Enel deixa 16 000 imóveis novos sem ligação de energia e é cobrada por construtoras
Quase 8 000 imóveis novos aguardam há mais de seis meses que a Enel realize a ligação à rede elétrica

Cerca de 16 000 imóveis novos no estado de São Paulo aguardam para serem conectados à rede de energia elétrica pela Enel, a concessionária que atende 8 milhões de domicílios na capital e mais vinte e três municípios paulistas. Segundo um levantamento do Sinduscon-SP, que representa as construtoras locais, quase 8 000 unidades esperam pela ligação há mais de seis meses. Para aproximadamente 3 000 imóveis, os atrasos vão de 30 a 180 dias.
Nesta semana, o presidente do Sinduscon-SP, Yorki Estefan, reuniu-se com Guilherme Lencastre, presidente do conselho de administração da Enel Brasil, que controla a companhia paulista, e outros membros da cúpula da empresa para cobrar providências. O problema, segundo as construtoras, não é novo. Os recorrentes problemas de atraso na ligação dos imóveis novos à rede elétrica levaram à criação de um grupo de trabalho composto pelo Sinduscon-SP e pela Enel, mas as reuniões bimestrais surtiram poucos resultados.
“Até o momento, não conseguimos identificar melhorias nos processos da Enel”, afirma Estefan. “Citamos diversos casos em que enfrentamos problemas, desde a aprovação de projetos até a execução de novas ligações.” Segundo ele, a Enel concordou em aumentar a frequência das reuniões do grupo de trabalho para mensal. A concessionária também afirmou que está contratando novas equipes e já não enfrenta problemas para adquirir os equipamentos e insumos necessários às ligações.
Na reunião desta semana, os construtores sugeriram que a Enel crie um grupo de profissionais exclusivo para atender as ligações de novas unidades, aprimore processos internos e integre melhor as equipes responsáveis pela aprovação das obras civis e de eletricistas que realizam a conexão à rede. “Há diversos casos de ligações programadas que acabam adiadas por até 20 dias devido a imprevistos menores, como problemas de trânsito”, explica Estefan. “Não faz sentido postergar uma ligação já autorizada por tanto tempo.” Segundo ele, a Enel se comprometeu a encurtar esses prazos.
Responsável pela distribuição de energia em parte de São Paulo desde 2018, quando pagou 5,6 bilhões de reais à americana AES pela Eletropaulo, a Enel apresenta recorrentes problemas. Os casos mais conhecidos foram os apagões de 23 de novembro de 2023, que deixou 2 milhões de imóveis no escuro, e o de 11 de outubro do ano passado, que atingiu 3,1 milhões de domicílios. Em ambos, fortes temporais causaram quedas de árvores e a interrupção das linhas.
Especialistas no setor, funcionários e ex-funcionários da Enel afirmam que os problemas foram potencializados pela decisão da companhia de manter um estoque mínimo de peças e equipamentos e de reduzir fortemente as equipes de manutenção, a fim de tornar as operações mais líquidas – em bom português, gerar mais caixa para enviar para a matriz na Itália, que sofre com uma dívida superior a 50 bilhões de euros e vem se desfazendo de operações ao redor do mundo.
Com isso, a manutenção da rede fica aquém de concessionárias de outros estados. As falhas no abastecimento também se repetem em outras cidades brasileiras e em outros países onde a Enel atua. Em 2023, por exemplo, a companhia vendeu a concessão em Goiás, após sucessivas queixas dos clientes e ameaças do governador Ronaldo Caiado de anular o contrato. Em meados do ano passado, o presidente do Chile, Gabriel Boric, acusou a empresa de negligenciar os serviços. No auge da crise, o governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas, e o prefeito da capital, Ricardo Nunes, ameaçaram ir à Justiça para cassar a concessão da Enel no estado.
Em nota à VEJA, a Enel afirmou que tem aumentado o número de equipes dedicadas à ligação de novos imóveis. Veja a íntegra:
“A Enel Distribuição São Paulo esclarece que vem acelerando a conexão de novos clientes na área de concessão, apesar de as contingências climáticas afetarem, em alguns meses do ano, as obras realizadas pela companhia. A distribuidora realizou, em 2024, cerca de 500 mil ligações novas, sendo 98,8% dentro do prazo regulatório. No ano passado a companhia também realizou cerca de 2.700 obras de expansão de rede para atender parte dessas ligações. Desse total, cerca de 1.500 foram executadas no segundo semestre, um aumento de 43% em relação aos primeiros seis meses do ano, demonstrando a capacidade de execução da empresa, em linha com o aquecimento do setor imobiliário. A empresa acrescenta que no primeiro trimestre deste ano está aumentando em 70% a capacidade de execução de novas obras.
A Enel também reforça que vem aumentando de forma contínua investimentos em São Paulo. De 2025 a 2027, a empresa vai investir R$ 10,4 bilhões para a melhoria do fornecimento de energia aos 24 municípios atendidos na Região Metropolitana, incluindo a capital. O montante é recorde para área de concessão.
Os investimentos são destinados, sobretudo, para reforço, digitalização e expansão dos sistemas de distribuição. A companhia também está reforçando de forma estrutural seu plano operacional com intensificação das manutenções preventivas e a contratação de mais profissionais próprios para os serviços de campo. Em março, a distribuidora conclui a contratação de 1.200 novos profissionais.
As ações já trazem resultados. No período de novembro a janeiro deste ano, a Enel São Paulo reduziu em 54% do tempo médio de atendimento aos clientes em comparação com o mesmo período do ano anterior. A companhia reitera que seguirá dedicando todos os esforços para melhoria contínua do serviço prestado em toda a era de concessão.”