 2022, 13h00

Maior investidor-anjo no Brasil, aquele que aposta em empresas iniciantes logo no começo da estruturação de sua ideia, o amapaense João Kepler acredita que a relação entre fundos de investimentos e startups passa por um “freio de arrumação” no momento, conforme aborda VEJA em reportagem desta semana. Sócio fundador e CEO da Bossanova Investimentos, fundo de venture capital com mais de 1.500 companhias investidas, Kepler diz que ainda há muitos recursos disponíveis para boas ideias, mas que o aumento das taxas de juros mundo afora impôs uma dificuldade para a captação em startups que chegaram ao late stage, caso de empresas maduras, muitas delas já avaliadas em mais de 1 bilhão de dólares, mas que ainda não atingiram um ponto de equilíbrio em suas operações. “Uma startup não precisa dar lucro. Ela precisa alocar corretamente o dinheiro do investidor. O [problema] que estava acontecendo é que as empresas estavam gastando indevidamente o recurso que foi aportado como se não houvesse amanhã. Isso acabou”, afirma Kepler, em entrevista a VEJA. “Os fundos estão cada vez mais seletivos e, apesar de terem dinheiro em caixa, não vão fazer novas rodadas para aquelas empresas que não alcançaram um equilíbrio.”

Com o aumento da taxa de juros no Brasil e nos Estados Unidos, muitos investimentos estão migrando para a renda fixa. Como esse movimento afeta a atração de capital por parte das startups? Realmente, a gente está vivendo um dilema no venture capital. Por um lado, ainda há muito dry powder, ou pólvora seca, dinheiro que já está comprometido para investimentos. No mundo, são mais de 320 bilhões de dólares comprometidos por meio de contratos que não podem ser quebrados. E isso faz com que os fundos de investimento maiores fiquem mais seletivos. Por outro lado, ainda há muito recurso no caixa para investir. E eles precisam investir porque isso impacta na taxa interna de retorno, o tal do IRR, na sigla em inglês. O dilema, portanto, é saber quando alocar, em que momento alocar, e onde alocar esses recursos. Por isso, cada vez mais as empresas vão ter que se estruturar para mostrar um melhor racional do seu valor financeiro e da alocação do recurso.

Há uma busca maior por segurança no retorno do investimento? Existe uma confusão no mercado. Uma startup não precisa dar lucro. Ela precisa alocar corretamente o dinheiro do investidor. O que estava acontecendo é que as empresas estavam gastando indevidamente e ‘alopradamente’ o recurso que foi aportado como se não houvesse amanhã. Ou seja, havia dinheiro em abundância. Nós passamos por dez anos de abundância e dinheiro fácil, com muito recurso à disposição. Isso acabou. Hoje, o investidor vai buscar uma melhor relação de investimento para ter empresas que tenham um melhor retorno. Não vai aportar em qualquer coisa, como era antigamente.

Apesar de o volume investido em startups ter caído 44% no primeiro semestre, segundo a plataforma Distrito, os aportes em rodadas do tipo seed (anjo ou semente) e early stage, de estágio inicial de crescimento, aumentaram… Nesses estágios, não existe crise ou falta de recursos. Quem já era rentista, continua sendo e até aumentou isso, mas quem investe de 5% a 10% do seu patrimônio em venture capital, não mudou de postura. O early stage tem sempre um valor mais ajustado, desde que as startups não gastem indevidamente os recursos. Posso dizer isso, até por experiência própria dentro da Bossanova, que esse mercado não foi afetado.

Onde estão as maiores oportunidades hoje? Na Bossanova, nós somos um pouco agnósticos e vamos na contramão das ‘modinhas’ de momento. Eu não saberia dizer qual seria a modinha da vez, mas, olhando para onde existe mais necessidade para a experiência do consumidor, posso dizer que há muita coisa para se fazer de soluções para o agronegócio e em saúde.

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Como a Bossanova investe em empresas em estágio inicial, que estão nos primeiros anos de vida, vocês recebem muito interesse para fusões e aquisições por parte dos grandes conglomerados? A Bossanova tem um ‘aquário de peixinhos’. São 1.526 empresas investidas no early stage. As grandes empresas ficam de olho no nosso aquário para comprar barato. Dentro de casa, a procura por peixinhos continua. As grandes empresas continuam batendo à nossa porta. Esse apetite não diminuiu. As empresas grandes compram startups porque querem absorver tecnologia, querem comprar talento, a equipe… ou porque quer ter uma unidade de comercialização, operação e serviço diferente do que já tinha. Por exemplo, a Renner comprou a Repassa para acessar um nicho de novos consumidores do qual ela não fazia parte, que é a venda de roupas seminovas. Foi uma estratégia que funcionou. 

Como o senhor vê as demissões no setor da tecnologia? Eu vejo como um importante freio de arrumação e te digo que isso vai continuar. Aquela empresa que não se ajustar, não vai conseguir novas rodadas de investimento. Os fundos estão cada vez mais seletivos e, apesar de terem dinheiro em caixa, não vão fazer novas rodadas para aquelas empresas que não alcançarem um equilíbrio. As empresas terão que voltar ao ‘retorno do investimento técnico’ para poder continuar recebendo novas rodadas de investimento e continuar atrativas. Dinheiro não vai faltar. Vai ter, só que em menor quantidade neste momento.

Grande parte das empresas de tecnologia está sucumbindo nas bolsas de valores mundo afora nos últimos meses. Isso é um sinal ruim? Muitas startups que fizeram o IPO obtiveram uma precificação exagerada. O que está acontecendo agora é um ajuste. De qualquer forma, quem apostar contra as techs, vai perder, porque esse preço de hoje não reflete o que será daqui a um ano. As techs vão subir de preço. Agora, é óbvio que, quando se tem uma preocupação e um tumulto no mercado em relação ao momento, é claro que os que estavam comprando mais ações de tecnologia ficam mais comedidos.

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