Hipocrisia: EUA ameaçam Brasil e Índia com sanções, mas fazem negócio com a Rússia
A punição por importar produtos russos, se aprovada, será uma agressão desenhada para colocar na conta dos outros o custo de sufocar Putin

Os senadores brasileiros que foram aos Estados Unidos para tentar sensibilizar autoridades daquele país sobre os impactos econômicos, no Brasil e lá, do iminente tarifaço de 50% receberam um alerta preocupante: há uma lei prestes a ser aprovada pelo congresso americano que vai impor sanções a “todos os países que fizerem negócios com a Rússia”, conforme informou a coluna Radar.
A pressão sobre os parceiros comerciais da Rússia já começou. Nesta quarta-feira, 30, o presidente americano Donald Trump anunciou uma tarifa adicional de 25% sobre importações da Índia a partir de 1º de agosto, e deu como uma das justificativas o fato de os indianos comprarem armas e combustíveis fósseis da Rússia. No último 15 de julho, Mark Rutte, secretário-geral da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), a aliança militar ocidental, defendeu sanções secundárias contra o Brasil e outros países que seguem importando produtos, especialmente derivados de petróleo, da Rússia. Sanções secundárias são aquelas direcionadas contra parceiros do país que se quer de fato atingir.
Santa hipocrisia. Trump quer punir outra nações por fazer negócios com a Rússia, mas nem os Estados Unidos interromperam totalmente os fluxos comerciais com o país de Vladimir Putin. No ano passado, os americanos importaram 3 bilhões de dólares em produtos russos, enquanto exportaram 500 milhões de dólares para a Rússia. Proporcionalmente, o comércio entre os dois países até mesmo aumentou nos cinco primeiros meses de 2025, atingindo um total de 2,3 bilhões de reais, segundo dados oficiais do US Census Bureau. Ué, mas não era para parar de negociar com os russos?
A hipocrisia fica ainda maior quando se compara o caso da Europa com o do Brasil. O comércio bilateral do Brasil com a Rússia em 2024 somou cerca de 12,5 bilhões de dólares em 2024. Isso equivale a apenas um sexto do total do comércio da União Europeia (UE) com a Rússia. A soma das importações e das exportações entre a UE e a Rússia foi de 77,5 bilhões de dólares em 2024, segundo dados da Comissão Europeia, órgão executivo do bloco. Ora, a UE concentra a maioria dos países da Otan e é a maior interessada em pressionar Moscou a suspender a agressão militar à Ucrânia.
Sim, é verdade que o fluxo comercial dos países europeus com a Rússia vem caindo ano a ano desde a Guerra na Ucrânia. Mas os negócios seguem ocorrendo em setores estratégicos. A União Europeia importa dos russos combustíveis fósseis, minérios e químicos — porque precisa desses produtos. Assim como o Brasil precisa dos fertilizantes russos para garantir a produção agrícola que alimenta cerca de 10% da população mundial.
Se os Estados Unidos vierem de fato a impor sanções comerciais ao Brasil, à Índia ou a outros países emergentes pelo fato de manterem negócios com a Rússia, será uma medida injustificada e seletiva. Será uma agressão à economia desses países, desenhada para colocar na conta dos outros o custo de sufocar o regime russo.
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