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‘Estamos diante de uma revolução’, diz Paulo Hoff, presidente da oncologia na Rede D’Or

Médico do maior grupo de hospitais privados do país fala sobre o avanço dos tratamentos contra o câncer e os planos da empresa para crescer no mercado

29 nov 2024, 06h00

 

O médico Paulo Hoff, de 56 anos, está à frente da divisão de oncologia da Rede D’Or, o maior conglomerado de hospitais privados do país, desde 2018. A missão não é nada fácil: salvar o maior número possível de vidas contra a segunda doença que mais mata no Brasil. Os números de casos só aumentam. Segundo o Instituto Nacional de Câncer, por ano são 700 000 novos diagnósticos. Em uma década, o número deverá chegar à casa do milhão. “É uma epidemia que assusta um pouco”, diz Hoff. “Precisamos criar uma infraestrutura para tratar os pacientes.” Na entrevista a seguir, Hoff fala sobre a importância da identificação precoce da doença, detalha os avanços mais promissores nos tratamentos oncológicos e analisa os gargalos da indústria farmacêutica e os desafios envolvidos na gestão hospitalar. O principal deles é unir eficiência com controle de custos. Acompanhe os principais trechos.

Há seis anos o senhor chefia a divisão de oncologia da Rede D’Or. Que avaliação faz dessa trajetória? Nem parece que passou tão rápido. Tenho três grandes projetos na vida: o Sírio-Libanês, que expandimos, a criação do Instituto do Câncer de São Paulo e este atual. Quando vim para a Rede D’Or, encontrei uma empresa com uma área de oncologia incipiente. A rede tinha uma presença forte no Rio de Janeiro, mas cresceu muito desde então em outros estados. O mesmo aconteceu com a oncologia.

Como a Rede D’Or estruturou essa expansão? A nossa estratégia foi alocar a área de oncologia sempre muito próxima de uma unidade hospitalar. Ou seja, abrimos hospitais já com unidades de tratamento de câncer. Basicamente, essa sinergia nos permite controlar custos e simplificar processos.

Não é óbvio que o setor de oncologia se estruture dessa forma? Para nós, é bastante claro que o desenvolvimento da oncologia se beneficia das unidades hospitalares. Os processos são mais rápidos. Mas, além disso, para controlar custos, nós estruturamos a nossa área como uma empresa, com banco de dados e protocolos unificados. Quando cheguei eram quase 8 000 protocolos, hoje são pouco mais de 1 000. Isso é importante em termos de controle de qualidade e previsibilidade nos tratamentos. Fizemos um esforço enorme de padronização.

A oncologia tem registrado avanços importantes. Isso aumenta os custos? A inflação médica é maior que a inflação convencional, e a inflação oncológica é maior que a inflação médica. Os avanços vieram, mas vieram com custos. Estamos vendo uma revolução importante nos métodos de tratamento. As cirurgias são cada vez menos invasivas. Na unidade Vila Nova Star, em São Paulo, compramos uma máquina chamada CyberKnife, a única do Brasil. Isso aumentou muito a nossa capacidade de tratar o paciente. Mas esse investimento tem um custo alto, de 5 milhões de dólares.

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Como conciliar uma oncologia de ponta com controle de custos? É a velha história de fazer mais com menos. Padronizamos os processos porque assim trabalhamos os custos e ganhamos escala. Além disso, pensamos sempre no tratamento correto para o paciente correto.

O que isso significa? O câncer é o conjunto de milhares de doenças. Todo câncer é uma doença genética. O câncer de pulmão do paciente A pode ser parecido com o do paciente B, mas eles podem ter surgido por alterações diferentes, exigindo tratamentos personalizados. Se não soubermos disso, faremos o mesmo tratamento em pacientes distintos, sem sucesso. Isso é custo. É comum pacientes virem ao meu consultório e pedirem os tratamentos novos que viram na internet, mas às vezes não é necessário. Se eu usar o tratamento correto, vou ter mais chance de sucesso e o custo vai ser reduzido.

“A inflação médica é maior que a inflação convencional, e a inflação oncológica é ainda maior”

A Rede D’Or está investindo em diagnóstico? Nós investimos num laboratório de patologia molecular, que nos ajuda a entender os fatores que levaram ao câncer. Trouxemos máquinas novas, tudo o que há de mais moderno. Temos o maior parque de robôs para cirurgia do Brasil, mas também estamos investindo em diagnóstico, em medicamentos que nos ajudem a tratar o paciente. Isso ainda não é uma realidade para todos, mas certamente fazemos agora escolhas bem mais precisas do que no passado.

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A indústria farmacêutica pesa a mão nos preços dos medicamentos? Cerca de 30% do que é investido no desenvolvimento de novos remédios visa ao tratamento oncológico. Isso é na casa de muitos bilhões de dólares. É óbvio que a indústria faz isso sob risco de não obter retorno financeiro, já que muitos medicamentos não chegam a ser vendidos.

Qual é o índice médio de aprovação? Menos de 5% dos medicamentos que entram em fase de pesquisa chegam às prateleiras. Logo, um produto comercialmente disponível tem que pagar o seu desenvolvimento e o de tantos outros que não foram bem-sucedidos. É compreensível que o custo seja alto. Precisamos começar a discutir isso. Existe um esforço global para sensibilizar a indústria farmacêutica de que é necessário limitar os preços.

Há expectativa de que esse esforço dê resultado? Um fato novo é que os Estados Unidos não tinham por política a possibilidade de discussão de preço de remédio. Eles compram metade dos produtos oncológicos do planeta, nós compramos 4%. E eles nunca pediam desconto, por uma questão regulatória. Essa situação desincentivava a redução dos valores para todo o planeta. O presidente Joe Biden mudou isso, o que vai influenciar o preço dos remédios a nível mundial num futuro não muito distante.

A Novartis está trazendo ao Brasil um remédio para tratamento de câncer de próstata altamente tecnológico. O custo da aplicação é de 144 000 reais. Faz sentido? Existe uma versão desse medicamento feita localmente, mais antiga e menos sofisticada. O custo é mais ou menos a metade. Você vai comparar o remédio da Novartis com o outro feito em casa? A gente tem menos estrutura, como país, para aguentar um valor alto de produtos farmacêuticos. A Novartis, como outras, tem alguns produtos muito importantes, mas precisamos ter a capacidade de oferecê-los para toda a população. Essa é a nossa realidade.

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Seria possível produzir esses medicamentos localmente? Só alguns. A Car-T Cell, um medicamento com base em terapia celular, custa quase 500 000 dólares, mas o Instituto Butantan está tentando produzi-la numa fábrica em Ribeirão Preto, no interior paulista. São alternativas para reduzir os custos.

Prevenir é mais barato do que remediar? Prevenir é melhor, mas não necessariamente mais barato. Essa é uma ilusão. Fazer a detecção cedo aumenta a chance de cura. Não fumar, praticar exercícios físicos, tomar as vacinas, fazer sexo seguro, tudo isso previne câncer. Tem prevenção que é mais barata, como essas, mas fazer tomografias do tórax de fumantes ajuda a detectar precocemente, porém, é mais caro. Fazer isso em toda a população que fuma uma vez por ano seria caríssimo.

Como são as negociações por novos investimentos na Rede D’Or? A Rede D’Or leva muito a sério a sua responsabilidade. É uma empresa que tem quase 80 000 funcionários. Quando temos algum projeto, preciso apresentar um plano de negócio, tenho que defendê-lo nos comitês e mostrar a viabilidade. Mas a Rede D’Or tem uma peculiaridade, que é um grupo de alta gestão aberto a conversas. Não consigo tudo o que eu quero, mas sempre sou ouvido.

“Nos EUA, a taxa de cura do câncer está perto de 70%. No Brasil, em instituições de ponta, o índice é de 60%”

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O que podemos esperar para o futuro da área de oncologia da Rede D’Or? O câncer é a segunda causa de morte no Brasil. É uma epidemia que assusta um pouco. Atualmente, registramos 700 000 casos novos por ano. Em uma década, devemos passar de 1 milhão. Há necessidade de criar uma infraestrutura para tratar esses pacientes.

O que explica o aumento de casos? Há cinco anos, costumávamos dizer que isso se devia ao envelhecimento da população, mas um fato assustador é que na última década a incidência de câncer em pacientes com menos de 40 anos aumentou mais de 50%. Isso preocupa. Não saberia dizer exatamente a causa, mas provavelmente tem a ver com mudança de estilo de vida. Temos uma população mais obesa, sedentária e que vive em locais mais poluídos. É uma conjunção de fatores.

Há chance de a medicina vencer o câncer? Nos Estados Unidos, a taxa de cura está perto de 70%. Lá, a mortalidade cai 2% ao ano. No Brasil, em instituições de ponta, a taxa de cura está ao redor de 60%. No sistema público, é de 50%. Há espaço para melhorar.

Por que a taxa é menor no SUS? O que mais afeta é o tempo de diagnóstico. No SUS, a demora no atendimento prejudica o paciente. O gestor público deveria focar em acelerar os diagnósticos, não tanto em incorporar novas tecnologias.

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O que o senhor sonha para a empresa? Eu gostaria de continuar expandindo nosso atendimento e adoraria ver a nossa necessidade de tratamento avançado diminuir com mais diagnósticos precoces e prevenção. Se os americanos estão conseguindo, nós também podemos.

Publicado em VEJA, novembro de 2024, edição VEJA Negócios nº 8

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